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Cinema

- Publicada em 10 de Setembro de 2021 às 03:00

A dança dos poderosos

Hélio Nascimento
O cinema feito com o compromisso de colocar o espectador diante do mundo real resiste graças ao empenho daqueles que se recusam participar do ritual de subserviência diante das leis dos mundos paralelos e das ordens emanadas de estúdios interessados apenas em afastar o público da realidade. O grego Constantinos Costa-Gavras, nascido em 1933, é mais um veterano a se manter presente entre os que formam o grupo dos empenhados em manter vivo um cinema afastado dos artifícios e das superficialidades. Graças a seu empenho em denunciar arbitrariedades praticadas por regimes de força, ele se transformou num cineasta universal. Foi com Z, realizado em 1968, vencedor do Oscar, quando reconstituiu os fatos ocorridos antes da instauração, na Grécia, do regime dos coronéis, que ele começou sua trajetória de denunciante de ditaduras. Logo a seguir, com A confissão, ele foi igualmente corajoso em expor os métodos empregados pelos invasores soviéticos da então Tchecoslováquia. Completou sua trilogia sobre os métodos repressivos com Estado de sítio, produzido em 1973, no qual abordava interferências norte-americanas em países da América Latina, a partir de um episódio ocorrido no Uruguai. O ciclo político parecia completo, mas em 1982 ele foi transformado em uma tetralogia com aquele que é um de seus grandes trabalhos, Desaparecido, que tem a ação desenrolada no Chile, logo após o golpe liderado por Pinochet, filme que foi laureado com a Palma de Ouro do Festival de Cannes.
O cinema feito com o compromisso de colocar o espectador diante do mundo real resiste graças ao empenho daqueles que se recusam participar do ritual de subserviência diante das leis dos mundos paralelos e das ordens emanadas de estúdios interessados apenas em afastar o público da realidade. O grego Constantinos Costa-Gavras, nascido em 1933, é mais um veterano a se manter presente entre os que formam o grupo dos empenhados em manter vivo um cinema afastado dos artifícios e das superficialidades. Graças a seu empenho em denunciar arbitrariedades praticadas por regimes de força, ele se transformou num cineasta universal. Foi com Z, realizado em 1968, vencedor do Oscar, quando reconstituiu os fatos ocorridos antes da instauração, na Grécia, do regime dos coronéis, que ele começou sua trajetória de denunciante de ditaduras. Logo a seguir, com A confissão, ele foi igualmente corajoso em expor os métodos empregados pelos invasores soviéticos da então Tchecoslováquia. Completou sua trilogia sobre os métodos repressivos com Estado de sítio, produzido em 1973, no qual abordava interferências norte-americanas em países da América Latina, a partir de um episódio ocorrido no Uruguai. O ciclo político parecia completo, mas em 1982 ele foi transformado em uma tetralogia com aquele que é um de seus grandes trabalhos, Desaparecido, que tem a ação desenrolada no Chile, logo após o golpe liderado por Pinochet, filme que foi laureado com a Palma de Ouro do Festival de Cannes.
Agora, com este Jogo do poder, Costa-Gavras, que nunca abandonou o interesse pelo cinema político, volta a reconstituir fatos reais, abordando a crise grega de 2010, quando os problemas gerados pela dívida do país ameaçaram a zona do Euro, sobretudo depois que foi eleito um governo de esquerda, disposto a encontrar uma solução que não representasse maiores sacrifícios à população. O cineasta adota sempre um lado em seus filmes. Porém, recusa terminantemente adotar um tom panfletário. Seu novo filme não tem como cenário um regime de força. Ao contrário. Fica bem claro durante todo o desenrolar a importância da comunicação com o público através da imprensa, mesmo que, diante de jornalistas, permaneça oculto muito do que é discutido nas reuniões entre os atores deste drama gerado pelas duras leis da economia. Esta, certamente, é a questão central do filme. O costume dos novos governantes em não usar a gravata, por exemplo, é habilmente explorado em todo o desenrolar da ação. O novo ministro das finanças, Yanis Varoufakis, tratado no filme apenas como Yanis, é uma figura destoante, um personagem estranho ao ambiente em que circula, algo evidentemente exposto pela indumentária e pela maneira de agir. Porém, uma das mais expressivas cenas do filme é aquela na qual ele pede ao poderoso representante das finanças alemãs que deixe de criticá-lo e lhe indique um caminho, colocando-se em seu lugar.
Neste filme cujo título original é Adultos na sala, baseado num livro escrito pelo próprio Varoufakis sobre suas experiências como ministro, Costa-Gavras não se recusa a utilizar os benefícios de um olhar mais amplo. Em dois momentos, quando um representante das finanças europeias aproveita as delícias de um jantar caseiro e, principalmente, na cena em que o povo contempla o ministro num restaurante, ele amplia a crítica. E nos momentos finais, ao apelar para a arte da dança, ele evidentemente recorre às sugestões do coreógrafo Kurt Jooss, que no célebre balé A mesa verde, encenado pela primeira vez em 1932, fez uma crítica mordaz à Liga das Nações, antecipou a Segunda Guerra Mundial e colocou em cena a figura da morte. Em sua dança dos poderosos, Costa-Gavras revela ao público como os dilemas são resolvidos e focaliza o verdadeiro espaço onde as crises se resolvem e soluções são decididas. Do outro lado do vidro, permanecem os que têm o direito de serem apenas os observadores da dança e do banquete. O olhar do cineasta é portador de uma crítica dura, mas ele não abdica do direito de optar pela lucidez, quando transforma a festa inicial em um drama revelador tanto de injustiças como de complexidades.
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