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Cinema

- Publicada em 24 de Maio de 2019 às 03:00

Crepúsculo dos deuses

Hélio Nascimento
Cada vez que aqui é exibido um filme argentino surgem por parte de espectadores - e agora também de críticos - manifestações lamentando que o cinema brasileiro não tenha o mesmo nível ou que não tenha seguido caminhos semelhantes. Em primeiro lugar é necessário salientar que do cinema argentino, algo que um ator de destaque na cinematografia do país vizinho afirmou há algum tempo, só vemos no circuito exibidor nacional apenas o que de melhor tem sido produzido. Para que não seja agravado qualquer complexo de inferioridade é bom lembrar que dos três grandes festivais internacionais, o cinema brasileiro já venceu dois, o de Cannes, com O pagador de promessas, de Anselmo Duarte, e o de Berlim, este duas vezes, uma com Central do Brasil, de Walter Salles, e outra com Tropa de elite, de José Padilha. E também é importante lembrar que Glauber Rocha recebeu o prêmio de direção, concedido por um júri presidido por Luchino Visconti, em Cannes, com O dragão da maldade contra o santo guerreiro. Mas isto tudo, que nos remete ao passado, não invalida a constatação de que o cinema argentino, na atualidade, se impõe pela qualidade de seus filmes mais relevantes. Juan José Campanella, o cineasta deste A grande dama do cinema, é o mesmo de duas obras notáveis: O filho da noiva e O segredo dos seus olhos. O primeiro foi indicado ao Oscar e o segundo recebeu a estatueta, que já tinha sido entregue a outro filme argentino, A história oficial, de Luis Puenzo. Numa fase em que o cinema vem se transformando em diversão infantil, impulsionado por um sistema de produção interessado em ampliar ao máximo o que antes era corretamente um espaço reservado aos espectadores de pouca idade, o cinema argentino, sem dúvida é um foco de resistência.
Cada vez que aqui é exibido um filme argentino surgem por parte de espectadores - e agora também de críticos - manifestações lamentando que o cinema brasileiro não tenha o mesmo nível ou que não tenha seguido caminhos semelhantes. Em primeiro lugar é necessário salientar que do cinema argentino, algo que um ator de destaque na cinematografia do país vizinho afirmou há algum tempo, só vemos no circuito exibidor nacional apenas o que de melhor tem sido produzido. Para que não seja agravado qualquer complexo de inferioridade é bom lembrar que dos três grandes festivais internacionais, o cinema brasileiro já venceu dois, o de Cannes, com O pagador de promessas, de Anselmo Duarte, e o de Berlim, este duas vezes, uma com Central do Brasil, de Walter Salles, e outra com Tropa de elite, de José Padilha. E também é importante lembrar que Glauber Rocha recebeu o prêmio de direção, concedido por um júri presidido por Luchino Visconti, em Cannes, com O dragão da maldade contra o santo guerreiro. Mas isto tudo, que nos remete ao passado, não invalida a constatação de que o cinema argentino, na atualidade, se impõe pela qualidade de seus filmes mais relevantes. Juan José Campanella, o cineasta deste A grande dama do cinema, é o mesmo de duas obras notáveis: O filho da noiva e O segredo dos seus olhos. O primeiro foi indicado ao Oscar e o segundo recebeu a estatueta, que já tinha sido entregue a outro filme argentino, A história oficial, de Luis Puenzo. Numa fase em que o cinema vem se transformando em diversão infantil, impulsionado por um sistema de produção interessado em ampliar ao máximo o que antes era corretamente um espaço reservado aos espectadores de pouca idade, o cinema argentino, sem dúvida é um foco de resistência.
O êxito que o cinema argentino vem obtendo se deve, antes de mais nada, ao privilégio concedido nos filmes a personagens que se movem num cenário onde é total o culto do realismo. Os diretores argentinos que atualmente despertam o entusiasmo de críticos e espectadores brasileiros trabalham sobre roteiros de qualidade inegável e através dos quais são colocados dilemas e conflitos que se desenvolvem num mundo real. É a trajetória de personagens que expõe o drama a ser compartilhado pelo espectador. O cineasta fala através das figuras em cena e nunca interrompe a ação para ceder espaço ao discurso. E também não permite que a alegoria se imponha, preferindo o caminho correto, aquele que faz de elementos verdadeiros o desenho da realidade a ser criticada. E há também a manipulação habilidosa de recursos que o tempo transformou em matéria indispensável ao cinema. De certa forma trata-se de um classicismo tratado de forma criativa. Não é novidade para ninguém que o filme de Campanella é uma variação em torno de O crepúsculo dos deuses, o wagneriano título que aqui recebeu o clássico Sunset Boulevard, de Billy Wilder, que começava, aliás, de forma semelhante ao romance Memórias póstumas de Brás Cubas. E se trata realmente de deuses em declínio, uma atriz, seu marido, um diretor e um roteirista. No filme de Wilder era apenas um casal, mas há uma cena, a do jogo de cartas, na qual outros personagens entram em cena. Há mais referências, inclusive a Casablanca, com a citação de Paris e a invasão nazista. Sem esquecer, é claro, a obra-prima que foi Jogo mortal, o opus derradeiro de Mankiewicz.
Campanella trata em seu novo filme das artes de encenação. Tudo parece um teatro, que procura ocultar as verdadeiras intenções dos personagens. Mas nem tudo é oculto. A arma, um prolongamento e uma materialização da agressividade de um personagem, terminará sendo a peça principal no epílogo, algo que o filme antecipa desde que o corretor e sua assistente entram em cena. É importante que nada mais seja revelado, a fim de que ao espectador não seja sonegado o prazer de acompanhar sempre com interesse a trama narrada. Mas é indispensável dizer que estamos diante de outro admirável filme de Campanella, uma espécie de festa cinematográfica à qual não falta a escada que o cinema americano, através de alguns mestres, tanto sabia explorar, detalhe exposto na farsa que antecede à conclusão.
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