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Cinema

- Publicada em 15 de Março de 2019 às 01:00

Proposta equivocada

Hélio Nascimento
Os modelos existem para servirem de base a obras que - neles tendo sua base - ampliem significados e aprofundem propostas. Nos tempos atuais, quando é cada vez menor o número de cineastas realmente interessados em enriquecer o cinema - e não se trata de saudosismo, mesmo porque os poucos resistentes são admiráveis e algumas obras-primas foram recentemente realizadas -, vez por outra surgem filmes que tentam recuperar o espírito de certas fases da história do cinema. O policial, o musical e outros gêneros são referências que seguidamente aparecem, na maioria das vezes, em tentativas que apenas revelam que os originais são realmente insuperáveis. As exceções são aquelas que assumem suas limitações e expressam, através de seus realizadores, sua estatura reduzida diante da grandeza do original. Calmaria, filme realizado por Steven Knight, é mais uma tentativa de criação a partir de narrativas, figuras e situações que, anteriormente, fizeram parte de obras que o tempo não abalou e continuam pertencendo a um acervo cujo conhecimento é indispensável e fundamental. O que vemos na tela é uma sucessão de imagens que procuram recriar personagens, paisagens e situações que, no passado, permitiram a realizadores como Howard Hawks e Raoul Walsh, para citar apenas dois nomes, a realização de alguns clássicos. É óbvia a tentativa de fazer de intérpretes hoje em atividade cópias de Humphrey Bogart e Laureen Bacall. Não é uma crítica aos intérpretes do filme de Knight constatar o artificialismo resultante de tal tentativa, mesmo porque o problema de Calmaria é outro.
Os modelos existem para servirem de base a obras que - neles tendo sua base - ampliem significados e aprofundem propostas. Nos tempos atuais, quando é cada vez menor o número de cineastas realmente interessados em enriquecer o cinema - e não se trata de saudosismo, mesmo porque os poucos resistentes são admiráveis e algumas obras-primas foram recentemente realizadas -, vez por outra surgem filmes que tentam recuperar o espírito de certas fases da história do cinema. O policial, o musical e outros gêneros são referências que seguidamente aparecem, na maioria das vezes, em tentativas que apenas revelam que os originais são realmente insuperáveis. As exceções são aquelas que assumem suas limitações e expressam, através de seus realizadores, sua estatura reduzida diante da grandeza do original. Calmaria, filme realizado por Steven Knight, é mais uma tentativa de criação a partir de narrativas, figuras e situações que, anteriormente, fizeram parte de obras que o tempo não abalou e continuam pertencendo a um acervo cujo conhecimento é indispensável e fundamental. O que vemos na tela é uma sucessão de imagens que procuram recriar personagens, paisagens e situações que, no passado, permitiram a realizadores como Howard Hawks e Raoul Walsh, para citar apenas dois nomes, a realização de alguns clássicos. É óbvia a tentativa de fazer de intérpretes hoje em atividade cópias de Humphrey Bogart e Laureen Bacall. Não é uma crítica aos intérpretes do filme de Knight constatar o artificialismo resultante de tal tentativa, mesmo porque o problema de Calmaria é outro.
Em anos recentes, têm sido vistos filmes que, propositadamente, costumam embaralhar segmentos da narrativa, sem outro objetivo por parte de seus realizadores do que parecer difícil e criativo. É sempre necessário lembrar que mesmo aqueles marcos do desenvolvimento cinematográfico, que, na época, causaram algumas dificuldades e hoje podem ser vistos e compreendidos por qualquer espectador, mesmo aqueles desinteressados pelos aspectos mais relevantes do cinema, nunca abandonaram a coerência e as leis do realismo. Nunca abandonaram os personagens e as situações reais. Isso pode ser constatado por uma visão de obras como Cidadão Kane e Hiroshima, Meu amor. Sem ter a altura de alguns mestres, certos diretores de nosso tempo procuram esconder limitações com o artificialismo e o exibicionismo que apenas expressam sua mediocridade e sua falta de imaginação. Assim, a todo o momento a faixa sonora se transforma, graças a exageros e distorções, em recurso que nada mais faz do que perturbar a narrativa. Isso para não falar em personagens que nada mais são do que caricaturas. É só observar a figura do marido no filme de Knight para que sejam constatadas deficiências de encenação que chegam ao ridículo.
O filme possui outra deficiência fatal. Um dos modelos que o realizador procura seguir é de O show de Truman, de Peter Weir. Naquele trabalho, o cineasta australiano organizava tudo de forma bem clara. Um espetáculo televisivo de grande duração acompanhava um personagem desde seu nascimento até o momento da descoberta definitiva e do encontro com o criador da encenação. Embora tal operação nunca tenha sido realizada, tudo era coerente no filme. Agora não. O trabalho de Knight coloca o espectador diante de uma fantasia no qual fica expresso o desejo de reencontro com o pai perdido. Mas ao colocar este como protagonista, o sonho permitido pelo jogo eletrônico tem o foco alterado. Uma confusão que não esconde a incapacidade de retirar a alegoria da realidade. Mais uma vez, estamos diante de um equívoco. O cinema contempla o real e dele retira significados e revelações. As confusões orquestradas por Knight não escondem a incapacidade de pensar o real. Numa época em que, no cinema, certos limites já foram estabelecidos, o novo e o revolucionário só podem ser encontrados na construção cada vez mais sólida de personagens reais, uma forma pela qual nossa arte poderá contribuir para o conhecimento cada vez mais profundo do ser humano, o que certamente não é o caso de Calmaria.
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