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Teatro

- Publicada em 07 de Novembro de 2019 às 21:51

Renovação e parcial frustração

O Grupo Corpo de dança, de Belo Horizonte, revelou-se ao público com o espetáculo Maria, Maria, coreografia do argentino Oscar Araiz, sobre música de Milton Nascimento. Logo depois, o mesmo coreógrafo idealizou Último trem, desta vez a partir de música de Gilberto Gil, especialmente Expresso 2222. Era 1980. Em 2019, Gilberto Gil e o Grupo Corpo se reencontram, mas o coreógrafo é outro, Rodrigo Pederneiras, que já tem uma história com o conjunto coreográfico.
O Grupo Corpo de dança, de Belo Horizonte, revelou-se ao público com o espetáculo Maria, Maria, coreografia do argentino Oscar Araiz, sobre música de Milton Nascimento. Logo depois, o mesmo coreógrafo idealizou Último trem, desta vez a partir de música de Gilberto Gil, especialmente Expresso 2222. Era 1980. Em 2019, Gilberto Gil e o Grupo Corpo se reencontram, mas o coreógrafo é outro, Rodrigo Pederneiras, que já tem uma história com o conjunto coreográfico.
No espetáculo a que assistimos, num Teatro do Sesi totalmente lotado, revisitamos, primeiramente, Sete ou oito peças para ballet, de 1994, com músicas de Philip Glass recriadas pelo Grupo Uakti. Na segunda parte foi a vez de Gil. O contraste ficou evidente: não são só cerca de 25 anos de distância, mas de certa maneira uma outra concepção coreográfica. Rodrigo Pederneiras se reinventa, mas menos do que Gilberto Gil.
Sete ou oito peças para um ballet tem um belíssimo e eficiente figurino de Freusa Zechmeister, com efeitos buscados na optical art, de modo a provocar ilusões de ótica, com excelente resultado, sobretudo pela orgânica combinação das cores, sobretudo quando aplicadas nas peças zebradas dos bailarinos. A iluminação de Paulo Pederneiras pôs à prova o sistema do palco do Teatro do Sesi, que tem projetores móveis, controlados por computadores, que dispensam a manipulação individual do técnico de mesa, porque estão previamente programados por computador. O cruzamento de Glass, hiper moderno e minimalista, com os instrumentos não industriais do Uakti provoca uma combinação estranha e ao mesmo tempo fascinante pelas sonoridades alcançadas. A peça, como um todo, é uma espécie de divertimento, com movimentos corporais então inusitados e que ainda hoje exigem uma sincronia sempre admirável estes bailarinos reunidos em Belo Horizonte.
As cores fortes, que combinavam o amarelo, ocre, verde e depois preto e roxo, com o passar do tempo acabaram ganhando atualidade com os novos tempos políticos. Pessoalmente, acho que a coreografia rejuvenesceu.
Quanto a Gil, há surpresas positivas e alguma frustração. Gilberto Gil não fez uma antologia de si mesmo. Evitou esta vaidade, produziu uma releitura absolutamente inusitada e inesperada, que surpreende e, ao mesmo tempo, frustra o espectador. Gil não buscou uma releitura, mas foi além. O que ficou vinculado à baianidade do compositor foram os figurinos, anda uma vez, de Freusa Zechmeister, com apliques tematicamente aproximados da tradição africana, sobre malhas negras, além dos batuques constantes e dos ritmos explorados. No mais, a trilha sonora é provocadoramente contemporânea, com percussão, teclados, guitarras, percussão eletrônica que contrastam com o balafon, instrumento nativo africano. Gil canta pouco, sua incidência é mínima. Os instrumentos musicais cantam por ele. E a coreografia de Rodrigo Pederneiras se, de um lado, revisita alguns dos movimentos mais características do conjunto, ao longo de sua história, por outro lado avança em proposições renovadoras, trabalhando sobretudo com grupos de sete a nove bailarinos em cena, chegando ao conjunto da trupe apenas no final da peça.
Talvez traído pelo excesso de expectativa, senti-me parcialmente frustrado. Esperava mais o Gil baiano, encontrei um Gil comedido, aprofundado, ousado e criativo como há muito não se ouvia. Isso, de qualquer modo, refletiu-se na coreografia, que também é alguma coisa menos provocativa, avançando com cuidado nos movimentos propostos, sem maiores desafios aos bailarinos mas, ao mesmo tempo, como que fazendo balanços e propondo novos caminhos. Sete ou oito peças para um ballet foi ovacionado, Gil foi apenas polidamente aplaudido, ainda que, ao final do espetáculo, os aplausos ao conjunto tenham sido efusivos e sinceros. É nossa maior companhia de dança e, diante do risco de ela passar a enfrentar dificuldades por parte de eventuais apoios oficiais, os espectadores como que se solidarizaram com os artistas.
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