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cinema

- Publicada em 17 de Junho de 2022 às 03:00

Tema sem variações

Hélio Nascimento
Não seria um diretor de porte mediano o mais indicado para abordar um assunto tão complexo como o focalizado em A hora do desespero. Acontecimentos como os recentemente ocorridos em escolas e outros locais nos Estados Unidos deram origem a dois filmes impactantes, Elefante, de Gus Van Sant, realizado em 2003 e vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes, e Precisamos falar sobre o Kevin, de Lyne Ramsay, produzido em 2011. Ambos tiveram a repercussão merecida por não se contentarem em reproduzir aspectos exteriores de episódios de extrema dramaticidade. A hora do desespero, dirigido por Phillip Noyce, chega aos cinemas quando a questão da violência volta a ocupar espaço e atenção devido a novos atentados praticados sem causa aparente no país onde a compra de armas é legalizada e até incentivada por setores para os quais a vida humana perde o seu valor maior. Certamente não são as armas que matam, mas os indivíduos que as utilizam. Mas quando estes são criados em sociedades cujos problemas de maior relevância não foram resolvidos e nem são abordados como deveriam ser e nas quais as futilidades são exaltadas e jogos incentivam a brutalidade, tais instrumentos não deveriam ter seu acesso permitido com tanta facilidade. É o que os dois filmes produzidos antes do atualmente em cartaz procuram explicar. Porém, como o primarismo de alguns e o interesse de organizações poderosas predominam, pouco tem adiantado a ação daqueles que não cansam de advertir sobre os perigos de tal política, mais uma - e não apenas nos Estados Unidos - a não distinguir entre causa e efeito, certamente uma das maiores deficiências de nosso tempo.
Não seria um diretor de porte mediano o mais indicado para abordar um assunto tão complexo como o focalizado em A hora do desespero. Acontecimentos como os recentemente ocorridos em escolas e outros locais nos Estados Unidos deram origem a dois filmes impactantes, Elefante, de Gus Van Sant, realizado em 2003 e vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes, e Precisamos falar sobre o Kevin, de Lyne Ramsay, produzido em 2011. Ambos tiveram a repercussão merecida por não se contentarem em reproduzir aspectos exteriores de episódios de extrema dramaticidade. A hora do desespero, dirigido por Phillip Noyce, chega aos cinemas quando a questão da violência volta a ocupar espaço e atenção devido a novos atentados praticados sem causa aparente no país onde a compra de armas é legalizada e até incentivada por setores para os quais a vida humana perde o seu valor maior. Certamente não são as armas que matam, mas os indivíduos que as utilizam. Mas quando estes são criados em sociedades cujos problemas de maior relevância não foram resolvidos e nem são abordados como deveriam ser e nas quais as futilidades são exaltadas e jogos incentivam a brutalidade, tais instrumentos não deveriam ter seu acesso permitido com tanta facilidade. É o que os dois filmes produzidos antes do atualmente em cartaz procuram explicar. Porém, como o primarismo de alguns e o interesse de organizações poderosas predominam, pouco tem adiantado a ação daqueles que não cansam de advertir sobre os perigos de tal política, mais uma - e não apenas nos Estados Unidos - a não distinguir entre causa e efeito, certamente uma das maiores deficiências de nosso tempo.
Enquanto Van Sant e Ramsay procuram chegar às causas, Noyce se contenta em descrever as consequências. E mesmo assim age de forma inadequada. A terrível suspeita que atormenta a mãe em desespero é abordada de forma superficial. O cineasta não se aproxima adequadamente de uma constatação de que a agressividade do filho possa ser causada pelo remorso de ver seu desejo edipiano ser concretizado por um acidente. Tal possibilidade parece não interessar. O que realmente importa é focalizar, repetidamente e sem se importar com o fato de que a repetição se transforma, em cinema ou em qualquer outra arte, em fator de desinteresse e aborrecimento, o esforço da personagem principal. O filme se contenta em expor o sofrimento da mãe, algo perfeitamente natural, mas que não abre para o filme qualquer caminho no rumo de uma visão profunda do tema desenvolvido. O epílogo, então, é constrangedor, não faltando uma mensagem destinada a repor a harmonia depois de acontecimento tão assustador. Nos dois filmes que precedem o de Noyce, há uma procura das origens da violência. No de Ramsay há mesmo uma sequência em que pai e filho participam de um jogo que incentiva o assassinato. E a mãe tem sua vida destruída, inclusive por não saber ver no comportamento do filho pequeno sinais reveladores e premonitórios.
O que o filme de Noyce tem de mais interessante é sua quase transformação em um documentário sobre a utilidade de novos meios de comunicação entre pessoas e sobre a destreza com que os usuários adquiram sobre tais instrumentos. O filme é quase um solo executado pela protagonista, uma virtuose indiscutível de seu instrumento. Mais do que isso, ela também em determinado momento chega a se transformar em detetive dos mais competentes e experientes, chegando mesmo a suplantar a própria polícia ao conseguir entrar em contato com o criminoso que ameaça os jovens que tem sobre seu controle. Isso tudo sem sair da floresta e sem parar de correr. Uma vitória, portanto, da tecnologia e da capacidade de utilizá-la. Só que tudo isso é tratado de maneira a não expor todo os problemas gerados pelo distanciamento e pela inversão de valores. Talvez Noyce obtivesse melhores resultados se a ênfase fosse conferida, por exemplo, na constatação de que a fuga para a floresta e o abandono do filho que se recusa a enfrentar a realidade fossem exemplos de distanciamento humano a ser evitado. No final, a protagonista é apenas a vencedora de uma maratona na qual não tem concorrentes.
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