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Cinema

- Publicada em 22 de Maio de 2020 às 03:00

Exilados

Um dos exemplos mais relevantes de intolerância e paranoia exercidas contra manifestações artísticas é o do machartismo. No final da década de 1940 e na seguinte importantes nomes do cinema norte-americano tiveram suas carreiras prejudicadas e, em alguns casos, definitivamente interrompidas.
Um dos exemplos mais relevantes de intolerância e paranoia exercidas contra manifestações artísticas é o do machartismo. No final da década de 1940 e na seguinte importantes nomes do cinema norte-americano tiveram suas carreiras prejudicadas e, em alguns casos, definitivamente interrompidas.
Liderada pelo senador Joseph McCarthy, uma campanha contra o que foi chamado de "atividades antiamericanas" teve como alvo principal o cinema. Houve vítimas em outras áreas, mas como o cinema ocupava uma atenção bem maior entre o público, repercussão mais ampla teve a perseguição contra nomes que na época atuavam na arte mais popular. Saíram do país figuras como Charles Chaplin, Joseph Losey, Michael Gordon, Edward Dmytryk e Jules Dassin.
Entre os roteiristas estava Danton Trumbo, um dos grandes do cinema norte-americano e responsável entre outros pelo argumento de A princesa e o plebeu, filme dirigido por William Wyler. Trumbo permaneceu em Hollywood, trabalhando com a utilização de pseudônimos e até ganhando um Oscar pelo roteiro do filme citado. Outros, como Abraham Polonski, que permaneceu 20 anos sem poder dirigir, não procuraram outros países, mas tiveram a carreira interrompida. No cinema, tudo terminou quando Otto Preminger e Kirk Douglas, em 1960, produtores de Exodus e Spartacus contrataram Trumbo e colocaram o nome do roteirista nos créditos. Mas o machartismo permaneceu como exemplo de como a incapacidade de entender o valor da crítica pode se transformar em instrumento não apenas repressor, pois também pode atuar como poderosa força empobrecedora.
Jules Dassin (1911-2008), que abandonou os Estados Unidos e foi trabalhar na França e depois na Grécia, tem seu nome pronunciado como se ele fosse francês, até porque foi naquele país europeu que ele realizou dois filmes notáveis: Rififi e Aquele que deve morrer. O primeiro, tendo como modelo o clássico O segredo das joias, de John Huston, deu, por sua vez, origem a uma série de filmes semelhantes, alguns satíricos. Era um bom policial, com uma sequência antológica, sem diálogos, no qual a ação dos assaltantes é meticulosamente acompanhada. O próprio Dassin interpretava um dos papéis principais.
Três anos depois, em 1957, surgiu a obra-prima do cineasta. Tendo por base um romance de Nikos Kazantzakis, este filme talvez possa ser visto como a mais notável versão cinematográfica da Paixão de Cristo. A ação transcorre em território grego ocupado pelos turcos. Durante a Semana Santa, moradores de uma cidade grega encenam, utilizando como palco a localidade, aquele drama. Mas tal encenação é interrompida pela chegada de habitantes de uma outra cidade, destruída pelo invasor. O teatro se transforma então em realidade, quando os intérpretes da Paixão passam a ser dominados pelos seus personagens, cada um reagindo conforme o papel interpretado diante de semelhantes enfrentando problemas, uns aceitando a presença dos fugitivos e outros vendo neles uma ameaça. O filme, que utilizava o Hino Nacional da Grécia como principal tema musical, tem uma cena final emocionante: um movimento de câmera que exaltava a resistência.
Para os brasileiros há um outro motivo para o interesse por Dassin. Foi ele que, em 1948, dirigiu, na Califórnia, a primeira apresentação de Magdalena, um musical - e não uma ópera, como aqui por vezes se divulga - baseado em temas compostos por Heitor Villa-Lobos. O musical foi escrito por Robert Wright e George Forrest, devidamente autorizados pelo autor das Bachianas Brasileiras. Os dois já haviam escrito a Canção da Noruega sobre temas de Edward Grieg e depois de Magdalena utilizaram a mesma técnica em Kismet, quando trabalharam sobre temas de Alexander Borodin, um musical que depois foi transformado em filme por Vincente Minnelli. Mas foi com Villa-Lobos que eles pela primeira vez trabalharam sobre a obra de um compositor vivo.
Ao dirigir Magdalena, Dassin, de certa forma, deu seu primeiro passo em território estrangeiro. Assim como Losey, que dirigiu na Europa alguns filmes notáveis, inclusive uma versão de Don Giovanni, de Mozart e Da Ponte, Dassin, como exilado, conseguiu dar prosseguimento à sua filmografia, transformando-se, também ele, num lutador e num resistente.
 
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