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Opinião Econômica

- Publicada em 31 de Maio de 2022 às 20:12

A educação dos negros

Economista, Doutor em Teoria Econômica pela Universidade de São Paulo; foi pesquisador visitante na Universidade Columbia e é pesquisador do Insper
Economista, Doutor em Teoria Econômica pela Universidade de São Paulo; foi pesquisador visitante na Universidade Columbia e é pesquisador do Insper
No Brasil, se os estudantes brancos ficassem quase dois anos de férias e depois voltassem para a escola, eles ainda estariam na frente dos pretos. Tal afirmação representa uma forma, talvez mais impactante do que aquela que estamos acostumados a presenciar na mídia, de descrever o resultado do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos).
O programa representa uma forma de medir o desempenho dos estudantes e permite fazer diversas comparações com os resultados. No que diz respeito ao tema racial, em 2018, a diferença de pontuação atingida entre os estudantes brasileiros brancos e pretos correspondia a cerca de dois anos de escolarização.
Com a pandemia, tal cenário se agravou. Enquanto parcela dos brancos conseguiu manter os estudos a distância, os negros de baixa renda tiveram quase uma espécie de férias forçadas. Aqueles que já estavam sendo deixados para trás foram praticamente abandonados pelas autoridades públicas do Brasil.
Porém, há algumas boas notícias no que se refere a desigualdade educacional no país. Ainda que haja disparidades consideráveis no desempenho escolar, a diferença entre os anos de escolaridade média de brancos e negros tem diminuído ao longo do tempo. Além disso, houve importantes avanços na democratização do acesso ao ensino superior, e diversas iniciativas voltadas para diminuir as desigualdades raciais na educação brasileira surgiram.
A lei 10.639, por exemplo, tornou obrigatório o estudo da história da cultura indígena e afro-brasileira no ensino fundamental e médio. Intrínseca à lei está a ideia de que resgatar a cultura e as contribuições de índios e negros na formação do país pode diminuir a reprodução de preconceitos e, ao mesmo tempo, melhorar o desempenho escolar.
Em 2017, estudo realizado com os dados das escolas do ensino médio da cidade de San Francisco, nos EUA, forneceu evidências nessa direção. Thomas Dee e Emily Penner constataram que a introdução de um currículo de estudos étnicos aumentou a frequência dos alunos em 21 pontos percentuais, a média de notas, em 1,4 ponto, e os créditos obtidos, em 23.
Entretanto, no caso brasileiro, a lei 10.639 representa mais uma daquelas que acabaram ficando apenas no papel. Ela não é considerada prioridade por muitos gestores públicos e há falta de acesso a informações sobre o tema. Assim, poucas escolas adotaram alguma ação.
Apesar disso, recentemente, presenciamos uma série de iniciativas antirracistas sendo implementadas nas escolas e na sociedade como um todo. Isso é reflexo da importante mudança na conscientização da sociedade brasileira a respeito dos desafios ligados à agenda racial. Porém, apenas boa intenção não é suficiente para resolver os nossos problemas.
Um bom exemplo vem do esporte. Em experimento realizado por Robert Dur, Carlos Gomez-Gonzalez e Cornel Nesseler juntamente com a Federação Norueguesa de Futebol, foi enviado para um grupo de treinadores um email destacando a importância do futebol na redução do racismo.
Surpreendentemente, o efeito foi no sentido oposto ao esperado, ou seja, os treinadores que receberam a informação começaram a discriminar mais.
Desse modo, tal resultado reforça a necessidade de realizar mais experimentos e avaliar os programas existentes para descobrir quais iniciativas são eficazes na redução da discriminação e da desigualdade educacional e, assim, oferecer maior retorno para sociedade.
Este texto foi escrito conjuntamente com o pesquisador Alysson Portella, parceiro de uma série de estudos que tenho realizado no âmbito do Núcleo de Estudos Raciais do Insper. Além disso, a coluna é uma homenagem à música "The Miseducation", de Lauryn Hill.
 
Michael França
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