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Cinema

- Publicada em 26 de Abril de 2019 às 03:00

Rebelde sem causa

Hélio Nascimento
O fato de ser baseado em fatos reais e reconstituir a trajetória de Carlos Puch, um ladrão e assassino que praticou muitos crimes em Buenos Aires, nos anos 1970 do século passado, não é propriamente um obstáculo para os que tentarem classificar O anjo como um Laranja mecânica argentino. O filme de Stanley Kubrick, adaptado de um livro de Anthony Burgess pelo próprio cineasta, não é diretamente baseado em acontecimentos verdadeiros, mas provavelmente esteve presente na memória do diretor Luis Ortega enquanto reconstitua a vida de um jovem especialista em pequenos furtos e que termina se transformando numa ameaça e num perigo. O fato de Carlos ser uma espécie de Alex portenho só confirma a constatação de que a ficção de Burgess e Kubrick nunca esteve distante da realidade. Em vez de ter três cúmplices, o que formava no relato kubrickiano um quarteto de jovens, numa referência irônica ao modismo pop da época, o protagonista de agora tem suas atividades ampliadas depois que conhece os pais de um colega de colégio. Enquanto o filme de Kubrick enfrentou problemas em vários países, inclusive na Inglaterra, onde só há alguns anos foi liberado para exibição, depois de passar vários anos impedido de ser exibido por decisão judicial, provocada pelo próprio cineasta, depois que atos de violência semelhantes ao filme foram praticados, o de Ortega não enfrenta os mesmos problemas, pois os tempos são outros e as plateias do mundo ocidental passaram a reagir de outra forma diante de certos relatos sobre uma realidade difícil de ser contemplada. E parece também que foi devidamente entendido o processo que revela ser o cinema uma influência sobre aspectos superficiais da realidade e nunca sobre a essência da transgressão. Esta se expressa de várias maneiras e nem necessitaria do cinema para agir como força a ser contida pelas regras da civilização.
O fato de ser baseado em fatos reais e reconstituir a trajetória de Carlos Puch, um ladrão e assassino que praticou muitos crimes em Buenos Aires, nos anos 1970 do século passado, não é propriamente um obstáculo para os que tentarem classificar O anjo como um Laranja mecânica argentino. O filme de Stanley Kubrick, adaptado de um livro de Anthony Burgess pelo próprio cineasta, não é diretamente baseado em acontecimentos verdadeiros, mas provavelmente esteve presente na memória do diretor Luis Ortega enquanto reconstitua a vida de um jovem especialista em pequenos furtos e que termina se transformando numa ameaça e num perigo. O fato de Carlos ser uma espécie de Alex portenho só confirma a constatação de que a ficção de Burgess e Kubrick nunca esteve distante da realidade. Em vez de ter três cúmplices, o que formava no relato kubrickiano um quarteto de jovens, numa referência irônica ao modismo pop da época, o protagonista de agora tem suas atividades ampliadas depois que conhece os pais de um colega de colégio. Enquanto o filme de Kubrick enfrentou problemas em vários países, inclusive na Inglaterra, onde só há alguns anos foi liberado para exibição, depois de passar vários anos impedido de ser exibido por decisão judicial, provocada pelo próprio cineasta, depois que atos de violência semelhantes ao filme foram praticados, o de Ortega não enfrenta os mesmos problemas, pois os tempos são outros e as plateias do mundo ocidental passaram a reagir de outra forma diante de certos relatos sobre uma realidade difícil de ser contemplada. E parece também que foi devidamente entendido o processo que revela ser o cinema uma influência sobre aspectos superficiais da realidade e nunca sobre a essência da transgressão. Esta se expressa de várias maneiras e nem necessitaria do cinema para agir como força a ser contida pelas regras da civilização.
O filme de Ortega está longe daquele que poderia ser seu modelo, mas há pontos de contato bem claros. Carlos, assim como o personagem londrino, tem ligações com a música. É verdade que não há, agora, uma aproximação ao universo de Beethoven, mas o protagonista de O anjo sabe tocar piano, às vezes se expressando através de temas populares e em determinado momento executando de forma agressiva inconformidade diante de um símbolo nacional. O encontro com a família transgressora é o contato com o lado até então parcialmente oculto. E quando o pai enterra o tesouro observado, pelo filho, se torna explícito que certos sinais de civilização, como o piano em casa, apenas escondem certos impulsos, num processo no, qual a hipocrisia não está ausente e representa uma das causas da rebeldia do filho. Essencialmente, Carlitos, como é chamado, encontra na outra família não apenas o complemento que faltava como também uma forma de exercitar um erotismo até então reprimido. Essa mescla de agressividade e atração erótica é outro detalhe a não passar despercebido, na medida em que coloca a repressão como uma das causas da violência que passa a comandar o comportamento do protagonista.
O filme é assim mais um a desenvolver o tema das explosões causadas pelas imposições de um mundo que nem sempre sabe utilizar a lucidez para alcançar o equilíbrio destinado a evitar rupturas e atos de violência. Estamos diante de uma obra que se mantém fiel a uma das características do cinema argentino, ou do cinema argentino que aqui tem sido exibido. Cinema tem de ser feito com personagens reais e situações que trazem para a tela os sinais mais reveladores da realidade em que vivem as figuras focalizadas. As cenas que encerram a narrativa evidenciam que Ortega não se afasta de tal princípio. A figura materna cercada por agentes da lei é uma espécie de poder ampliado e símbolo poderoso de um elemento controlador. E a dança que vem a seguir expressa através do movimento a inconformidade que dita o comportamento do protagonista. É como o olhar de Alex no filme de Kubrick, igualmente um desafio e uma ameaça. Certamente um alerta a ser anotado.
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