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Teatro

- Publicada em 14 de Novembro de 2019 às 03:00

Denúncia e desvelamento

A produção e montagem de Censuradas - SOS mulheres em Vênus ou travestis na porta do céu, dramaturgia e direção de Pedro Delgado, por trás da aparente comicidade, trata de tema extremamente oportuno e sério: a violência contra travestis e outros integrantes de grupos LGBT, extremamente visível e perturbador em nosso país. Trata-se de um projeto de pesquisa para seu curso de Doutoramento no departamento de Artes Cênicas da Ufrgs (DAD) que está sendo levado à cena enquanto um estudo de caso.
A produção e montagem de Censuradas - SOS mulheres em Vênus ou travestis na porta do céu, dramaturgia e direção de Pedro Delgado, por trás da aparente comicidade, trata de tema extremamente oportuno e sério: a violência contra travestis e outros integrantes de grupos LGBT, extremamente visível e perturbador em nosso país. Trata-se de um projeto de pesquisa para seu curso de Doutoramento no departamento de Artes Cênicas da Ufrgs (DAD) que está sendo levado à cena enquanto um estudo de caso.
O espetáculo, com pouco mais de uma hora de duração, começa nos camarins de uma produção teatral, pouco antes da estréia do espetáculo. Carlos Paixão vive o diretor do espetáculo e a própria Lady Cherlet, que é assassinada com violência e cuja morte é anunciada justamente neste momento. Os dez minutos iniciais da encenação, que tem ritmo leve e descontraído, crispa-se, aprofunda-se e se torna um drama em que se sucedem cenas de certo extravasamento sexual, enfocando situações polêmicas e difíceis na vida cotidiana de jovens que vieram a se travestir ou de travestis que vivem a prostituição. O espetáculo, quase ao final, ganha uma perspectiva metalinguística, quando o pretenso diretor da performance (será Leandro Gass operador de luz?) aparece em cena para alertar da eventual chegada da polícia e risco de prisão dos atores. Acendendo-se as luzes da plateia e observando-se os espectadores, decide-se, então, por encenar a sequência final do trabalho, que culmina numa espécie de ritual de consagração da travesti assassinada (vivida por Jony Pereira).
O trabalho tem uma dramaturgia bastante trabalhada por Pedro Delgado, que não respeita linearidade do enredo, aprofundando situações e muitas vezes suspendendo a narrativa central, propriamente dita, para refletir sobre situações diversas existentes em nosso cotidiano preconceituoso. Como todo o espetáculo drag, o figurino (de Pedro Delgado e Eloá Lacerda) é luminoso, multicolorido e cheio de paetês, enquanto a cenarização é minimalista (ainda Pedro Delgado), com adereços variados, que criam diferentes ambientes. A destacar, a sequência final, muito bonita e dramaticamente bem construída, que me lembrou um pouco a conclusão do filme Privilégio, de Peter Watkins (1967), sobre um astro do rock, que acaba também sendo crucificado pelos seus fãs. Neste caso, não são os fãs mas, sim, seus perseguidores que o oferecem como que em holocausto.
O roteiro de Pedro Delgado ousa, deste modo, uma discussão mais ampla, apresenta situações-limite e discute o atual contexto de tais personagens, denunciando os preconceitos existentes mas, ao mesmo tempo, propondo um espetáculo que assume certa perspectiva estética também LGBT, no que agrada ao público. Longe de fazer a exploração simplista do tema, Delgado se propõe a discutir, seriamente, as questões que envolvem o tema e, neste sentido, o trabalho é interessante. Carece-lhe, contudo, de um elenco mais seguro e desinibido, no sentido de dar maior consistência aos personagens. Muitas cenas são demasiadamente longas, o que prejudicando o resultado final de todo o trabalho. Mas tenho certeza de que um ajuste mais cuidadoso no todo do ritmo do espetáculo redundará num trabalho significativo, que poderá e deverá cumprir novas temporadas entre nós. Uma revisão no roteiro igualmente ajudará a clarificar algumas intenções do texto e algumas das situações exploradas, de modo a facilitar a compreensão do público.
De qualquer modo, levando-se em conta o clima de preconceito e de clara perseguição a estas comunidades, é certo que o espetáculo de Pedro Delgado é oportuno e serve, sobretudo, para chamar a atenção para a questão.
 
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