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Opinião Econômica

- Publicada em 10 de Outubro de 2018 às 22:18

Me engana que eu gosto

Opinião Econômica: Laura Carvalho

Opinião Econômica: Laura Carvalho


/Arquivo/JC
Passado o primeiro turno das eleições, o candidato Jair Bolsonaro parece ter mudado mais uma vez de estratégia. Em entrevistas realizadas nos últimos dias a partir de seu bunker na Barra da Tijuca, afirmou que não é a favor da reforma da Previdência de Temer, que manterá os benefícios do Bolsa Família e que não permitirá privatizações no setor de petróleo e geração de energia, precipitando forte queda nas ações da Eletrobras na Bovespa.
Passado o primeiro turno das eleições, o candidato Jair Bolsonaro parece ter mudado mais uma vez de estratégia. Em entrevistas realizadas nos últimos dias a partir de seu bunker na Barra da Tijuca, afirmou que não é a favor da reforma da Previdência de Temer, que manterá os benefícios do Bolsa Família e que não permitirá privatizações no setor de petróleo e geração de energia, precipitando forte queda nas ações da Eletrobras na Bovespa.
Pouco tempo antes da eleição, Bolsonaro não era levado a sério pelas elites financeiras. Seu evidente despreparo para tratar de temas econômicos e seu histórico de defesa do regime militar brasileiro, marcado pelo forte intervencionismo estatal, o descredenciavam entre analistas de mercado e defensores do liberalismo.
O programa protocolado no TSE pelo candidato, apesar de pouco detalhado, teve a clara intenção de conquistar esse público-alvo. Além da independência do Banco Central, o documento prevê, por exemplo, a privatização de estatais, a redução da carga tributária e o aprofundamento da reforma trabalhista pela adoção da carteira de trabalho "verde e amarela", que passaria a valer para contratos individuais feitos por fora da CLT.
As propostas estão em linha com a agenda ultraliberal defendida por Paulo Guedes, o economista que Bolsonaro chegou a chamar de seu "Posto Ipiranga". Em entrevistas, Guedes defendeu privatizar todas as estatais, se declarou contrário aos reajustes automáticos de salário-mínimo e chegou a divulgar uma proposta tributária que unificaria as alíquotas de Imposto de Renda, beneficiando os mais ricos.
Ao fim do primeiro turno, Bolsonaro já era considerado o candidato do mercado e das elites financeiras do País. O problema é que ficaria mais difícil, nesse caso, convencer os eleitores mais pobres de que sua candidatura também atende aos interesses da maioria.
Percebendo que esse é exatamente o campo em que seu adversário leva enorme vantagem - e acumulou grande experiência nas últimas campanhas eleitorais -, Bolsonaro agora tenta livrar-se da pecha de que é apenas um fantoche de uma agenda antipovo das elites.
O problema é que, além de desautorizar Guedes, o candidato teve, para tanto, de desmentir suas próprias afirmações anteriores, criando ainda mais razões para a desconfiança do eleitor. Afinal, em entrevista à GloboNews em 3/8/2018, Bolsonaro já havia admitido, por exemplo, privatizar a Petrobras: "Se não tiver uma solução, sugiro a privatização da Petrobras. Acaba com esse monopólio estatal".
Quanto aos programas sociais, suas visões são ainda mais conhecidas. Em entrevista ao programa Brasil em Discussão, veiculado pela TV Record no dia 13/5/2012, afirmou:
"O grande defeito do político brasileiro é tentar agradar a todo o mundo. Por exemplo, fui o único a votar contra a proposta de emenda constitucional do Antonio Carlos Magalhães que criava o Fundo de Combate à Pobreza. Porque a única verdade que tinha ali é que aumentou a CPMF, de 0,30% para 0,38%. E virou essa demagogia que está aí. Entre seguro-desemprego e Bolsa Família, no ano passado, o governo gastou R$ 40 bilhões. E esse pessoal não está computado como desempregado (...). Então isso aí é tudo voto de cabresto para o governo."
As evidências de que o deputado é apenas mais um político que "tenta agradar a todo o mundo" só não são maiores que a incerteza sobre qual seria o programa econômico implementado em seu eventual governo.
Ao continuar fugindo dos debates, Bolsonaro parece investir exatamente em semear a dúvida, confiando que o eleitor assinará para ele um cheque em branco como fez com Fernando Collor em 1989. E não poderemos dizer que não sabíamos como acaba essa história.
Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico"
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