Mr. Meirelles

Fui à Europa na condição de marido. Minha mulher, Donata Meirelles, foi trabalhar nos desfiles de alta-costura, e eu fui de orgulhoso acompanhante.

Sou filho de uma engenheira civil formada em 1958 na Bahia, que fez pós-graduação em Londres em economia. Sou, portanto, acostumado e admirador desde criança de mulher de sucesso, que batalha e é independente.

Tenho convicção de que o futuro é feminino. Angela Merkel, a grande líder alemã, discursando em Harvard, reafirmou minha convicção. Luiza Trajano, que fez um império com propósito, firmeza e graça, é outro exemplo vivo da capacidade feminina de impor seu pensamento de maneira leve, mas contundente. Liana Moraes dá um show de competência à frente do hospital A.C. Camargo.

Viajar com Donata é sempre uma aula. Quando a conheci, ela já era respeitada como uma das cinco melhores "head buyers" do mundo, segundo o jornal Le Figaro.

Tenho muito orgulho em ver como Valentino, os Gabbana, Christian Louboutin, Laudomia Pucci sempre tiveram respeito profissional por ela.

Donata tem um olho para reconhecer o que vai fazer sucesso na próxima coleção. Vender é um show. E foi a um show da capacidade de vender que eu, Mr. Meirelles, assisti na Sicília no desfile de Domenico Dolce e Stefano Gabbana. Os dois levaram gente do mundo todo para assistir a um dos desfiles mais emocionantes que vi -e, como Mr. Meirelles, já vi muitos.

Num templo de 500 a.C., 130 modelos ao som de Morricone desfilaram beleza, talento e indústria.

Moda não é brincadeira. A festa pós-desfile de Valentino foi na embaixada da Itália. Maria Grazia Chiuri, primeira estilista mulher da Dior, recebeu a Legião de Honra na Embaixada francesa.

O Estado brasileiro historicamente não entende todo o poder do softpower da moda, da música, do cinema. Não entende que música vende agricultura, serviços e manufaturados.

As mulheres são softpower. Audrey Azoulay, da Unesco, Christine Largarde, do FMI, são softpower super power. Minhas amigas Ariana Huffington e Tina Brown, também.

Não dá para gerir ou pensar estes tempos com olhar masculino. Os conselhos de administração precisam do olhar feminino. Tabata Amaral em seis meses já está mudando a política em Brasília. Assim como Michelle Obama e Kamala Harris são o futuro da política americana.

É uma aula olhar o mundo com o olho de Donata. Adoro ela me explicar a estratégia de cada marca, visitar com ela a nova Galeries Lafayette na Champs-Élysées e vê-la decifrar cada detalhe que faz os millennials encheram seus corredores: os cabides digitais que avisam se tem a numeração, os vendedores trans, o banheiro único, as marcas de que nunca ouvi falar e são incríveis.

Tem homens que lidam mal com o sucesso da mulher. Eu amo. Jorge Amado admirava o sucesso de Zélia; FHC, a inteligência sagaz de dona Ruth. Assim como meu pai sempre admirou o sucesso de minha mãe e ela foi fundamental no sucesso dele.

Essa história de que atrás de um grande homem há sempre uma grande mulher está muito mal contada. Na verdade, é do lado. Ou à frente.

Eu gosto de ser Mr. Meirelles na ficha do hotel, de me apresentar (com orgulho) como marido de Donata e de aprender coisas que jamais pensaria sozinho e que acabo usando na minha vida profissional.

Este artigo não é sobre Donata apenas. É sobre o olhar feminino da Paula Lavigne na carreira do Caetano, o da Flora na do Gil, o da Malu na do Vik Muniz -e posso citar outros trocentos exemplos.

John Kennedy uma vez se apresentou como o homem que veio acompanhando Jacqueline Kennedy a Paris. Foi assim que me senti nesta viagem.