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Cinema

- Publicada em 11 de Janeiro de 2019 às 01:00

Desaparecido

Hélio Nascimento
A inexistência de paraísos terrestres, algo que até os mais ingênuos descobriram nos anos finais do século passado, não deve impedir o surgimento de propostas e protestos destinados a recuperar ou instalar valores essenciais ao convívio humano e ao funcionamento racional das sociedades. A chamada Primavera Árabe certamente não resultou num mundo perfeito, mas, pelo menos na Tunísia, permitiu o aparecimento de um cineasta que, desde seu primeiro filme, A amante - exibido aqui no ano passado -, revelou um talento acima da média, o que, agora, se confirma neste Meu querido filho. Naquele filme, como agora fica bem claro, algo confirmado pelo próprio cineasta, ficou evidente que o cinema tunisiano tem espaço para abordar certos temas e parece não ter na censura, esse agente do retrocesso e criador de inverdades e omissões, um obstáculo intransponível. Mohamed Ben Attia, trabalhando em regime de coprodução e tendo o apoio dos Irmãos Dardenne, confirma, em seu novo trabalho, um lugar destacado entre os cineastas contemporâneos. Seu cinema é aquele focalizado em personagens e procura se erguer sobre bases realistas. É uma arte cujo ponto de partida é aquele no qual experiências individuais revelam impasses e problemas, sem a necessidade de discursos, esse caminho escolhido pelos incapazes de armar cenas que sejam valiosas pelo que revelam. A família humana, este microcosmo que sintetiza um mundo, é o tema predileto do cineasta, que, no filme anterior, colocou em cena um personagem em conflito com a sociedade e seus valores e, agora, volta a expor um drama gerado pela inconformidade, acompanhando, na primeira parte, um ritual capaz de criar dor e sofrimento e, na segunda, a angústia gerada pela busca do que parece irremediavelmente perdido.
A inexistência de paraísos terrestres, algo que até os mais ingênuos descobriram nos anos finais do século passado, não deve impedir o surgimento de propostas e protestos destinados a recuperar ou instalar valores essenciais ao convívio humano e ao funcionamento racional das sociedades. A chamada Primavera Árabe certamente não resultou num mundo perfeito, mas, pelo menos na Tunísia, permitiu o aparecimento de um cineasta que, desde seu primeiro filme, A amante - exibido aqui no ano passado -, revelou um talento acima da média, o que, agora, se confirma neste Meu querido filho. Naquele filme, como agora fica bem claro, algo confirmado pelo próprio cineasta, ficou evidente que o cinema tunisiano tem espaço para abordar certos temas e parece não ter na censura, esse agente do retrocesso e criador de inverdades e omissões, um obstáculo intransponível. Mohamed Ben Attia, trabalhando em regime de coprodução e tendo o apoio dos Irmãos Dardenne, confirma, em seu novo trabalho, um lugar destacado entre os cineastas contemporâneos. Seu cinema é aquele focalizado em personagens e procura se erguer sobre bases realistas. É uma arte cujo ponto de partida é aquele no qual experiências individuais revelam impasses e problemas, sem a necessidade de discursos, esse caminho escolhido pelos incapazes de armar cenas que sejam valiosas pelo que revelam. A família humana, este microcosmo que sintetiza um mundo, é o tema predileto do cineasta, que, no filme anterior, colocou em cena um personagem em conflito com a sociedade e seus valores e, agora, volta a expor um drama gerado pela inconformidade, acompanhando, na primeira parte, um ritual capaz de criar dor e sofrimento e, na segunda, a angústia gerada pela busca do que parece irremediavelmente perdido.
A sequência de abertura explicita o desconforto do filho de maneira a expor um conflito que não necessita de palavras para ser exposto. Attia é perfeito na forma como conduz seus intérpretes. E um deles, Mohamed Dhrif, no papel do pai, é excepcional, oferecendo ao espectador uma verdadeira aula de interpretação cinematográfica. Esse pai, que sofre terrivelmente a fuga do filho - que foge para a Síria a fim de se integrar ao Estado Islâmico -, tem seu padecimento exposto através de imagens manipuladas de forma a não persistirem na tela em tempo que poderia diluir sua dramaticidade. Attia utiliza a montagem de forma a impedir o desinteresse gerado por desnecessários prolongamentos. Em alguns momentos apenas sugere a passagem do tempo, sem nunca perder de vista o drama vivido pelo protagonista. O cineasta mostra, também, grande habilidade em focalizar que os pais do filho inconformado - e, depois, ausente - vivem um casamento em crise. São pequenas as sugestões filmadas, mas elas são suficientes para que seja revelada uma situação - que certamente é um dos motivos, mesmo que de forma simbólica - para a fuga e a escolha extremista. O cineasta também procura evitar qualquer gênero de maniqueísmo, mas deixa claro que respostas tão violentas como abomináveis têm suas causas, nem sempre abordadas quando a condenação de certos métodos se torna obrigatória em nome de valores que nunca deveriam ser abandonados.
De alguma forma, o filme lembra Missing, um dos melhores títulos na filmografia de Costa-Gavras, no qual a busca de um pai pelo filho desaparecido era igualmente o tema exposto de forma manifesta, algo que permitia que fosse colocado na tela não apenas a distância entre personagens, porque o relato também se estruturava como uma vigorosa denúncia sobre o irracionalismo e a opressão exercidos em nome da democracia. No filme de Attia, não são abordados os métodos dos extremistas, mas o filme se aproxima, de forma apropriada, desse dilema de nossa época, desse perigo que consiste na transformação da inconformidade diante de rituais vazios em respostas inapropriadas e capazes de conduzir o ser humano a um estágio no qual predomina a barbárie. No citado filme de Costa-Gavras, o filho era vítima. Agora, ele se transforma em agente de um processo condenável. Evitando a ênfase condenatória, Attia é capaz de notar alguma esperança no plano final.
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