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Opinião Econômica

- Publicada em 17 de Janeiro de 2022 às 19:53

Fala sério!

Marcos Mendes
Pesquisador associado do Insper, é autor de "Por que é difícil fazer reformas econômicas no Brasil", e colunista da Folha de S. Paulo
Pesquisador associado do Insper, é autor de "Por que é difícil fazer reformas econômicas no Brasil", e colunista da Folha de S. Paulo
Os estados brasileiros enfrentam crônico desequilíbrio fiscal desde os anos 1980. Há vários incentivos à baixa responsabilidade fiscal: o Congresso e o STF estão sempre prontos para conceder um dinheiro extra ou uma suspensão de dívida. Há, também, rigidez legal que dificulta o trabalho do governador que queira manter as contas equilibradas: vinculações de receitas, gastos obrigatórios e restrições à gestão de pessoal.
Apesar do ambiente hostil ao equilíbrio fiscal, vários estados fazem contínuo esforço de ajuste. Em 1990, Orestes Quércia quebrou o estado de São Paulo para eleger o sucessor. Administrações posteriores consertaram o estrago. Alagoas se recuperou da crise causada por uma dívida contratada, nos anos 1990, à base de precatórios falsos.
O Espírito Santo tem uma história de superação: conseguiu reverter o controle do crime organizado sobre as instituições públicas. O Ceará mostra profissionalismo ao longo de várias gestões. Goiás e Rio Grande do Sul aprovaram, em meio à pandemia, reformas da previdência e administrativa, privatizaram, cortaram privilégios fiscais.
Quatro estados (MT, PB, RO e RR) alcançaram recentemente nota A na classificação de capacidade de pagamento do Tesouro Nacional.
É verdade que todos os estados jogaram parte significativa do ajuste nas costas dos contribuintes federais. Mas muitos fizeram a sua parte.
E o Rio de Janeiro? Embora abençoado por elevadas rendas de petróleo, que, se bem administradas, poderiam garantir confortável situação fiscal, o governo do estado do Rio vive uma crise fiscal que parece não ter fim. E insiste em ser sustentado pelo resto do país.
Em 2017, o governo federal criou o Regime de Recuperação Fiscal, para atender os estados em gravíssima situação. O Rio foi o único atendido por esse socorro, que permitiu a suspensão do pagamento da dívida com a União e novos empréstimos acima dos limites legais. Deveria ter cumprido um plano de ajuste com metas de privatização, redução de benefícios fiscais, controle da folha de pagamento.
O estado não cumpriu várias metas. Continuou concedendo benefícios fiscais e aumentos salariais. Deu um olé na União ao não usar os recursos da venda da Cedae para honrar dívida não paga, conforme previsto no plano. Para manter a despesa de pessoal do Legislativo e do Judiciário acima do limite, aprovou lei estadual que contrariava legislação federal.
Em 2021, o estado já deu reajuste ao funcionalismo. Não aprovou reforma da previdência, ao contrário de 17 estados que já o fizeram.
O Congresso aprovou alterações no Regime de Recuperação e autorizou o reingresso do Rio, que precisa cumprir novo plano de ajustamento. O plano apresentado pelo estado não para de pé. Propõe aumentar o gasto (de preferência com dinheiro dos contribuintes do resto do país) para estimular o crescimento da economia local e, com isso, gerar mais arrecadação, que levaria ao ajuste fiscal pelo lado da receita. É a fórmula mágica do moto-perpétuo.
De acordo com o plano, de 2022 a 2029 as contas só pioram. A despesa primária projetada cresce 31%, e a receita só cresce 18%. Como é possível fazer ajuste estrutural com essa deterioração fiscal? O truque é que, em 2030, último ano do plano, a receita daria um pulo de 11% e a despesa cairia 7%. E, para fechar a conta, ainda precisam pendurar R$ 5 bilhões em "restos a pagar". Empurrar-se um improvável ajuste para 2030.
Ao longo de todos os anos do plano, haveria reajustes salariais. Não há cortes de benefícios tributários. Estimam arrecadar quase R$ 20 bilhões com cobrança da dívida ativa, mais que o dobro do histórico recente. Outros R$ 22,4 bilhões viriam de maior fiscalização da Agência Nacional do Petróleo sobre os royalties a serem pagos ao estado: uma medida fora do controle do governo local.
A estratégia parece ser apresentar um plano para ser rejeitado. Aí corre-se para o STF pedindo nova liminar para suspender o pagamento da dívida, sob o argumento de que as exigências do Tesouro são draconianas e paralisarão os serviços públicos. O STF já se mostrou receptivo a esse embuste em várias ocasiões.
Como dizia o carioca Bussunda, "fala sério!".
Marcos Mendes
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