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Operação Lava Jato

- Publicada em 18 de Junho de 2019 às 03:00

Mensagens vazadas impulsionam discussão sobre imparcialidade jurídica

Caso pode abrir margem para anulação de sentenças de Sergio Moro

Caso pode abrir margem para anulação de sentenças de Sergio Moro


MICHAEL DANTAS/AFP/JC
A revelação de conversas atribuídas a procuradores da força-tarefa da operação Lava Jato em Curitiba e ao atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, divulgadas a partir do dia 9 de junho pelo site The Intercept Brasil tem levantado questionamentos acerca da imparcialidade do ex-magistrado ao julgar casos da operação. Juristas apontam que os diálogos podem afetar principalmente as decisões tomadas por Moro enquanto juiz, já que as denúncias têm potencial, inclusive, para provocar a anulação da prisão do ex-presidente Lula, caso a veracidade dos fatos seja comprovada.
A revelação de conversas atribuídas a procuradores da força-tarefa da operação Lava Jato em Curitiba e ao atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, divulgadas a partir do dia 9 de junho pelo site The Intercept Brasil tem levantado questionamentos acerca da imparcialidade do ex-magistrado ao julgar casos da operação. Juristas apontam que os diálogos podem afetar principalmente as decisões tomadas por Moro enquanto juiz, já que as denúncias têm potencial, inclusive, para provocar a anulação da prisão do ex-presidente Lula, caso a veracidade dos fatos seja comprovada.
Para Lenio Luiz Streck, professor de Direito Constitucional, jurista e advogado, caso o vazamento das mensagens seja fruto de prova ilícita, tanto Moro quanto o procurador da Reública Deltan Dallagnol e os demais envolvidos poderão escapar de um processo judicial. "É consenso no Direito brasileiro que ninguém pode ser condenado com base em prova ilícita. Porém, os réus podem ser beneficiados por ela", disse. "Se uma carta for aberta criminosamente, por exemplo, e nela se descobrir que um inocente está pagando por um culpado, o inocente poderá se beneficiar dessa prova ilícita". Ou seja, conforme Streck, se os diálogos não forem objeto de hackeamento, os envolvidos poderão ser punidos, mas se o vazamento for produto de ilicitude, nada acontecerá com eles.
Para o jurista, o caso em questão trata-se de um escândalo jurídico-político. "Imaginemos que se descobrisse que o juiz estivesse trocando mensagens com o advogado de defesa e depois o réu fosse absolvido. A casa cairia", disse. "Conversas e combinações entre juiz e acusador pode, e com advogado de defesa não? Ora, juiz só fala com promotor nos autos. E assim também é com o advogado. Trata-se de uma questão republicana. E nada pode ser feito às escondidas", ressaltou.
A questão principal que deve ser esclarecida no âmbito jurídico é se Moro deu qualquer orientação aos procuradores sobre como o Ministério Público Federal (MPF) deveria atuar nos processos, já que o Código de Processo Penal proíbe essa conduta no artigo 254, ao estabelecer que o juiz será considerado suspeito "se tiver aconselhado qualquer das partes". De acordo com Antonio Tovo, advogado especialista em Direito Penal, em se confirmando a veracidade dos conteúdos, há uma clara violação dessa imparcialidade. "Nitidamente as mensagens demonstram aconselhamento ao MPF: 'ouça tal testemunha', 'não entra com recurso agora', 'é melhor trocar as fases de ordem', e isso deveria provocar a suspeição desse juiz, impedindo-o de julgar essas ações que foram aconselhadas. Se as mensagens forem confirmadas, então isso provocará a nulidade dos processos julgados por Moro."
Conforme Tovo, a melhor forma de se verificar a nulidade dos processos seria individualizando os casos em que os aconselhamentos ocorreram. "Na dúvida sobre a imparcialidade, deve prevalecer a nulidade." Para ele, nesses casos deve haver a garantia de um julgamento justo, o chamado "devido processo legal" - garantia de ser julgado por um terceiro imparcial.
Quanto à punição dos agentes envolvidos, Tovo aconselha que é preciso ter cautela e esperar para ver se as provas serão consideradas lícitas. "Por enquanto, a análise geral que se pode fazer desse caso é que ninguém está acima da lei", afirmou.
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) manifestou, em nota, "perplexidade e preocupação" com o caso e recomendou o afastamento de Moro e dos procuradores envolvidos para que as investigações corram sem qualquer suspeita. "A íntegra dos documentos deve ser analisada para que, somente após o devido processo legal - com todo o plexo de direitos fundamentais que lhe é inerente -, seja formado juízo definitivo de valor", disse o órgão.
Em outro trecho do texto, a OAB reforçou os valores defendidos pela instituição. "A independência e imparcialidade do Poder Judiciário sempre foram valores defendidos e perseguidos por esta instituição, que, de igual modo, zela pela liberdade de imprensa e sua prerrogativa Constitucional de sigilo da fonte."
Por fim, salientou seu compromisso histórico em defesa da Constituição, da ordem jurídica do estado democrático e do regular funcionamento das instituições, se responsabilizando em tomar as medidas cabíveis para esclarecer os fatos junto ao Supremo Tribunal Federal, à Procuradoria-Geral da República, ao Conselho Nacional do Ministério Público e ao Conselho Nacional de Justiça.
 

Dallagnol, Moro e Ministério Público Federal falam em ação criminosa

O coordenador da força-tarefa do Ministério Público Federal na Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, rebateu as acusações publicadas pelo The Intercept, que provariam o conluio entre o Judiciário e Ministério Público. Em vídeo, Dallagnol disse que a operação foi vítima de um ataque hacker, e que o "criminoso" invadiu o sistema dos celulares. "Ele sequestrou contas de aplicativos de troca de mensagens, se fez passar por jornalistas e procuradores, e nosso receio é que a atividade criminosa avance para falsear e deturpar fatos", acusou. Para ele, não houve conluio ou quebra de imparcialidade nas mensagens divulgadas.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, negou, por meio de nota, que nas mensagens trocadas tenha havido "qualquer anormalidade ou direcionamento" da sua atuação como juiz. "Quanto ao conteúdo das mensagens que me citam, não se vislumbra qualquer anormalidade ou direcionamento da atuação enquanto magistrado, apesar de terem sido retiradas de contexto e do sensacionalismo das matérias, que ignoram o gigantesco esquema de corrupção revelado pela Operação Lava Jato."
Também em nota, o Ministério Público Federal se manifestou sobre o vazamento de conversas privadas de membros da força-tarefa da Lava Jato. No comunicado, a força-tarefa disse que seus membros foram vítimas de ação criminosa de um hacker que, supostamente, praticou os mais graves ataques à atividade do Ministério Público, à vida privada e a segurança de seus integrantes. "A violação criminosa das comunicações de autoridades constituídas é uma grave e ilícita afronta ao Estado e se coaduna com o objetivo de obstar a continuidade da operação", diz o texto.

Entenda o caso

Reportagens do site The Intercept Brasil revelaram mensagens atribuídas ao ex-juiz federal, atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, e ao coordenador da força-tarefa da Lava Jato de Curitiba, Deltan Dallagnol. Os diálogos mostram que os dois trocavam informações sobre ações da operação e sugerem que Moro pode ter interferido na atuação da Procuradoria.