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Política de drogas

- Publicada em 09 de Abril de 2019 às 03:00

Governo Bolsonaro é contra definir critério para tráfico

Julgamento que trata da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal será retomado

Julgamento que trata da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal será retomado


MIGUEL SCHINCARIOL/AFP/JC
O governo Jair Bolsonaro (PSL) não pretende incluir em sua Política Nacional sobre Drogas a criação de um critério objetivo sobre a quantidade necessária para distinguir o usuário de um traficante. O projeto deve ser apresentado ainda em abril e está sendo discutido pelos ministros Osmar Terra (Cidadania), Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública), Damares Alves (Mulher, da Família e dos Direitos Humanos) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde).
O governo Jair Bolsonaro (PSL) não pretende incluir em sua Política Nacional sobre Drogas a criação de um critério objetivo sobre a quantidade necessária para distinguir o usuário de um traficante. O projeto deve ser apresentado ainda em abril e está sendo discutido pelos ministros Osmar Terra (Cidadania), Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública), Damares Alves (Mulher, da Família e dos Direitos Humanos) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde).
Atualmente, a Lei de Drogas, em vigor desde 2006, não é objetiva para enquadrar detidos com entorpecentes como traficante, que pode ser punido com prisão, ou usuário, passível de penas alternativas. Na prática, quem decide pelo enquadramento é primeiro o policial que faz a abordagem e, depois, o promotor ao acusar e o juiz que vai julgar o caso. Os críticos a essa subjetividade atrelam a ausência de uma quantidade determinada de drogas aos altos índices de encarceramento no Brasil.
A posição do governo vai no sentido contrário da defendida pela Comissão de Juristas criada em 2018 pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM). No relatório final, o grupo defendeu penas mais duras para grandes traficantes ligados a organizações criminosas, mas sugeriu a descriminalização do uso pessoal de uma quantidade de até dez doses. A definição de unidade para cada droga, propôs a comissão, seria definida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). No caso da maconha, uma unidade seria o mesmo que um grama.
O Supremo Tribunal Federal (STF) agendou para o dia 5 de junho a retomada do julgamento que trata da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. Até agora, os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso votaram a favor da descriminalização. Barroso sugeriu um limite de até 25 gramas para uso. O próximo voto será do ministro Alexandre de Moraes, que encomendou um estudo à polícia de São Paulo para saber o perfil dos presos por porte de maconha.
No governo Federal, a definição de um critério objetivo para distinguir usuário e traficante está sendo debatido no âmbito do Ministério da Cidadania. O Ministério da Justiça e Segurança Pública, comandado por Sérgio Moro, não está envolvido na questão, mesmo a pasta abrigando a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad).
Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, Osmar Terra, titular da Cidadania, disse já ter discutido com o ministro Moro e com Beggiora o tema. "Minha posição, e já conversei isso com o ministro Moro e com o Beggiora (Luiz Roberto, da Senad), não tem a menor possibilidade de isso dar resultado, estabelecer quantidade para separar traficante e usuário. Até porque isso desmoraliza a polícia, um ministro da Justiça e o governo assinarem embaixo que policial não tem competência para definir o que é um traficante", disse.
Segundo o ministro, a posição da comissão é "filosófica" enquanto a defendida por ele é científica. Para ele, a "epidemia" de consumo e tráfico de drogas é resultado da ausência, nos últimos 30 anos, de uma política rigorosa de combate às drogas. "Tem que diminuir oferta de droga na rua, não se diminui oferta colocando limite para quantidade, não prendendo traficante e liberando a droga", disse.
"É aumentar o rigor, seguir o modelo dos países em que houve redução no consumo de drogas, redução da violência. Inclusive, futuramente redução de número de apenados. Diminuindo a quantidade de droga em circulação, vai diminuir número de prisões. Primeiro vai aumentar, depois vai diminuir", explicou Terra.
Como exemplo, o ministro citou o Japão que, segundo ele, liberou o uso de droga durante a II Guerra Mundial mas, ao fim do conflito, aumentou o rigor das penas com possibilidade de prisão até para usuários. Em 1954, seis anos após a lei entrar em vigor, contou Terra, o país asiático chegou a prender cerca de 60 mil por envolvimento com tráfico. Quatro anos depois, em 1958, completou o ministro, foram presas apenas 60 pessoas.

Descriminalização é caminho seguido no mundo todo, defende jurista

O advogado Pierpaolo Cruz Bottini integrou a comissão de juristas criada, em 2018, pelo presidente da Câmara dos Deputado, Rodrigo Maia (DEM), para modernizar a Lei de Drogas. No entendimento de Bottini, a defesa do governo pela não definição de um critério objetivo para diferenciar um traficante de um usuário resulta no encarceramento em massa que abastece as facções criminosas que dominam o sistema prisional.
Sobre as afirmações de Terra, que classificou como "filosóficas" e sem bases científicas as propostas da comissão, Bottini afirma que o mundo todo começa a seguir o caminho da descriminalização uma vez que a guerra contra as drogas não obteve o resultado esperado.
"Você tem o mundo todo, progressivamente, adotando políticas de descriminalização do consumo e alguns países indo além e descriminalizando a própria venda. Não é uma questão filosófica, é de constatação. Você não teria um número cada vez maior de países adotando essa política se não fosse algo que deu resultado", disse.
Bottini é categórico ao afirmar que "o Direito Penal não é o instrumento para resolver problema do consumo". Ele salienta que a posição da comissão é que a repressão ao consumo é um caminho político criminal ruim, equivocado. "Toda comunidade internacional que estuda seriamente o tema chegou à conclusão que essa repressão produz encarceramento em massa, o que significa aumento do crime organizado, e tira daqueles consumidores problemáticos, que precisam de tratamento, o acesso à saúde, uma vez que sendo considerado um criminoso, não vai ter acesso aos serviços básicos".