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Opinião Econômica

- Publicada em 17 de Agosto de 2018 às 01:00

Turquia e Brasil

Opinião Econômica: Nelson Barbosa

Opinião Econômica: Nelson Barbosa


/Arquivo/JC
Nelson Barbosa
A Turquia passa por dificuldades cambiais, com impacto negativo sobre vários países, incluindo o Brasil. Apesar desse contágio, é preciso diferenciar Brasil e Turquia, pois lá o principal desequilíbrio financeiro ocorre em moeda externa (balanço de pagamentos), enquanto, aqui, nosso principal problema ainda é em moeda interna (fiscal).
A Turquia passa por dificuldades cambiais, com impacto negativo sobre vários países, incluindo o Brasil. Apesar desse contágio, é preciso diferenciar Brasil e Turquia, pois lá o principal desequilíbrio financeiro ocorre em moeda externa (balanço de pagamentos), enquanto, aqui, nosso principal problema ainda é em moeda interna (fiscal).
Três indicadores ajudam a entender a diferença.
Primeiro, em 2017, a Turquia teve déficit de 5,6% do seu PIB em transações correntes com o resto do mundo. No Brasil, o déficit foi de apenas 0,5% do PIB no ano passado.
Segundo, no fim de 2017, as reservas internacionais da Turquia correspondiam a apenas 26% de sua dívida externa total. No Brasil, o mesmo indicador estava em 67%.
Terceiro, caso tivesse que liquidar toda a sua dívida de curto prazo em moeda estrangeira, a Turquia queimaria 93% de suas reservas internacionais no fim de 2017. No Brasil, a mesma ação absorveria apenas 16% de nossas reservas.
A Turquia passa por uma típica crise de balanço de pagamentos, quando um país tem elevado déficit com o resto do mundo, dívida externa alta, reservas internacionais reduzidas e, portanto, grande dependência de financiamento estrangeiro para evitar forte depreciação de sua moeda.
A situação cambial da Turquia (e a da Argentina) de hoje é mais parecida com o Brasil de Fernando Henrique, quando o governo teve que recorrer três vezes ao FMI por falta de financiamento externo (1998, 2001 e 2002).
Os empréstimos contratados pelo governo tucano daquela época só foram liquidados em 2005, pelo governo Lula, e, a partir de então, o Banco Central começou a acumular reservas internacionais, que chegaram a US$ 365 bilhões no fim do governo Dilma.
Desde então, nossas reservas têm flutuado entre US$ 363 bilhões e US$ 383 bilhões, pois a lição foi aprendida: o governo brasileiro deve manter elevadas aplicações de curto prazo em dólar para lidar com a volatilidade vinda de fora.
Reservas altas ajudam na condução da política macroeconômica, mas não significam que estamos imunes a choques vindos do resto do mundo. Ainda sofremos contágio de crises externas, mas, hoje, o impacto é menor e diferente do que acontecia há 20 anos.
De um lado, como, atualmente, o governo brasileiro é credor líquido em moeda estrangeira, a depreciação do real gera ganho de capital imediato para o Banco Central, reduzindo a dívida líquida do setor público em um primeiro momento. Nas crises cambiais de 1997-2002, aconteceu exatamente o oposto.
Do outro lado, a depreciação do real também tende a aumentar a inflação no curto prazo, o que pode fazer com que o Copom eleve a Selic mais cedo do que se esperava. Nesse caso, a taxa média de juros paga pelo governo também tende a subir, e, portanto, o Tesouro tem que aumentar seu esforço fiscal (resultado primário) para controlar o grau de endividamento do setor público.
Como o governo brasileiro já tem déficit primário elevado, esse segundo "canal de transmissão" pode dominar o primeiro com o passar do tempo, sobretudo se não forem feitas as reformas necessárias para reequilibrar o Orçamento público.
Traduzindo do economês, apesar de elevadas reservas em dólar, a fragilidade de nossas contas públicas pode aumentar o impacto da crise turca sobre o Brasil. Assim, os eventos externos das últimas semanas só reforçaram a necessidade de reformas que controlem o gasto e recuperem a arrecadação do governo no Brasil.
Esse problema, que é eminentemente interno (em reais), continua sendo nosso maior desafio econômico e político.
Professor da FGV-SP, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento
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