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Opinião Econômica

- Publicada em 19 de Março de 2019 às 21:45

O banqueiro que nunca subiu juros

Opinião Econômica: Nelson Barbosa

Opinião Econômica: Nelson Barbosa


/Arquivo/JC
Nelson Barbosa
Ilan Goldfajn deixou formalmente o comando do BC no fim de fevereiro, em cerimônia fechada no Planalto, mas o rapapé só aconteceu nesta semana.
Ilan Goldfajn deixou formalmente o comando do BC no fim de fevereiro, em cerimônia fechada no Planalto, mas o rapapé só aconteceu nesta semana.
Devido aos demais ruídos do governo, a troca de guarda monetária não chamou a atenção para um fato curioso: Goldfajn foi o único presidente do BC que nunca subiu a taxa básica de juros na era de metas de inflação.
Mais especificamente, Goldfajn assumiu o BC com a Selic anual em 14,25% e deixou o posto com ela em 6,5%. Essa redução foi acompanhada de queda da inflação, o que aparentemente indica sucesso na administração do BC. O problema são os detalhes.
Goldfajn nunca subiu juros por dois motivos conhecidos, mas não enfatizados no mercado: o ajuste da Selic para cima foi feito por Tombini, e Goldfajn resolveu comprometer a recuperação da economia para não errar na inflação. Vejamos cada item separadamente.
A inflação acelerou a partir de 2013 e ganhou força em 2015, fruto de choque adverso nos preços de energia e depreciação cambial, em um contexto de baixa taxa de desemprego.
A taxa anual chegou a superar temporariamente 10% na virada de 2015-16, fazendo com que os economistas de sempre argumentassem que a política monetária poderia ter perdido efeito, que corríamos o risco de dominância fiscal e outros exageros.
Nada disso ocorreu. Assim como na virada de 2002-03, quando a inflação anual chegou a 17%, o maior problema estava em choques exógenos adversos. Nos dois casos, o BC elevou a Selic para evitar a propagação do aumento da inflação e teve sucesso na empreitada.
No caso mais recente, o BC de Tombini aumentou a Selic de 7,25%, em março de 2013, para 14,25%, em julho de 2015. Quando Goldfajn assumiu, a Selic já havia sido elevada, a inflação já havia mudado de tendência e a economia passava por grave recessão. Coube ao então novo comando do BC administrar a redução da taxa de juros.
Aí entra o segundo ponto. Dois anos e meio depois, os números mostram claramente que o BC de Goldfajn poderia ter mergulhado bem mais com a Selic.
Quais números? O crescimento do PIB continua lento, o desemprego, elevado, e, mais importante, a inflação medida pelos núcleos do índice de preços está perto do limite inferior da meta de inflação!
Para colocar as coisas em perspectiva, utilizo o raciocínio dos economistas Bráulio Borges e Gilberto Borça Jr, apresentado no blog do Ibre: imagine a situação contrária, economia superaquecida e núcleos de inflação rodando perto do teto da meta do governo. Nesse caso, o BC certamente não hesitaria em elevar a Selic, atendendo ao clamor do mercado.
Como ninguém tem bola de cristal, a condução ultraconservadora da Selic nos últimos anos pode ser justificada pelas incertezas inerentes à política monetária e pelas turbulências políticas pelas quais passamos (Temer, caminhoneiros, volatilidade eleitoral e Bolsonaro).
Além disso, como já abordei em outra coluna há quase um ano, há uma assimetria na condução da política monetária. Errar a Selic para cima é mais tolerado do que errá-la para baixo, pois a população tem maior aversão à inflação do que ao desemprego, e o mercado financeiro não se incomoda em receber uma taxa de juro mais alta, mesmo que errada.
Olhando para a frente, haverá reunião do Copom na próxima semana. A nova direção pode começar a corrigir a política monetária, reduzindo a Selic. Temo que isso não aconteça devido à grande influência dos regulados (mercado financeiro) sobre o regulador (BC). De qualquer modo, desejo boa sorte e sucesso a Roberto Campos Neto.
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research
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