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Cinema

- Publicada em 27 de Setembro de 2019 às 03:00

Humanismo em imagens

O neorrealismo italiano deixou ao cinema uma contribuição decisiva quando, nos anos que se seguiram ao fim da Segunda Guerra Mundial, fez valer a proposta de que o cinema deveria se impor não apenas pelas possibilidades da captação e reprodução de imagens em movimento, como também pela recriação da vida diante das câmeras. O que movia os realizadores que inauguraram o movimento era colocar o ser humano no centro da imagem. Rossellini, Visconti e De Sica pensavam assim. O primeiro deles foi o mais radical e imaginava um cinema no qual toda a técnica passasse despercebida, mesmo que estivesse utilizando em cena intérprete profissionais. Um filme como Viagem à Itália resumia a tendência, pois tudo era visto como se George Sanders e Ingrid Bergman não estivessem representando. Visconti, como se sabe, também era um encenador de óperas e peças teatrais, mas também foi o realizador de A terra treme, interpretado por pessoas que recriavam diante das câmeras dramas e experiências pessoais. Mais tarde, quando definitivamente se impôs como um dos maiores, soube mesclar as duas tendências, transformando astros da tela em criaturas reais que estavam acima da biografia de seus intérpretes. De Sica, por sua vez, sobretudo com Ladrões de bicicletas e Umberto D, utilizando pessoas sem experiência teatral ou cinematográfica, foi outro a revelar a essência do cinema, sua capacidade em recriar o real e fazer viver personagens de forma plena. Antonioni esteve mais perto de Rosselini, mas é óbvia a presença dos dois outros mestres, enquanto Fellini, um adepto da fantasia, mostrou, principalmente em A estrada, que, de certas indicações, era impossível distanciar-se.
O neorrealismo italiano deixou ao cinema uma contribuição decisiva quando, nos anos que se seguiram ao fim da Segunda Guerra Mundial, fez valer a proposta de que o cinema deveria se impor não apenas pelas possibilidades da captação e reprodução de imagens em movimento, como também pela recriação da vida diante das câmeras. O que movia os realizadores que inauguraram o movimento era colocar o ser humano no centro da imagem. Rossellini, Visconti e De Sica pensavam assim. O primeiro deles foi o mais radical e imaginava um cinema no qual toda a técnica passasse despercebida, mesmo que estivesse utilizando em cena intérprete profissionais. Um filme como Viagem à Itália resumia a tendência, pois tudo era visto como se George Sanders e Ingrid Bergman não estivessem representando. Visconti, como se sabe, também era um encenador de óperas e peças teatrais, mas também foi o realizador de A terra treme, interpretado por pessoas que recriavam diante das câmeras dramas e experiências pessoais. Mais tarde, quando definitivamente se impôs como um dos maiores, soube mesclar as duas tendências, transformando astros da tela em criaturas reais que estavam acima da biografia de seus intérpretes. De Sica, por sua vez, sobretudo com Ladrões de bicicletas e Umberto D, utilizando pessoas sem experiência teatral ou cinematográfica, foi outro a revelar a essência do cinema, sua capacidade em recriar o real e fazer viver personagens de forma plena. Antonioni esteve mais perto de Rosselini, mas é óbvia a presença dos dois outros mestres, enquanto Fellini, um adepto da fantasia, mostrou, principalmente em A estrada, que, de certas indicações, era impossível distanciar-se.
Os realizadores citados trabalharam no mesmo período de tempo e, certamente, em momento algum da história nenhuma cinematografia contou com um quinteto de cineastas de tal porte trabalhando quase simultaneamente. De Sica, é verdade, teve de fazer concessões para seguir trabalhando como cineasta, mas quando realizou O jardim dos Finzi Contini, já em fase crepuscular, mostrou quanto o cinema havia perdido ao negar a ele outras oportunidades. A riqueza italiana não se limita à lista mencionada, pois havia várias outros, em gêneros diversos, que contribuíram para aumentar sua riqueza. O importante é que as lições permaneceram e, mesmo que não tenham sido totalmente inéditas - Tony, de Renoir, por exemplo, é dos anos 1930 - elas reforçaram a autonomia do cinema, que, sendo uma mescla das artes que o antecederam, tem sua essência e seu valor maior na reconstrução da realidade. Federico Bondi, o diretor de Dafne, não é único da nova geração de cineastas a permanecer fiel às bases do cinema italiano. O filme, que poderia ser um documentário sobre uma jovem com a Síndrome de Down, é um relato de ficção que não se afasta daquele gênero. É um trabalho atento a todos os detalhes, mas sabe transformar as situações e as anotações registradas pela câmera em um relato humanista poderoso e por vezes comovente e que não esquece o humor, esse recurso que, quando bem empregado, enriquece qualquer narrativa. Além disso, o filme é mais um a lembrar a importância da figura humana, algo que o cinema não pode e nem deve prescindir em nenhum momento.
Nos créditos finais, há um agradecimento aos pais de Carolina Raspanti, que é, digamos assim, a atriz principal do filme. Ela interpreta uma jovem que, mesmo tendo suas limitações, é uma personalidade que se destaca em seu meio. Obviamente, Carolina recria muitos de suas experiências, algo que vários já o fizeram, desde os documentários de Flaherty até os filmes italianos antes citados. Eis o cinema em sua plenitude. A personagem, que na cena inicial já revela suas afinidades com a mãe, perde tal proteção e se transforma em protetora do pai, passada a fase de inconformidade e revolta com o acontecido. É longo o percurso a ser percorrido, simbolizado na sequência da caminhada. E quando a memória é inteiramente preservada, numa surpreendente cena final, no rosto dos personagens, talvez uma lembrança bergmaniana do realizador, o humanismo resplandece e tem a exaltação merecida.
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