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Opinião Econômica

- Publicada em 17 de Junho de 2021 às 22:20

O risco de desancoragem das expectativas de inflação

Solange Srour
Economista-chefe do Credit Suisse Brasil
Economista-chefe do Credit Suisse Brasil
Nesta quarta (16), tivemos as decisões de política monetária nos EUA e no Brasil. Ambas eram amplamente esperadas: manutenção de juros nos EUA e subida de 0,75 ponto percentual no Brasil. Em meio a uma forte alta da inflação nos dois países, as atenções estavam voltadas para a comunicação dos bancos centrais.
Nos EUA, a possibilidade de o Fed começar a discutir o momento apropriado para a redução das compras de treasuries. No Brasil, a sinalização de que o Banco Central ainda vê como adequado encerrar o ciclo com uma taxa estimulativa.
As autoridades monetárias estão cada vez mais abertas à discussão sobre suas ações e objetivos. Uma comunicação clara aumenta a eficácia da política monetária. Quando adicionalmente o banco central goza de credibilidade, é mais difícil que as expectativas de inflação se movam em razão de surpresas na inflação corrente.
As expectativas desempenham papel primordial no alcance das metas. A percepção sobre a inflação futura é um dos principais fatores que afetam o estabelecimento de preços e salários, ou seja, a dinâmica da própria inflação corrente.
A inflação tem subido bastante em ambas as regiões. O valor acumulado em 12 meses está em 5% nos EUA e em 8% no Brasil -bem acima das metas de 2% e 3,75%, respectivamente. Tanto o Fed quanto o BCB têm mantido o diagnóstico de que a alta da inflação é temporária, resultado de choques de commodities, da quebra das cadeias produtivas e da volta da mobilidade. Sendo assim, ambas as economias devem continuar sob estímulos monetários, sendo baixo o risco de o processo inflacionário se tornar persistente.
Nos EUA, as expectativas, não só as de curto prazo como também as mais longas, subiram bastante nos últimos meses. Essa alta não tem sido acompanhada pelos juros nominais. O mercado tem comprado até agora o discurso que o Fed não atuará tão cedo, e os juros reais -que determinam as decisões de consumo, produção e investimento- vêm baixando. As taxas de juros reais de cinco anos caíram nos últimos 12 meses, de -0,67% para -1,74%. Assim, o Fed acaba adicionando estímulo a uma economia que se recupera vigorosamente sob enorme expansão fiscal.
Já no Brasil, o mercado não tem sido guiado pelo discurso de que a economia ainda precisa de taxas estimulativas e a curva de juros nominal precifica uma Selic perto de 7% no fim deste ano. Os juros reais de 5 anos subiram de 2,32% para 3,58% em 12 meses, mas não o suficiente para ancorar as expectativas. A inflação continua impactada pela desvalorização passada do real, causada pela incerteza fiscal e pelo baixo diferencial de juros e agora será pressionada pela volta dos serviços.
As inflações implícitas negociadas no mercado estão perto de 5% para os próximos cinco anos. Mesmo o Focus, que se move mais lentamente, já projeta uma inflação de 3,78%, ante uma meta de 3,50% para o ano que vem. As projeções de 2023, que em tese deveriam ser menos sensíveis a choques correntes, já estão com a média em 3,37%, acima da meta de 3,25%.
Tanto lá quanto aqui, há um risco relevante de desancoragem. Em contraste com os prognósticos de que a inflação é temporária, famílias e empresas tendem a fazer inferências sobre movimentos futuros da inflação com base nos preços de bens e serviços observados com maior frequência (como gasolina, energia e alimentos).
Nos EUA, a memória da inflação da década de 1970 tem preocupado menos do que o espectro da baixa inflação nos anos 2000. No entanto, nesta quarta, o Fed fez um discurso bastante focado no comportamento das expectativas, enfatizando que está apto para atuar caso estas subam de forma relevante.
No Brasil, a baixa inflação de 2017/2018, principalmente dos serviços, criou a ilusão de que a inércia inflacionária havia acabado, mas não impediu a sensação de perda do poder de compra da moeda. Nesta quarta, o BC também mudou seu discurso, já não vendo espaço para uma política estimulativa e condicionando uma alta maior da Selic a uma deterioração adicional das expectativas.
Quando a inflação fica bem acima da meta por um período prolongado, esta deixa de atrair as expectativas. Instrumentos não faltam para o controle da inflação. Diante de tantas incertezas, o reconhecimento dos riscos e uma comunicação clara aumentam as chances de que o ciclo de alta de juros não seja um fator tão danoso à recuperação da economia.
Solange Srour
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