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Opinião Econômica

- Publicada em 23 de Agosto de 2018 às 01:00

O paradoxo lulista

Opinião Econômica: Laura Carvalho

Opinião Econômica: Laura Carvalho


/Arquivo/JC
A primeira pesquisa Datafolha desde o registro oficial das candidaturas presidenciais confirmou a tendência de crescimento da intenção de votos no ex-presidente Lula, que chegou a 39% no primeiro turno, e em Jair Bolsonaro, que subiu para 19%.
A primeira pesquisa Datafolha desde o registro oficial das candidaturas presidenciais confirmou a tendência de crescimento da intenção de votos no ex-presidente Lula, que chegou a 39% no primeiro turno, e em Jair Bolsonaro, que subiu para 19%.
O que os números sugerem é que, diferentemente do que vem ocorrendo ao redor do mundo, a candidatura do partido que venceu as últimas quatro eleições vem ganhando força em meio à grave crise econômica que ainda assola o País.
Não são raras as interpretações que atribuem a derrota de Hillary Clinton para Donald Trump nas eleições americanas de 2016 à incapacidade dos governos democratas e republicanos de reduzir desigualdades econômicas e sociais na era da globalização.
A força da pré-candidatura de Bernie Sanders nas primárias do Partido Democrata e os indicativos de que sua plataforma - mais radical, baseada na defesa dos interesses dos 99% contra o 1% mais rico da população - teria chances maiores de derrotar o discurso antiestablishment de Trump dão sustentação a esse diagnóstico.
As mudanças na correlação de forças no Partido Trabalhista britânico, que ficou marcado por beneficiar mais a elite do que os trabalhadores nas vezes em que esteve no governo nas últimas décadas, também se deram num contexto de desemprego crescente e do consequente fortalecimento da extrema direita anti-imigração.
A liderança de Jeremy Corbyn, crítico feroz do desmonte do Estado de Bem-Estar Social promovido até mesmo pelos governos de seu próprio partido, também vem sendo interpretada à luz da rejeição a um sistema econômico que estaria capturado pelos interesses de uma minoria.
Em países da periferia europeia, o desejo de ruptura com o caráter concentrador de renda da agenda econômica em vigor foi canalizado por novos partidos, como o Bloco de Esquerda português e o Podemos espanhol.
Parece haver evidências suficientes, portanto, de que a crise econômica e a ampliação de desigualdades não são um terreno fértil apenas para a extrema direita, que culpa as minorias pelos problemas vividos pelo conjunto da população, mas também para plataformas antiestablishment que incorporam o que o professor Dani Rodrik, da Universidade Harvard, chamou de "bom populismo econômico".
Embora muitos paralelos -mais ou menos razoáveis - já tenham sido construídos entre o crescimento de Bolsonaro e as candidaturas da extrema direita conservadora ao redor do mundo, poucas análises têm buscado explicar um dos paradoxos do atual momento.
Por que, em meio à grave crise econômica e à descrença crescente da população com o sistema em vigor, o PSDB, que esteve na oposição até 2016, vem transferindo boa parte de sua base eleitoral para a plataforma de Bolsonaro, enquanto o PT, que governou durante os 13 anos anteriores, parece estar mantendo a sua?
O que explica que o líder do partido que venceu as últimas quatro eleições presidenciais cresça mais nas pesquisas, em meio ao desemprego elevado e à vulnerabilidade crescente da população, do que as candidaturas que se apresentam como antissistêmicas à esquerda e à direita?
Para além dos ganhos significativos obtidos na base da pirâmide durante os anos 2000 e do fracasso retumbante da agenda econômica implementada pelo governo não eleito de Michel Temer em trazer melhorias à população, o antipetismo feroz de nossas elites também pode ter contribuído para que a candidatura de Lula encampe o desejo de ruptura com o sistema político-econômico atual, mesmo sendo um de seus protagonistas.
Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico"
 
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