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Cinema

- Publicada em 21 de Junho de 2019 às 03:00

Passado e presente

Nome sempre ligado à Movida, a abertura espanhola iniciada em 1975, após a morte de Franco, Pedro Almodóvar não foi o primeiro a colocar em imagens inquietações e inconformidades com as limitações impostas a partir de 1939, com o fim da guerra civil e a instalação de uma ditadura que duraria três décadas e meia. Ainda durante o regime falangista, Juan Antonio Bardem realizou, antes de ser preso acusado de subversão, A morte de um ciclista, obra realizada em 1954, de claro teor crítico ao regime e um dos clássicos do cinema espanhol. Bardem foi amigo e colaborador de Luis Garcia Berlanga que, em outro filme célebre, Bienvenido, Mr. Marshall, realizado em 1952, utilizou as armas da sátira e da comédia para fustigar o regime. Também é interessante lembrar que, em 1961, Viridiana marcou uma breve passagem de retorno de Buñuel a seu país. O filme, que obteve repercussão mundial, teve as filmagens autorizadas pelo governo, que depois o proibiu. E há também a presença de Carlos Saura, que iniciando a carreira no final dos anos 1950, se impôs como nome maior e não apenas pela trilogia baseada em coreografias de Antonio Gades. E seria injusto esquecer Victor Erice, que filma pouco e cujo O espírito da colmeia, realizado em 1973, é uma verdadeira obra-prima. Almodóvar se tornou o mais famoso de todos os cineastas espanhóis depois de Buñuel, certamente por não se limitar a aspectos políticos, indo além deles e atuando em área na qual os costumes severamente controlados eram cercados por barreiras que impediam a sua livre expressão através do cinema.
Nome sempre ligado à Movida, a abertura espanhola iniciada em 1975, após a morte de Franco, Pedro Almodóvar não foi o primeiro a colocar em imagens inquietações e inconformidades com as limitações impostas a partir de 1939, com o fim da guerra civil e a instalação de uma ditadura que duraria três décadas e meia. Ainda durante o regime falangista, Juan Antonio Bardem realizou, antes de ser preso acusado de subversão, A morte de um ciclista, obra realizada em 1954, de claro teor crítico ao regime e um dos clássicos do cinema espanhol. Bardem foi amigo e colaborador de Luis Garcia Berlanga que, em outro filme célebre, Bienvenido, Mr. Marshall, realizado em 1952, utilizou as armas da sátira e da comédia para fustigar o regime. Também é interessante lembrar que, em 1961, Viridiana marcou uma breve passagem de retorno de Buñuel a seu país. O filme, que obteve repercussão mundial, teve as filmagens autorizadas pelo governo, que depois o proibiu. E há também a presença de Carlos Saura, que iniciando a carreira no final dos anos 1950, se impôs como nome maior e não apenas pela trilogia baseada em coreografias de Antonio Gades. E seria injusto esquecer Victor Erice, que filma pouco e cujo O espírito da colmeia, realizado em 1973, é uma verdadeira obra-prima. Almodóvar se tornou o mais famoso de todos os cineastas espanhóis depois de Buñuel, certamente por não se limitar a aspectos políticos, indo além deles e atuando em área na qual os costumes severamente controlados eram cercados por barreiras que impediam a sua livre expressão através do cinema.
Almodóvar sempre se expressou em narrativas nas quais o cinema exerce papel importante. Ou então obras nas quais imaginação e memória fazem tempos diversos atuarem como dados que, reunidos e confrontados, propiciam ao espectador uma leitura esclarecedora do que está sendo mostrado na tela. Nascido em 1949, o cineasta, portanto, foi educado pelas leis e os costumes vigentes numa época na qual predominava a repressão. A caverna que serve de cenário importante em Dor e glória é o cenário apropriado para definir uma infância moldada por desconhecimentos cultivados e seguidos como a lei maior. Em uma das cenas, o diretor encena o diálogo da mãe com uma beata da região. Em tal momento, é exaltada a vida em situação precária, por ser o cenário semelhante ao habitado pelos primeiros cristãos. A irreverência vem, quase sempre, acompanhada de ironia. E num determinado momento, numa das cenas passadas na infância do cineasta, Almodóvar se esmera ao mostrar como no menino já habita o futuro diretor. É quando o protagonista ensina as primeiras letras a um analfabeto e também a maneira de como elas formar palavras e frases no papel. E as cartas que ele escreve talvez sejam uma referência a Central do Brasil, o filme de Walter Salles, pois uma das características do cinema de Almodóvar é falar sobre outros filmes.
Um dos maiores trabalhos do cineasta, a principiar pelo título, Tudo sobre minha mãe, é clara homenagem a All about Eve, do grande Joseph L. Mankiewicz. E o filme de agora, sem qualquer dúvida, elege como um dos pontos principais a figura materna, enquanto trata de desequilíbrios emocionais gerados pela ausência de uma harmonia desejada, mas alcançada apenas na concretização da obra de arte. A cena final, quando o cineasta protagonista dirige e assim reconstitui uma cena de sua infância, concretiza esse desejo num epílogo tão belo como revelador. A cena do grande diálogo entre mãe e filho, quando carências são expressas através de palavras, é um momento de grande força e no qual o talento de Almodóvar para moldar personagens através de intérpretes impressiona, ao mesmo tempo em que deve muito a Antonio Banderas e Julieta Serrano. Este é um exemplo de cinema verdadeiro: a expressão colocada na tela através de personagens. E o filme também se impõe pela sinceridade com que são expostos desejos reprimidos e depois libertados. É possível notar a falta de ligações mais elaboradas entre os rituais praticados no reino maternal e o cenário da época. Mas o filme, sem dúvida, merece ser colocado ao lado de obras como Oito e meio, A noite americana e All that jazz, pois, como aqueles, é um fascinante e revelador autorretrato.
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