Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Cinema

- Publicada em 05 de Junho de 2020 às 03:00

Obras incompletas

Certamente serão muitas as filmografias que poderiam ser maiores do que aquelas deixadas por vários mestres do cinema. Filmes não realizados são como sonhos não concretizados. São vários os obstáculos colocados entre a imaginação e as duras leis impostas pelas forças do sistema produtor.
Certamente serão muitas as filmografias que poderiam ser maiores do que aquelas deixadas por vários mestres do cinema. Filmes não realizados são como sonhos não concretizados. São vários os obstáculos colocados entre a imaginação e as duras leis impostas pelas forças do sistema produtor.
Além dele - e por ser o cinema uma forma de comunicação destinada a audiências amplas - há também a intervenção dos que em certos períodos agem em nome de interesses do poder. Conflitos com financiadores e embates com a censura, dificuldades decorrentes de outros motivos e até mesmo uma correção de rumos ditada pela descoberta de novas possibilidades costumam ser causas da inexistência de filmes planejados e não realizados. Ao espectador resta imaginar o que eles poderiam ter sido se tivessem ultrapassado o terreno da imaginação.
Serguei Eisenstein (1898-1948) foi vítima dos dois sistemas que dividiam o mundo. Outubro teve de ser mutilado antes da exibição, a fim de que fossem retiradas todas as cenas em que aparecia Leon Trotsky. Mais tarde, quando se encontrava nos Estados Unidos, convidado pela Paramount, o cineasta não conseguiu realizar sua versão de Uma tragédia americana, de Theodore Dreiser, romance que acabou sendo filmado por Joseph von Sternberg em 1931. O livro seria outra vez transformado em filme por George Stevens em 1951, com o título de Um lugar ao sol.
Depois da fracassada fase norte-americana, Eisenstein viajou para o México, mas o documentário que lá realizou permaneceu incompleto e o mestre nunca conseguiu editá-lo como havia planejado. De volta à URSS, ele teve proibida as filmagens de O prado de Bejin, cujos negativos teriam sido destruídos. Mas há uma versão oficial de que os mesmos foram perdidos depois que o laboratório onde se encontravam foi bombardeado durante a guerra. Eisenstein foi reabilitado depois que realizou Alexander Newski. Porém, a segunda parte de Ivan, o terrível foi proibida pela censura stalinista e só liberada na década de 1950.
Luchino Visconti (1906-1976) tinha entre seus projetos uma versão de Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust. O cineasta dizia que o seu Proust teria o perfume de Balzac. Mas nem essa aproximação com as normas do romance do século XIX foi suficiente para interessar produtores.
Federico Fellini (1920-1993) tinha entre seus projetos um filme pelo qual tinha carinho especial. Viaggio com Anita já tinha até os intérpretes escolhidos - Gregory Peck e Sophia Loren -, mas um desentendimento entre os produtores causou o cancelamento da obra. O filme foi realizado anos mais tarde por Mario Monicelli, mas não houve repercussão.
Stanley Kubrick (1928-1999) não conseguiu concretizar um de seus mais ambiciosos projetos, uma obra sobre Napoleão Bonaparte. Quem viu Barry Lyndon tem o direito de imaginar o que seria o painel kubrickiano sobre tal personagem.
David Lean (1908-1991) faleceu quando iniciava as filmagens de Nostromo, uma versão do livro de Joseph Conrad, ambientado num país fictício da América Latina. O elenco estava pronto para o início das filmagens quando morreu o diretor, e entre os intérpretes estavam Marlon Brando e Peter O'Toole. O produtor era Steven Spielberg, um grande admirador de Lean.
Glauber Rocha (1939-1981), que sempre apreciou a retórica e as ênfases operísticas, planejava, segundo o depoimento de alguns amigos, realizar uma versão de O guarani, de José de Alencar, tendo como base a ópera de Carlos Gomes, compositor do qual ele havia utilizado alguns trechos em Terra em transe. Mário Peixoto (1910-1992), o diretor de Limite, não conseguiu realizar Onde a Terra acaba, que seria seu segundo filme.
Assim como Outubro, há outros filmes que foram concluídos de forma não planejada por seus diretores, como A glória de um covarde, de John Huston (1906-1987), mutilado pela Metro, e Cleópatra, de Joseph L. Mankiewicz (1909-1993), que chegou às telas numa versão que o cineasta nunca aceitou. Segundo ele, o filme deveria ser uma dupla homenagem a Shakespeare: a primeira parte a Júlio César, peça que ele havia filmado antes, e a segunda a Antônio e Cleópatra. Mankiewicz iria encerrar a carreira com uma obra-prima, Jogo mortal.
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO