Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Opinião Econômica

- Publicada em 01 de Outubro de 2018 às 23:20

A crise argentina

Colunista Site JC Samuel Pessoa

Colunista Site JC Samuel Pessoa


/Thiago Machado/Arte JC
Samuel Pessôa
A Argentina saiu da paridade do câmbio em 2002. Crise econômica profunda naquele ano, com queda do PIB de 14,7%, expansão do desemprego para 21,5%, inflação ao consumidor de 41% e aguda desorganização social.
A Argentina saiu da paridade do câmbio em 2002. Crise econômica profunda naquele ano, com queda do PIB de 14,7%, expansão do desemprego para 21,5%, inflação ao consumidor de 41% e aguda desorganização social.
O governo Néstor Kirchner, que assumiu em 2003, beneficiou-se de três fatos.
Primeiro, havia elevadíssima ociosidade. O espaço para o crescimento era amplo - de fato, entre 2003 e 2008 a expansão anual média foi de 8,4%.
Segundo, o governo Menem, na gestão do ministro da Economia, Domingos Cavallo, promoveu uma série de reformas liberalizantes em diversos mercados. As reformas não geraram impactos relevantes sobre a produtividade pois o regime cambial, inapropriado principalmente em um momento de choque negativo de termos de troca, como ocorrera entre 1997 e 2000, impediu o pleno funcionamento da economia.
Terceiro, o cenário mundial se inverteu, a China bombou e as perdas de termos de troca se transformaram em um longo período de ganhos.
Esses três fatores produziram um longo período de crescimento da economia argentina com inflação relativamente baixa para os padrões do país (média anual de 7,9% a.a. entre 2003 e 2008) e, muito em função do ajuste e das reformas de Cavallo, confortável situação fiscal.
Inicialmente a política monetária foi frouxa. Juros muito baixos. O que gerou aceleração da inflação mesmo com a política fiscal em ordem.
Com o tempo, em que pese o enorme crescimento da receita de impostos, a situação fiscal se deteriorou. Foi se construindo um déficit primário e, ao mesmo tempo, a aceleração inflacionária ganhou corpo.
O país não tinha acesso aos mercados internacionais de capital em função do calote que dera na dívida externa em meio à crise. A conta de capital era fechada e, portanto, não se reconstruiu uma dívida externa.
A deterioração econômica produziu, ao longo do período da presidência de Cristina Kirchner, redução do crescimento com aceleração da inflação.
Cristina legou para Macri economia com baixo crescimento, inflação em 25% ao ano e déficit primário na ordem de 5,5% do PIB.
Macri teria muita dificuldade. Ajuste fiscal de 5,5 pontos percentuais do PIB significa refazer o pacto social. Macri não avisou a população. Teria que liderar essa repactuação.
Tomou outro caminho.
O otimismo com o país gerou novo espaço para o endividamento externo.
A crença em ganhos de produtividade - com a melhora da política econômica e a elevação do investimento público - levaram o governo a traçar um cenário de forte aceleração do crescimento.
O ajuste fiscal viria principalmente desse crescimento. Os economistas ortodoxos de Macri com a cabeça de nossos heterodoxos.
O cenário só ficava de pé com a bonança internacional.
O crescimento não veio da forma esperada, o ajuste fiscal foi lento, a dívida externa cresceu, a dívida interna também (especialmente a denominada em moeda estrangeira), o déficit em conta-corrente explodiu e a inflação ficou teimosamente acima de 25% a.a.
A necessidade de dólares para fechar as contas e menor disponibilidade do mundo em ofertá-los jogou a economia nos braços do FMI.
Agora partindo de um ponto muito pior (inflação potencialmente em 40% e retração da economia de pelo menos 3,0% em 2018) e com promessas draconianas - ajuste fiscal de 2,7 pontos percentuais do PIB já em 2019, por sinal ano de eleições presidenciais.
O erro de Macri foi não ter negociado com a sociedade o ajuste fiscal.
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO