Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

- Publicada em 09 de Julho de 2021 às 03:00

As mentiras e o perjúrio na CPI da Covid


ANTONIO PAZ/ARQUIVO/JC
Destacado advogado militante, o gaúcho Roberto Siegmann admite que, durante a sua carreira de juiz do Trabalho, "muitíssimas e incontáveis vezes" se deparou com testemunhas mentirosas. Ele avalia que "se as testemunhas soubessem da discussão jurídica acerca das consequências de mentir nos depoimentos, elas mentiriam muito mais do que realmente mentem". Tal revelação veio a propósito do perjúrio na CPI que virou manchete brasileira na quarta-feira à tarde.
Destacado advogado militante, o gaúcho Roberto Siegmann admite que, durante a sua carreira de juiz do Trabalho, "muitíssimas e incontáveis vezes" se deparou com testemunhas mentirosas. Ele avalia que "se as testemunhas soubessem da discussão jurídica acerca das consequências de mentir nos depoimentos, elas mentiriam muito mais do que realmente mentem". Tal revelação veio a propósito do perjúrio na CPI que virou manchete brasileira na quarta-feira à tarde.
O perjúrio - que significa desonrar um juramento - tem origem moral e cristã, e não jurídica. Tanto é assim que em alguns sistemas judiciários há o juramento perante o julgador, com a mão do depoente sobre a bíblia. Nesses sistemas seria razoável por exemplo, defender que um ateu jamais possa ser enquadrado no crime. Mas a surpreendente imagem nos filmes americanos de exigir-se o depoimento do réu sob juramento e que pode ensejar uma outra pena - a decorrente do perjúrio - não se aplica no Brasil.
Siegmann explica que "no sistema brasileiro, o juiz que colhe o depoimento não pode, de imediato, determinar a prisão da testemunha que presta falsas declarações". Tal porque a Constituição Federal assegura a todos a ampla defesa e o devido processo legal. Assim, no máximo poderá a autoridade determinar a imediata condução do mentiroso à autoridade policial, fundamentando o que poderia ensejar um flagrante delito para que ela dê, ou não, início ao devido processo legal. Na prática, isso não ocorre.
O advogado lembra que "há aspectos que também dificultam a configuração da condição da testemunha mentirosa". Segundo parcela expressiva da jurisprudência, o crime se materializa apenas quando há nexo de causa e efeito. Em resumo, o depoimento testemunhal inquinado de falsidade deve ser determinante para a formação da convicção do julgador. Isso indica que não caberia o cometimento em tese, mas apenas em concreto. "Tanto é assim que, segundo alguns doutrinadores, o crime está entre aqueles que admitem o chamado arrependimento eficaz". Bastaria, pois, que antes de prolatada a decisão o mentiroso assinasse um documento, mesmo que particular, retratando-se das mentiras.
Os magistrados brasileiros adotam - diante da impunidade prática como consequência - a simples desconsideração dos depoimentos nitidamente falsos. O juiz coteja o depoimento com as demais provas. Depois do que viu na televisão na quarta-feira, Siegmann arremata que "muito embora saibamos que as CPIs são instrumentos políticos e midiáticos, seria oportuno que os seus membros tivessem orientações mínimas acerca do ordenamento jurídico brasileiro".
 

Descendo da nuvem...

É obrigação do fornecedor a restituição dos arquivos eletrônicos armazenados pelo cliente em serviços de nuvem. O precedente é da 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao condenar a Apple a entregar a um cliente as mensagens do WhatsApp guardadas no serviço de armazenamento em nuvem da empresa - no caso, no ICloud.
A vitória, em causa própria, foi obtida pelo advogado Fernando Rosenthal. Ele ingressou com a ação após perder todas as conversas do WhatsApp em razão de um erro durante a restauração de seu Iphone. (Processo nº 1009992-37.2020.8.26.0011).

Tartaruga carioca

No Rio de Janeiro, também há quelônios processuais. O senador Romário (PL) conseguiu que a 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro suspendesse o leilão de lancha, casa e dois carros dele.
A alienação judicial seria feita para pagar uma dívida de R$ 40 milhões do ex-futebolista. O lance mínimo da casa da Barra da Tijuca é de R$ 6 milhões.

Jeitinho para tentar burlar

Se um bem de família pode ser penhorado para a satisfação de dívida relativa à compra dele próprio, o novo bem de família adquirido com o dinheiro recebido pela venda do primeiro também estará sujeito à penhora. Esta a linha decisória do Superior Tribunal de Justiça, em caso oriundo do Paraná. O nó jurídico pode ser resumido em poucas palavras: endividada, uma mulher vendeu o bem de família penhorável e comprou outro na sequência.
O julgado superior negou provimento a um recurso especial que tentava afastar decisão do Judiciário do Paraná que entendeu como "transmissível a condição de penhorabilidade de um imóvel de família". Na prática, esse posicionamento visou evitar que uma mulher se aproveitasse de uma forma de driblar a regra da Lei nº 8.009/1990 que trata da exceção de impenhorabilidade dos bens de família. O julgamento foi unânime, conforme voto da relatora, ministra Nancy Andrighi.
A situação fática é peculiar. A cidadã fechou contrato de compra e venda de um imóvel que seria usado para morar com a filha, mas não conseguiu honrar as prestações. De acordo com o artigo 3º, inciso II da Lei nº 8.009/1990, esse imóvel seria penhorável por aquele que fez o financiamento que permitiu à mulher fazer a compra do bem de família. O ponto nodal é que a devedora vendeu esse imóvel e usou o dinheiro recebido para comprar outra casa, a qual se tornou impenhorável porque deixou de abranger a situação tratada pela exceção de penhorabilidade.
O acórdão do STJ definiu tratar-se de caso de "transmissão da penhorabilidade ao novo imóvel, desde que se comprove que ele foi adquirido, de fato, com o dinheiro da venda do primeiro bem de família". (REsp nº 1.935.842).

Práticas abusivas

Na sua história de 34 anos, a poderosa Dell Computers - fundada em 1984 no Texas (EUA) - talvez não tenha, antes, sido alcançada por uma decisão judicial tão contundente como a proferida, nesta semana, pela 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4, RS). A procedência de ação movida pelo Ministério Público do Trabalho determinou que a empresa pague uma indenização de R$ 10 milhões por dano moral coletivo. Além disso, deverá "organizar um programa interno para evitar assédio moral, demissões discriminatórias e práticas trabalhistas ilícitas".
O acórdão ainda não tem trânsito em julgado, mas concedeu efeitos de antecipação de tutela. Isso obriga a empresa a tomar providências imediatas para cessar as práticas irregulares. O julgado também determina a indenização individual a todos os trabalhadores demitidos até 12 meses depois de gozarem de licenças previdenciárias. Cada um deles receberá R$ 100 mil.
Conforme o acórdão, a Dell - como braço brasileiro da maior companhia de distribuição de computadores nos EUA - deve "zelar pela boa convivência nas relações interpessoais entre os seus trabalhadores (empregados subordinados e/ou superiores, terceirizados, dirigentes, dentre outros)". A obrigação é a de "impedir situações de assédio moral, eliminando práticas vexatórias ou humilhantes contra seus empregados, diretos ou terceirizados, tanto nos atos de admissão, como durante o contrato de trabalho".
Com 110 mil empregados em vários países, a Dell é a 28ª maior empresa em vendas nos EUA. Todas as ocorrências constatadas que resultaram na condenação judicial foram no Rio Grande do Sul. (Processo nº 0021488-58.2017.5.04.0008).

Desrespeito à gestante

Uma empregada da Calçados Beira-Rio que foi obrigada a trabalhar de pé durante a gestação - além de ter tido contato com substâncias químicas que lhe causavam mal-estar - será indenizada em R$ 150 mil. A decisão é da 8ª Turma do TRT-RS, reformando sentença da 1ª Vara do Trabalho de Santa Cruz do Sul.
A trabalhadora atuou como auxiliar de produção, de maio de 2015 a março de 2017, sendo dispensada sem justa causa. A ação reúne vários pedidos, entre eles a reparação moral, ante os danos resultantes das adversas condições de trabalho.
O desembargador Marcelo José Ferlin D'Ambroso, relator, defendeu a pertinência ao caso da teoria do Enfoque de Direitos Humanos (EDH), classificando-a como uma percepção oposta à tradicional visão econômica do Direito. Mencionou também o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, adotado pelo Brasil, assim como a Convenção 161 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Ambos aprofundam a importância da busca pela saúde e segurança no trabalho. (Processo nº 0020393-55.2017.5.04.0731).

Xeque-mate

Publicado o acórdão do plenário do STF que declarou, por unanimidade, a inconstitucionalidade de dispositivo de uma resolução conjunta do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central. Esta autorizava bancos a cobrar tarifa pela mera disponibilização de cheque especial aos correntistas, mesmo que o crédito não seja usado. Para o relator Gilmar Mendes, "a medida foi uma forma de compensar outro dispositivo da mesma resolução que limitava os juros cobrados na modalidade de cheque especial a 8% ao mês".
O acórdão ressaltou que uma taxa só pode ser criada por meio de lei. E explicitou que "caso a cobrança fosse entendida como antecipação de juros, também seria inconstitucional, por colocar o consumidor em situação de vulnerabilidade econômico-jurídica". (ADI nº 6.407).