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Opinião Econômica

- Publicada em 15 de Outubro de 2021 às 03:00

Primeira infância perdida

Cecilia Machado
Desde que o termo capital humano se popularizou, diversos estudos vêm confirmando a importância das habilidades e competências que as pessoas adquirem ao longo da vida para o crescimento econômico. No exemplo clássico, salários são tanto maiores quanto maior a escolaridade. Capacitações socioemocionais (como confiança e disciplina) também auferem retornos.
Desde que o termo capital humano se popularizou, diversos estudos vêm confirmando a importância das habilidades e competências que as pessoas adquirem ao longo da vida para o crescimento econômico. No exemplo clássico, salários são tanto maiores quanto maior a escolaridade. Capacitações socioemocionais (como confiança e disciplina) também auferem retornos.
Hoje, sabe-se que a primeira infância, que vai do nascimento até os cinco anos, é um período crítico para o desenvolvimento. Como em qualquer decisão de investimento, há um tempo ótimo para fazê-lo.
Adversidades nos primeiros anos de vida - exposição à pobreza e à violência, insegurança alimentar, abandono e negligência, ou mesmo ambientes que oferecem poucos estímulos e desafios, muitas vezes decorrentes de um baixo nível educacional dos pais- são responsáveis por menores chances de sucesso profissional e por uma pior qualidade de vida muitos anos à frente.
Apenas com os avanços recentes na neurociência foi possível compreender os mecanismos através dos quais o desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças compromete a sequência de acumulação do capital humano.
É durante os primeiros anos de vida que o desenvolvimento cerebral se dá de forma mais rápida. A arquitetura do cérebro se assemelha a de uma construção: sucessivas camadas que são adicionadas dependem da estrutura na qual se apoiam. Esta capacidade adaptativa diminui com a idade, o que torna o desenvolvimento de habilidades mais complexas sob uma base pouco desenvolvida muito mais difícil e muito menos eficaz.
Os cientistas também descobriram que as diversas experiências que as crianças vivenciam em seus primeiros anos também são capazes de interagir com os genes e programá-los de forma tanto positiva quanto negativa. Um ambiente dinâmico, que oferece suporte e encorajamento às crianças, facilita a experiência de aprendizagem, enquanto que a negligência e a falta de estímulos geram baixa capacidade de adaptação ao inesperado.
No cerne do desenvolvimento infantil está toda a experiência que as famílias e as demais pessoas no entorno proporcionam às crianças. É a partir dessas relações e das interações através das quais os bebês se comunicam com seus cuidadores que as habilidades produtivas se desenvolvem. Cabe, portanto, aos pais ou aos responsáveis imediatos pelas crianças o importante papel de iniciar, responder e estimular esta comunicação.
Os resultados apontados pela neurociência têm implicações para as políticas públicas que buscam reduzir desigualdades. Afinal, bebês são muito mais do que uma carga de genes, e o potencial de desenvolvimento encontra-se na combinação da genética com a qualidade das relações e do ambiente no qual se inserem nos primeiros anos de vida.
No Brasil, cerca de 40% das crianças de 0 a 5 anos ainda vivem em situação de pobreza, acima da média de 25% na população. Para elas, políticas de transferência de renda vêm se mostrando insuficientes. Alternativamente, diversas experiências em programas de visitação - que ensinam cuidadores estratégias de comunicação - apresentam resultados mais promissores. Estas intervenções envolvem poucos recursos e quase nenhum investimento de tempo adicional por parte dos cuidadores.
Nas palavras de James Heckman, prêmio Nobel em Economia, o amor que depositamos nas crianças também faz parte da equação econômica. A primeira infância é janela de oportunidade preciosa demais para ser desperdiçada. É um tempo que não volta mais.
 
Cecilia Machado
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