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Cinema

- Publicada em 08 de Maio de 2020 às 03:00

Produtor e diretor

Stanley Kramer (1913-2001) foi, entre os anos de 1949 e l961, um realizador que desfrutou de grande prestígio devido a sua ousadia em abordar certos temas. Numa fase em que parte da crítica, sobretudo a francesa, se dedicava a descobrir méritos e importância em realizadores até então subestimados, Kramer não foi bem acolhido pelos discípulos dos Cahiers du Cinéma espalhados pelo mundo.
Stanley Kramer (1913-2001) foi, entre os anos de 1949 e l961, um realizador que desfrutou de grande prestígio devido a sua ousadia em abordar certos temas. Numa fase em que parte da crítica, sobretudo a francesa, se dedicava a descobrir méritos e importância em realizadores até então subestimados, Kramer não foi bem acolhido pelos discípulos dos Cahiers du Cinéma espalhados pelo mundo.
Mas isso não impediu que seu nome se transformasse num símbolo da resistência diante das imposições de Hollywood. Ele primeiro atuou como produtor, quando então proporcionou a diversos realizadores oportunidades raramente oferecidas pelos grandes estúdios. Foi a primeira fase de sua carreira, quando foram realizados, entre os anos de 1949 e 1952, filmes como O invencível, de Mark Robson, Cyrano de Bergerac, de Michael Gordon (uma das vítimas do machartismo), A morte do caixeiro viajante, de Laslo Benedek, baseado na peça de Arthur Miller, Matar ou morrer, de Fred Zinnemann, e Cruel desengano, também de Zinnemann, baseado em uma peça de Carson McCullers. Este último filme só foi exibido em Porto Alegre, em apenas uma sala, graças ao patrocínio do Clube de Cinema e ao entusiasmo de P.F. Gastal, pois se tratava de um exemplo de inconformidade diante da rotina então imposta pelos distribuidores e exibidores.
The member of the wedding, este o título original, marcou o fim da primeira fase de Kramer, que passou a dirigir, a partir de 1955, seus filmes. Transformado em produtor e diretor, ele continuou, até 1961, quando realizou Julgamento em Nuremberg, a provocar o sistema hollywoodiano, abordando temas vistos com desconfiança pelo sistema tradicional de produção.
O primeiro filme dirigido por Kramer, Não serás um estranho, é pouco lembrado, mas o segundo, Acorrentados, com um negro (Sidney Poitier) e um branco (Tony Curtis) algemados um ao outro e tentando escapar de perseguidores, foi uma clara demonstração de que Kramer, como realizador, pretendia ser fiel às propostas do produtor que havia sido. O tema do racismo seria substituído no filme seguinte, A hora final, por uma visão dos últimos dias da civilização depois uma guerra nuclear.
Tal tendência teria prosseguimento com O vento será sua herança, que reconstituía o julgamento de um professor que havia sido preso por ter abordado a obra de Darwin numa de suas aulas. Na cena final, com uma Bíblia e a Origem das espécies, uma em cada mão, o advogado do réu, sem nenhuma palavra, compõe uma imagem de tolerância e civilidade.
O filme seguinte de Kramer, Julgamento em Nuremberg, o melhor de seus trabalhos, foi um ato de coragem, numa época, o ano de 1961, em que ainda não se falava claramente sobre a participação da justiça nos crimes nazistas. E o filme ainda focalizava claramente o pragmatismo que anulou penas impostas a magistrados que atuaram durante o período hitlerista. Este é o melhor filme de Kramer como diretor e no qual ele soube extrair interpretações marcantes de Spencer Tracy, Montgomery Clift, Judy Garland, Burt Lancaster e Maximilian Schell, este vencedor do Oscar. O filme foi também o último de uma fase, pois a partir de tal ponto Kramer passou a realizar filmes mais comprometidos com as bilheterias, entre eles Adivinhe quem vem para jantar, no qual o tema do racismo voltava à cena, mas diluído por concessões e superficialidades.
A obra de Kramer, como produtor e realizador, ilustra o dilema criado por ser o cinema essa mescla de arte e indústria. Toda e qualquer arte necessita de público, mas o cinema, pelos altos custos que exige, origina produtos destinados a um público bem mais amplo.
Nem sempre tal processo dá origem a conflitos. Há inúmeros exemplos de obras-primas consagradas pelas bilheterias e filmes indispensáveis para o entendimento de uma época que se transformaram em sucessos comerciais. Kramer foi um dos que procuraram falar de temas importantes e indispensáveis utilizando as normas do espetáculo cinematográfico. Em parte, conseguiu concretizar tal projeto. Ele nunca será visto como o Alain Resnais de Noite e nevoeiro, realizado em 1955, mas foi digno e corajoso ao colocar no banco dos réus aqueles que, atuando numa época em que o poder estava com criminosos, utilizaram as leis de tal período para destruir valores e exaltar a irracionalidade.
 
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