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Teatro

- Publicada em 17 de Maio de 2019 às 03:00

Palco Giratório: início excelente

Quando esta coluna estiver sendo lida, estaremos quase no final de mais uma edição do Palco Giratório, festival que o Sesc patrocina. O fato de o evento permanecer já é uma vitória, muito especialmente no atual contexto. Esta mostra nos permite conhecer produções teatrais de todo o País. Há os espetáculos do chamado circuito nacional, que são selecionados em cada estado e depois percorrem diferentes cidades do Brasil. Há os espetáculos convidados, especificamente, pelas curadorias regionais do festival e, enfim, há as montagens locais, que ganham destaque para serem (re)vistas por seu próprio público mas que, automaticamente, se integram ao circuito nacional e vão circular por outros estados brasileiros. Isso significa diferentes critérios para a escolha dos espetáculos, o que já é um referencial muito bom. Some-se a isso, porém, que, nos anos mais recentes, a curadoria nacional e as curadorias regionais assumiram, claramente, vieses de uma maior perceptiva crítica sobre a realidade do País. Sinteticamente, pode-se dizer que o grande foco da mostra é a questão da etnia e a condição do negro no Brasil. A esse foco central, somam-se outros que enfatizam, de modo geral, os temas vinculados a questões de gênero, presença do indígena em nosso País, a marginalidade social e cultura etc. O resultado tem sido festivais densos, criativos, provocativos, que nos levam a reflexões mais profundas e imediatas a respeito de nossa realidade. Neste ano, criou-se inclusive o espaço denominado "Discutindo a cena", ampliou-se o "Seminário Palco Giratório" e estabeleceu-se o "Ponto de encontro", no Centro Municipal de Cultura, tudo isso visando o maior diálogo possível entre os integrantes dos diferentes grupos (portanto, os criadores) e os vários públicos.
Quando esta coluna estiver sendo lida, estaremos quase no final de mais uma edição do Palco Giratório, festival que o Sesc patrocina. O fato de o evento permanecer já é uma vitória, muito especialmente no atual contexto. Esta mostra nos permite conhecer produções teatrais de todo o País. Há os espetáculos do chamado circuito nacional, que são selecionados em cada estado e depois percorrem diferentes cidades do Brasil. Há os espetáculos convidados, especificamente, pelas curadorias regionais do festival e, enfim, há as montagens locais, que ganham destaque para serem (re)vistas por seu próprio público mas que, automaticamente, se integram ao circuito nacional e vão circular por outros estados brasileiros. Isso significa diferentes critérios para a escolha dos espetáculos, o que já é um referencial muito bom. Some-se a isso, porém, que, nos anos mais recentes, a curadoria nacional e as curadorias regionais assumiram, claramente, vieses de uma maior perceptiva crítica sobre a realidade do País. Sinteticamente, pode-se dizer que o grande foco da mostra é a questão da etnia e a condição do negro no Brasil. A esse foco central, somam-se outros que enfatizam, de modo geral, os temas vinculados a questões de gênero, presença do indígena em nosso País, a marginalidade social e cultura etc. O resultado tem sido festivais densos, criativos, provocativos, que nos levam a reflexões mais profundas e imediatas a respeito de nossa realidade. Neste ano, criou-se inclusive o espaço denominado "Discutindo a cena", ampliou-se o "Seminário Palco Giratório" e estabeleceu-se o "Ponto de encontro", no Centro Municipal de Cultura, tudo isso visando o maior diálogo possível entre os integrantes dos diferentes grupos (portanto, os criadores) e os vários públicos.
Um dos primeiros trabalhos que me chamou a atenção foi A invenção do Nordeste, do Grupo Carmin, do Rio Grande do Norte. O texto de Henrique Fontes e Pablo Capistrano, para a direção de Quitéria Kelly e interpretações do próprio Henrique Fontes, Mateus Cardoso e Robson Medeiros, é uma irônica reflexão a respeito da condição do "ser nordestino". Oportunamente, o espetáculo se abre com uma citação do conhecido Manifesto regionalista de 1926, de Gilberto Freyre, que pretendia reivindicar a importância das regiões (e suas diferenciações) para a constituição da nacionalidade brasileira (o tema era candente e retornou, com força, ao longo da ditadura do Estado Novo). O tema, na verdade, continua atual. O enredo coloca dois atores rio-grandenses do norte que concorrem a uma seleção de uma emissora de televisão do centro do País para interpretarem o personagem de um nordestino!!! A ironia da situação é evidente e cita, indiretamente, este processo de "invenção" do Nordeste e do nordestino que a TV Globo promoveu, a partir dos anos 1970, através de sua programação, desde o modo de falar (e seus sotaques) até o de se vestir e pensar. Ao mesmo tempo em que "abriu" espaços para o regional, tratou de "nacionalizar" este mesmo regional, massificando-o, processo, aliás, que não inventou, porque os jesuítas fizeram o mesmo com os índios brasileiros, ao longo dos séculos XVI e XVII, durante a catequização do Brasil colonial.
A denúncia do espetáculo conclui com uma ironia maior, quando o ator convidado é oriundo do centro do País e aos dois intérpretes cabe a alternativa de representarem a si mesmos nas condições de dependentes neste novo espaço, vivendo papéis de porteiros de edifício em São Paulo... O espetáculo é divertido, tem criatividade (Mathieu Duvignaud responde pela cenografia), com uma boa preparação corporal de Ana Cláudia Albano Viana; preparação vocal de Gilmar Bedaque e trilha sonora original de Gabriel Souto e Toni Gregório.
Na mesma noite, assisti a Subterrâneos, do grupo Gumboot Dança Brasil, de São Paulo, dirigido por Rubens Oliveira, que também assina a coreografia, responde pela trilha sonora gravada (ao lado de Alysson Bruno), o roteiro (com Naruna Costa) e é um dos seus bailarinos. O espetáculo parte de uma dança criada por mineiros da África do Sul, para se comunicarem entre si (note-se que ambos os espetáculos têm, em sua base, questões de incomunicabilidade), já que falavam idiomas diversos mas estavam reunidos por uma caso naquele mesmo espaço, ainda ao tempo do apartheid.
A performance dos bailarinos, a força da música e as cadências rítmicas, a eficiência da mensagem, a composição dos espaços cênicos (Emerson Murad - visagista e Karen Furbino, cenógrafo, além der Danilo Maganha, figurinista), tudo isso causou um impacto extraordinário no público. Não se tinha tempo de respirar. O grupo é extraordinário, simplesmente isso. Talvez porque, para além, do aspecto estético, cada um, ali, tem um comprometimento com o debate político, sendo capaz, contudo, de expressá-lo artisticamente.
Este trabalho - assim como Elza, a que se assisti na semana seguinte - precisam voltar a Porto Alegre para serem revistos ou conhecidos por quem não teve esta oportunidade. Usando um neologismo recente, "são incontornáveis"...
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