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Cinema

- Publicada em 14 de Junho de 2019 às 03:00

Imaginação vitoriosa

Hélio Nascimento
Depois de muitos anos, Terry Gilliam consegue mostrar ao público sua versão de Dom Quixote, de Cervantes. Problemas com produtores, morte de atores e dificuldades de causas diversas impediram que as primeiras imagens filmadas fossem editadas. Ele não passou 30 anos filmando. Alguns trechos em que não aparecem os intérpretes do elenco final podem ter sido utilizados, mas é claro que o filme agora exibido é o resultado de um trabalho que foi iniciado e teve continuidade nos últimos anos. Gilliam não foi o primeiro a enfrentar problemas na tentativa de transformar em imagens a narrativa de Cervantes. Orson Welles foi outro que não conseguiu concluir sua versão, depois de enfrentar problemas semelhantes. Mas o Quixote já havia sido levado ao cinema antes. No ano de 1933, G. W. Pabst realizou uma versão do romance na qual o baixo Feodor Chaliapin vivia o papel principal. Em 1957 foi a vez de Grigori Kozintsev realizar a sua versão, na qual a figura do Cavaleiro da Triste Figura foi vivida por Nikolay Cherkasov, o ator de Eisenstein em Alexander Newski e Ivan, o terrível. No ano de l972, o diretor Arthur Hiller realizou uma versão do musical O Homem de la Mancha, com Peter O'Toole como Quixote e Sophia Loren interpretando Dulcineia. E, de todos esses - o de Welles não pode ser julgado -, o de Gilliam é certamente o mais interessante, até por não tentar ser uma transposição do romance, e sim dele se aproximar utilizando recursos de metalinguagem, algo que o próprio Cervantes já havia feito no romance, ao fazer com que, na segunda parte, o protagonista critique o autor de uma continuação assinada por Alonso Fernández de Avellaneda, um pseudônimo utilizado por alguém até hoje não identificado e que se aproveitou do sucesso da primeira parte para publicar uma falsificação. De certa maneira, Gilliam se aproveita desse fato para, também ele, e à sua maneira, voltar ao tema da continuação, do prolongamento de uma primeira narrativa, e também colocando em cena o tema da imaginação dominando o real.
Depois de muitos anos, Terry Gilliam consegue mostrar ao público sua versão de Dom Quixote, de Cervantes. Problemas com produtores, morte de atores e dificuldades de causas diversas impediram que as primeiras imagens filmadas fossem editadas. Ele não passou 30 anos filmando. Alguns trechos em que não aparecem os intérpretes do elenco final podem ter sido utilizados, mas é claro que o filme agora exibido é o resultado de um trabalho que foi iniciado e teve continuidade nos últimos anos. Gilliam não foi o primeiro a enfrentar problemas na tentativa de transformar em imagens a narrativa de Cervantes. Orson Welles foi outro que não conseguiu concluir sua versão, depois de enfrentar problemas semelhantes. Mas o Quixote já havia sido levado ao cinema antes. No ano de 1933, G. W. Pabst realizou uma versão do romance na qual o baixo Feodor Chaliapin vivia o papel principal. Em 1957 foi a vez de Grigori Kozintsev realizar a sua versão, na qual a figura do Cavaleiro da Triste Figura foi vivida por Nikolay Cherkasov, o ator de Eisenstein em Alexander Newski e Ivan, o terrível. No ano de l972, o diretor Arthur Hiller realizou uma versão do musical O Homem de la Mancha, com Peter O'Toole como Quixote e Sophia Loren interpretando Dulcineia. E, de todos esses - o de Welles não pode ser julgado -, o de Gilliam é certamente o mais interessante, até por não tentar ser uma transposição do romance, e sim dele se aproximar utilizando recursos de metalinguagem, algo que o próprio Cervantes já havia feito no romance, ao fazer com que, na segunda parte, o protagonista critique o autor de uma continuação assinada por Alonso Fernández de Avellaneda, um pseudônimo utilizado por alguém até hoje não identificado e que se aproveitou do sucesso da primeira parte para publicar uma falsificação. De certa maneira, Gilliam se aproveita desse fato para, também ele, e à sua maneira, voltar ao tema da continuação, do prolongamento de uma primeira narrativa, e também colocando em cena o tema da imaginação dominando o real.
Terry Gilliam, o realizador de O homem que matou Dom Quixote, foi um dos integrantes do grupo Monty Python, que - primeiro na televisão e, depois, no cinema - criou momentos notáveis da sátira e do humor na tela maior. Gilliam, além de atuar, foi um dos diretores, em parceria com Terry Jones, em dois filmes: Em busca do cálice sagrado e O sentido da vida. Este segundo filme contava com um prólogo admirável, no qual veteranos londrinos e servos da burocracia transformam os edifícios em barcos piratas e partem para a revolta, filmada no estilo dos clássicos de piratas da Warner, algo que certamente contribuiu para que tal trabalho recebesse o Prêmio Especial do Júri no Festival de Cannes. Passando a dirigir filmes depois de encerrado o ciclo com aquele grupo de comediantes, Gilliam seguiu cultivando um gênero no qual a comédia e a sátira se aliavam à fantasia para formarem painéis no qual a crítica à burocracia e à padronização continuavam evidentes. O Barão de Munchausen e os contos dos Irmãos Grimm foram duas referências, e o cineasta também obteve repercussão como Brazil e Os doze macacos.
O Quixote de Gilliam é um sapateiro escolhido para ser o personagem num filme em preto e branco realizado como prova de exame por um futuro cineasta. Este, com o tempo, se transformou num realizador de filmes publicitários e volta para a região do primeiro trabalho, onde reencontra seu ator, que, possuído pelo personagem, age como um cavaleiro andante, lutando pela justiça e enfrentando as forças do mal. Jonathan Price, que foi o general Peron na versão de Evita realizada por Alan Parker, tem uma participação extraordinária, uma verdadeira criação de personagem. Mas ele não é o único destaque num filme que se impõe por sintetizar através de situações e imagens o conflito entre as leis da realidade e as ambições humanas. No caso, o caminho encontrado é o da imaginação sobrevivente e vitoriosa após a aparente derrota. Na busca de um sentido para a vida, a fantasia sobrevive, como uma força indestrutível.
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