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Opinião Econômica

- Publicada em 13 de Janeiro de 2022 às 21:27

Lá vem o Fed devagarinho e, então, de repente

Solange Srour
Economista-chefe de Brasil do banco Credit Suisse. É mestre em economia pela PUC-Rio
Economista-chefe de Brasil do banco Credit Suisse. É mestre em economia pela PUC-Rio
Após um período intenso de bonança internacional, como o atual, é natural temer pelo fim. No entanto, há razão para o aumento da incerteza no começo deste ano.
O banco central mais importante do mundo -o Federal Reserve (Fed)- mostra sinais claros de ponderação da necessidade de antecipar e, talvez, intensificar o aperto da política monetária. Não à toa. O aumento dos preços ao consumidor nos Estados Unidos em 2021 foi o maior das últimas quatro décadas, alimentado por problemas na cadeia de suprimentos, escassez de mão de obra e fortes estímulos fiscais.
Mesmo que a inflação esfrie ao longo dos próximos meses em decorrência da moderação nos preços das commodities e da redução dos gastos públicos, o perigo de esse cenário não se materializar na magnitude esperada não é desprezível.
A velocidade da volta das cadeias produtivas continua sendo uma incógnita. A produção industrial global está sendo retomada desde o trimestre passado, mas o surgimento de novas variantes vem sempre acompanhado de menor mobilidade.
Até o momento, os preços de frete continuam elevados, assim como vários insumos permanecem em falta, colocando em risco a tão esperada desaceleração dos preços dos bens industriais.
Na Europa, os bloqueios pré-Natal derrubaram a confiança no crescimento de curto prazo. Nos EUA, as estimativas para o PIB do primeiro trimestre foram revisadas para baixo. No entanto, o foco de atenção está na Ásia, importante fornecedor global de chips e suprimentos industriais. Por lá, os números de infecções continuam baixos, mas o fato de pouco sabermos sobre a eficácia da Sinovac contra a ômicron é preocupante.
A China, onde estão 7 dos 10 maiores portos do mundo, opera uma política nacional "zero Covid" desde a primeira onda e já colocou 30 áreas residenciais em lockdown. Os Jogos Olímpicos de Inverno, em fevereiro, farão com que as restrições sejam endurecidas.
Ao mesmo tempo, o mercado de trabalho americano continua emitindo sinais de que pode se tornar uma fonte inflacionária a médio prazo. A oferta de mão de obra não tem acompanhado o ritmo de aumento da demanda. A taxa de desemprego fechou o ano em 3,9% (abaixo do patamar que o Fed vê como um nível de equilíbrio), enquanto os ganhos salariais chegaram a 4,7% ante o ano anterior -bem acima da tendência pré-pandemia.
O risco de que os salários continuem subindo e esse aumento seja repassado para os preços é alto, pois nem as remunerações mais altas têm sido suficientes para trazer parte dos profissionais de volta ao mercado de trabalho. A falta de mão de obra parece ser mais estrutural e persistente.
Em relação aos preços de commodities, mesmo que o cenário de moderação se confirme, o impacto inflacionário da transição energética verde parece ainda estar subestimado. A necessidade de intensificar a luta contra as mudanças climáticas pode implicar elevados preços de combustíveis fósseis, se quisermos, de fato, cumprir as metas de redução da emissão de carbono.
Há um certo consenso de que, desta vez, a repercussão de um aperto mais forte nos juros nos EUA não será tão prejudicial aos países emergentes, já que seus bancos centrais estão adiantados no processo de aperto monetário. No entanto, é difícil supor com segurança que a credibilidade monetária desses países esteja bem estabelecida, dados o seu histórico de não cumprimento das metas de inflação e os seus frágeis fundamentos fiscais e externos.
É claro que o impacto de uma maior aversão global ao risco depende das políticas econômicas de cada país. O Brasil avançou nos últimos anos para se tornar um país menos vulnerável, mas infelizmente também retrocedemos -especialmente no último ano. Há uma clara percepção de que as regras fiscais foram destroçadas, enquanto a demanda por mais gastos permanece crescente.
As consequências domésticas de uma turbulência externa resultam da capacidade de reação dos governos, que muitas vezes são obrigados a implementar medidas impopulares. Para 2023, os desdobramentos de um cenário internacional mais hostil -conjugado com fundamentos mais frágeis- dificultarão a tarefa de colocar o país em trajetória sustentável de crescimento e controle da inflação.
O Brasil precisa de um choque de credibilidade, mas talvez o Fed não nos permitirá esperar tanto tempo inertes. Tudo indica que dificilmente os candidatos à Presidência poderão se esquivar do debate econômico ou menosprezar a importância da confiança do mercado, como querem fazer crer.
Solange Srour
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