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Cinema

- Publicada em 09 de Abril de 2020 às 03:00

Trilogias

Hélio Nascimento
Certos temas e personagens são demasiadamente ricos em sugestões, significativos em relação a seu tempo e reveladores de sinais antes ocultos que não cabem na primeira ou única obra a eles dedicadas. Em alguns casos o prolongamento de sua presença na tela é planejado, mas em outros a repercussão obtida ou mesmo as sugestões contidas no primeiro filme são tantas que o prolongamento se torna algo impossível de ser evitado.
Certos temas e personagens são demasiadamente ricos em sugestões, significativos em relação a seu tempo e reveladores de sinais antes ocultos que não cabem na primeira ou única obra a eles dedicadas. Em alguns casos o prolongamento de sua presença na tela é planejado, mas em outros a repercussão obtida ou mesmo as sugestões contidas no primeiro filme são tantas que o prolongamento se torna algo impossível de ser evitado.
Os filmes que ainda na época do silencioso foram dedicados por Fritz Lang ao Dr. Mabuse, um gênio do crime em ação na Alemanha numa época em que o nazismo já era uma ameaça visível, podem ser considerados a primeira das trilogias cinematográficas. Mesmo que fosse apenas um filme, realizado em 1922, este tinha perto de quatro horas de duração e foi dividido em duas partes, intituladas Doutor Mabuse, o jogador e O inferno do crime. Assim, a parte seguinte, O testamento do Dr. Mabuse, realizado em 1933, pode ser considerada o título final da trilogia. Por outro lado, considerando o trabalho de 1922 um filme único, a ideia da trilogia permanece, pois em 1960, outra vez na Alemanha, depois de uma longa carreira no cinema norte-americano, Lang encerrou a sua filmografia com Os mil olhos do Doutor Mabuse, fazendo de um descendente do personagem uma espécie de símbolo de uma ameaça permanente.
Lang, que foi um dos deuses cultuados por nomes ilustres da nouvelle vague, entre eles Truffaut e Godard, chegou a aparecer como ator no melhor filme do segundo cineasta, vivendo a si próprio filmando uma versão de A Odisseia, em O desprezo. Quando realizou O ovo da serpente, Ingmar Bergman não procurou escapar da influência do expressionismo e até citou o nome de um personagem de Lang, o encarregado de encontrar o assassino de O vampiro de Dusseldorf.
Outra trilogia dedicada à trajetória de um único personagem é a do japonês Masaki Kobayashi, conhecida pelo título de Guerra e humanidade, realizada entre 1957 e 1961 e formada pelos filmes Não há maior amor, Caminho para a eternidade e A prece do soldado. No total, nove horas de projeção dedicadas a um personagem envolvido pelo tumulto da Segunda Guerra Mundial, quando o Japão dominava parte da China. A mensagem pacifista da obra fez com que muitos a colocassem entre os clássicos do gênero.
Enquanto a trilogia de Lang permanece como uma advertência, a de Kobayashi exaltava a figura de um resistente impulsionado pelo humanismo. O cineasta realizaria depois outros filmes que obtiveram repercussão, entre eles Harakiri, mas Guerra e humanidade permanece como uma referência em sua obra, mesmo que tenha encontrado na época alguns detratores.
Talvez a mais bela das trilogias até hoje realizadas seja aquela que o indiano Satyajit Ray realizou entre 1955 e 1959 e formada pelos filmes Pather Panchali, Aparajito e O mundo de Apu. Ray, que havia sido assistente de Jean Renoir em O rio, que o mestre francês realizou na Índia, iniciou sua carreira de cineasta com o primeiro filme da trilogia, baseada em obras do escritor Bibhuti Bannerji. Segundo o próprio Ray, uma influência decisiva foi sua admiração por Ladrões de bicicleta, a obra-prima de Vittorio De Sica. Um colaborador importante de Ray foi Ravi Shankar, que escreveu a partitura musical. Ray se tornou famoso em todo o mundo cinematográfico com esta trilogia, que não é o único título admirável em sua filmografia. Mas está ao lado dos maiores filmes até hoje feitos sobre a trajetória humana, desde a infância até a maturidade.
Outra trilogia que merece ser incluída entre os grandes momentos de todo o cinema é a realizada por Francis Ford Coppola, tendo como ponto de partida um livro de Mario Puzo. O poderoso chefão - o título permaneceu o mesmo nos três filmes - teve início em 1972 e conclusão em 1990. Entre uma data e outra Coppola realizou grandes filmes, como A conversação e Apocalipse Now, mas nenhum superou esta saga familiar que começa com uma festa e termina com uma encenação operística que encerra um painel sobre um mundo dominado pela violência, o crime e a corrupção. Há divergências sobre qual a melhor das partes, mas todos concordam que as três formam um painel contundente e revelador.
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