Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Cinema

- Publicada em 03 de Maio de 2019 às 03:00

Olhar enriquecedor

Hélio Nascimento
As inovações mais expressivas não costumam surgir a partir de espaços vazios. Ao contrário, elas surgem depois de propostas anteriores deixarem sua marca e serem devidamente observadas antes de dar origem a novas formas de contemplar a realidade. O cinema iraniano aqui conhecido tem como base o neorrealismo italiano, uma escola que floresceu depois da Segunda Guerra Mundial, quando o país, enfrentando problemas decorrentes do período fascista e sofrendo as consequências daquele conflito, criou um cinema voltado para os aspectos mais duros da realidade. Mas tal movimento também tinha suas referências nos primeiros filmes de Chaplin e nas obras realizadas por Jean Renoir na década de 1930. E certamente não é uma coincidência o fato de um dos mestres do movimento, Luchino Visconti, o realizador de Obsessão e A terra treme, ter trabalhado como assistente do grande cineasta francês. Mas não há dúvida que a aproximação maior é com o cinema proposto, além de Visconti, por Rosselini e De Sica. Mas os iranianos mais importantes, tendo à frente Abbas Kiarostami, não se limitaram a serem apenas seguidores daquela escola. Permanecendo fiéis à realidade - e sendo mesmo intransigentes em tal opção- eles a utilizaram de maneira nova, inclusive por utilizar o poder de sugestão de imagens e situações. Há certas passagens nas quais o mais relevante não é mostrado, sem deixar de ser percebido pelo espectador. Trabalhando sob as severas regras de uma teocracia, os diretores iranianos que aqui conhecemos utilizam caminhos antes não percorridos para deixarem seu testemunho, entre eles a manipulação da própria linguagem cinematográfica e o emprego de intérpretes amadores, esta uma das características mais conhecidas do neorrealismo. Alguns cineastas iranianos optaram pelo exílio, mas alguns deles, como o realizador de 3 Faces, Jafar Panahi, permaneceram. Este, por sinal, chegou a ser preso por filmar manifestações contrárias àquele primeiro-ministro, Mahmoud Ahmadinejad, que negava o Holocausto, e depois cumpriu pena domiciliar, antes de retornar às atividades. Seu novo filme, outro trabalho notável, é uma prova de que ele não abandonou o entusiasmo e nem perdeu o talento.
As inovações mais expressivas não costumam surgir a partir de espaços vazios. Ao contrário, elas surgem depois de propostas anteriores deixarem sua marca e serem devidamente observadas antes de dar origem a novas formas de contemplar a realidade. O cinema iraniano aqui conhecido tem como base o neorrealismo italiano, uma escola que floresceu depois da Segunda Guerra Mundial, quando o país, enfrentando problemas decorrentes do período fascista e sofrendo as consequências daquele conflito, criou um cinema voltado para os aspectos mais duros da realidade. Mas tal movimento também tinha suas referências nos primeiros filmes de Chaplin e nas obras realizadas por Jean Renoir na década de 1930. E certamente não é uma coincidência o fato de um dos mestres do movimento, Luchino Visconti, o realizador de Obsessão e A terra treme, ter trabalhado como assistente do grande cineasta francês. Mas não há dúvida que a aproximação maior é com o cinema proposto, além de Visconti, por Rosselini e De Sica. Mas os iranianos mais importantes, tendo à frente Abbas Kiarostami, não se limitaram a serem apenas seguidores daquela escola. Permanecendo fiéis à realidade - e sendo mesmo intransigentes em tal opção- eles a utilizaram de maneira nova, inclusive por utilizar o poder de sugestão de imagens e situações. Há certas passagens nas quais o mais relevante não é mostrado, sem deixar de ser percebido pelo espectador. Trabalhando sob as severas regras de uma teocracia, os diretores iranianos que aqui conhecemos utilizam caminhos antes não percorridos para deixarem seu testemunho, entre eles a manipulação da própria linguagem cinematográfica e o emprego de intérpretes amadores, esta uma das características mais conhecidas do neorrealismo. Alguns cineastas iranianos optaram pelo exílio, mas alguns deles, como o realizador de 3 Faces, Jafar Panahi, permaneceram. Este, por sinal, chegou a ser preso por filmar manifestações contrárias àquele primeiro-ministro, Mahmoud Ahmadinejad, que negava o Holocausto, e depois cumpriu pena domiciliar, antes de retornar às atividades. Seu novo filme, outro trabalho notável, é uma prova de que ele não abandonou o entusiasmo e nem perdeu o talento.
Panahi, entre outros filmes admiráveis, é o realizador de O espelho, que reunia muitas das principais propostas do cinema iraniano, entre elas a utilização de crianças para falar da realidade do país. A protagonista era uma menina que na porta da escola percebe que a mão não virá buscá-la. Revoltada pelo fato retira o véu e a falsa tipoia e diz que que não quer mais trabalhar naquele filme. Estávamos vendo um filme de ficção, que de repente se transforma num documentário sobre uma criança que havia sido escolhida para viver uma personagem num trabalho dirigido pelo próprio Panahi. Agora, há uma referência a recurso semelhantes, pois os dois protagonistas do filme são figuras reais. Uma delas é a do próprio diretor. A outra é uma famosa atriz iraniana, célebre por seus trabalhos em séries de televisão, Behnaz Jafari. Ambos se dirigem ao norte do Irã, depois que a atriz recebe um vídeo que, aparentemente registra os últimos momentos de uma jovem suicida, que enfrenta problemas em sua comunidade por desejar ser atriz. O vídeo será um registro da realidade ou um trabalho de interpretação da jovem? Há um diálogo durante a viagem, no qual a atriz recorda uma conversa com Panahi na qual ele havia manifestado desejo de fazer um filme com ela sobre um fato semelhante.
Paralelamente a esse tema, o filme vai utilizando tal ponto de partida para erguer um painel no qual ficam registrados atrasos e preconceitos. A vila visitada pelo diretor e a atriz se transforma então num cenário onde ao mesmo tempo em que a televisão espalha superficialidades e traços de modernidade os habitantes são movidos por conceitos que procuram marginalizar atividades relacionadas a criações artísticas e ações humanistas. A figura do irado irmão mais velho aparece como uma caricatura e deixa expressa sua violência registrada por um detalhe no plano final, enquanto as duas mulheres escolhem a estrada, símbolo de um novo caminho. O novo filme de Panahi é outra demonstração de que são muitos os caminhos colocados à frente de uma arte que procure se distanciar do infantilismo e da acomodação que se ampliam no cinema atual.
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO