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Cinema

- Publicada em 02 de Julho de 2021 às 03:00

Passado e presente

Hélio Nascimento
Claude Lelouch pertence ao grupo que tem resistido ao passar do tempo e que, além de ter aumentado a filmografia, permanece fiel a um estilo e a uma visão de mundo. No caso do realizador deste Os melhores anos de uma vida, cujos créditos no final da narrativa informam que é o opus 49 do diretor, tal fato fica evidente, não apenas por ser o terceiro capítulo de uma agora trilogia, contar com os mesmos intérpretes do primeiro filme, Um homem, uma mulher, produzido em 1966, mas por utilizar os mesmos recursos que transformaram o cineasta no mais conhecido manipulador de descobertas de forma a torna-las acessíveis ao chamado grande público. Não é necessário ter decifrado as propostas da nouvelle-vague, hoje utilizadas em filmes de ação dedicados ao espectador infantil, para estabelecer comunicação com qualquer trabalho de Lelouch.
Claude Lelouch pertence ao grupo que tem resistido ao passar do tempo e que, além de ter aumentado a filmografia, permanece fiel a um estilo e a uma visão de mundo. No caso do realizador deste Os melhores anos de uma vida, cujos créditos no final da narrativa informam que é o opus 49 do diretor, tal fato fica evidente, não apenas por ser o terceiro capítulo de uma agora trilogia, contar com os mesmos intérpretes do primeiro filme, Um homem, uma mulher, produzido em 1966, mas por utilizar os mesmos recursos que transformaram o cineasta no mais conhecido manipulador de descobertas de forma a torna-las acessíveis ao chamado grande público. Não é necessário ter decifrado as propostas da nouvelle-vague, hoje utilizadas em filmes de ação dedicados ao espectador infantil, para estabelecer comunicação com qualquer trabalho de Lelouch.
Na época em que o realizador iniciava a carreira eram notórias as divergências entre Lelouch e o pessoal integrante daquele movimento, tanto os diretores como os críticos. Lelouch era então visto como como uma espécie de aproveitador de recursos proporcionados pelas novas técnicas de filmagem e copiar de maneira superficial riquezas então descobertas. Num diálogo de Os melhores anos..., o diretor provoca seus críticos franceses, fazendo de Ladrões de bicicletas, a obra-prima de Vittorio de Sica, o predecessor da nouvelle-vague. Não deixa de ser uma observação correta até certo ponto, mas é evidente a ironia da constatação, dirigida a uma certa arrogância dos adversários de Lelouch.
São três os filmes dedicados por Lelouch ao casal formado por uma profissional do cinema e um corredor automobilístico, isso porque em 1986 o cineasta realizou Um homem, uma mulher, 20 anos depois, sempre com os mesmos intérpretes. Este é um recurso que François Truffaut havia antes utilizado, já que entre 1959 e 1970, realizou quatro filmes dedicados ao personagem Antoine Doinel, sempre vivido por Jean-Pierre Léaud, ainda um menino no primeiro capítulo da tetralogia. Sem dúvida, o diretor deve tal ideia ao cineasta de Os incompreendidos. Um homem, uma mulher obteve na época um enorme sucesso de bilheteria e, além disso, recebeu o Oscar de filme estrangeiro e venceu o Festival de Cannes, o que transformou seu realizador em alvo de invejosos, como ele próprio classifica, atualmente, os que desprezavam o seu cinema. Um caso semelhante havia acontecido antes no Brasil, depois que Anselmo Duarte, com sua versão de O pagador de promessas, a peça de Dias Gomes, venceu o mesmo festival.
O filme de Lelouch possuía um grande trunfo: a presença no elenco de Jean-Louis Trintignant e Annouk Aimée, num desses casos em que seria temerário depois qualquer substituição. O cinema de Lelouch tem uma característica que nem seus adversários serão capazes de negar: a maneira como ele dirige seus atores e atrizes, transformando intérpretes em verdadeiros personagens.
Além disso, o cineasta sabe criar momentos dotados de perfeição ao captar a realidade, como aquele expressivo movimento de câmera que aos poucos vai se aproximando do ator enquanto os figurantes participam de um exercício de memória. Mas nenhum momento do filme supera o encontro dos protagonistas no pátio da instituição em que ele está internado. Uma sucessão de primeiros planos explora as reações do casal, numa cena em que ele vive num tempo indefinido e ela aparece orientada pela lucidez diante da passagem dos anos. É uma homenagem aos intérpretes aos quais Lelouch tanto deve. Esta espécie de sonata para ator e atriz, que integrou o Festival de Cannes de 2019 como filme convidado, é também marcada por momentos que explicitam a dureza da passagem do tempo. Mas ao ser comparado, por exemplo, com Meu pai, de Florian Zeller, certas superficialidades aparecem, mesmo que elas não apaguem as virtudes, concentradas principalmente em dois intérpretes admiráveis, que não parecem estar diante de uma câmera. Nesse sentido, a citação feita ao filme de De Sica é perfeita, pois uma das lições do neorrealismo, talvez a mais importante delas, é a de que o cinema tem de ser submetido à verdade de cada cena e à autenticidade de cada personagem.
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