Dois pesos e duas medidas: ninguém ouviu, até agora, dos supermercados ou ativistas do Hemisfério Norte, ameaças de boicote a produtos norte-americanos em represália aos incêndios florestais. Já o fogo brasileiro do Cerrado e Pantanal está na mira de represálias comerciais. Qual seria e explicação? As queimadas da América do Sul seriam criminosas porque produzem aquecimento global; já os fogaréus da costa oeste dos Estados Unidos não teriam efeitos ecológicos da mesma natureza, afetando apenas a segurança dos moradores da área atingidas? Uma outra versão diz que haveria interesses comerciais, no caso das retaliações ao Brasil.
O fogo é recorrente
Estas observações não significam que se esteja aceitando as queimadas e incêndios no norte brasileiro sem críticas às autoridades, que pouco fizeram para impedir a expansão dessas calamidades. O fogo é recorrente, desde sempre, e faz parte de uma dinâmica cruel naquelas geografias.
Nas lavouras não há fogo
Grande parte das sementes nativas se fertilizam sob as chamas. Ao torrar se preparam para substituir a vegetação antiga. As cinzas das palhas e dos galhos secos são o adubo natural que sustenta os primeiros anos de vida das novas "plantas". Segundo os técnicos, a única forma de evitar o fogo naquelas secas de padrão saariano é substituir as vegetações. Nas áreas de lavouras não há fogo.
Campanha de boa-fé
Seria necessária uma campanha efetiva e de boa-fé para esclarecer a opinião pública nacional e internacional sobre os fatos. Fazer o mundo e o meio urbano brasileiro entenderem que a hileia amazônica, cerrados e pantanais são biomas diferentes. No caso dos incêndios, a única semelhança é que fogo é fogo, seja de mato ou de um tambor de gasolina. A grande diferença é o material que se queima. Nos pantanais (como nos chacos de nossos países vizinhos, que não estão sob o crivo dos protestos europeus), queimam capins que, ao rebrotarem, serão o pasto nativo dos rebanhos e alimento para a rica fauna natural. Nos cerrados, queimam as madeiras de árvores e arbustos, que renascem vigorosas quando chega a estação das chuvas, a ponto de, no passado, produzir-se arroz sem necessidade de irrigação, o famoso arroz goiano, tão apreciado no sudeste brasileiro.
Luta ideológica
O que não se pode fazer é entrar nessa arena de luta ideológica, midiática e comercial como fizeram os produtores do Pará, com seu vídeo desastrado que virou chacota internacional, demonstrando como os produtores brasileiros são ingênuos e amadores nessa questão. Com a edição entregue a um editor do Sudeste, certamente um jovem de bons princípios e muito talento artístico, o vídeo colocou o mico-leão da Serra do Mar na floresta amazônica. Tamanha gafe não corresponde ao que espera de produtores tão sofisticados, que tratam suas lavouras e criações com técnicas sustentáveis e eficientes, como plantio direto, mecanização, adubação, gestão por computadores, preparando-se para engatar na fase 5G, que será a grande revolução tecnológica do mundo. As lideranças ruralistas devem uma resposta. Não parece descuido, mas desleixo. A conta será cara. Os americanos, como sempre, sabem como fazer.