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Jornal da Lei

- Publicada em 13 de Novembro de 2018 às 01:00

'Direito Eleitoral jamais correrá na velocidade da internet'

Promotor Rodrigo Zilio é cético sobre responsabilização de irregularidades

Promotor Rodrigo Zilio é cético sobre responsabilização de irregularidades


/CLAITON DORNELLES/JC
As eleições de outubro deste ano ficaram marcadas pela grande disseminação de fake news (notícias falsas), principalmente por meio das redes sociais. O coordenador do Gabinete de Assessoramento Eleitoral do Ministério Público (MP) Eleitoral, promotor Rodrigo López Zilio, aponta, em entrevista ao Jornal da Lei, a dificuldade do Direito Eleitoral acompanhar o Direito Digital e a interferência das fake news nas últimas eleições presidenciais.
As eleições de outubro deste ano ficaram marcadas pela grande disseminação de fake news (notícias falsas), principalmente por meio das redes sociais. O coordenador do Gabinete de Assessoramento Eleitoral do Ministério Público (MP) Eleitoral, promotor Rodrigo López Zilio, aponta, em entrevista ao Jornal da Lei, a dificuldade do Direito Eleitoral acompanhar o Direito Digital e a interferência das fake news nas últimas eleições presidenciais.
Jornal da Lei - As eleições deste ano ultrapassaram os meios tradicionais e aconteceram ativamente on-line, um fenômeno recente e em ascensão. É possível mensurar a interferência das redes sociais e das fake news nas eleições?
Rodrigo López Zilio - Temos duas questões aqui - relações interpessoais e ações interinstitucionais. Os grupos de WhatsApp são relações interpessoais, e isto não é mensurável. Outra coisa são as notícias disparadas de nível interinstitucional, como a Cambridge Analytica, que, através da captação de dados pessoais, interferiu no Brexit (a saída do Reino Unido da União Europeia) e na eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, por exemplo. Isso é maior e mensurável. No Brasil, a questão foi interpessoal. São grupos de adesão. Entre amigos, as pessoas acreditam no que querem acreditar. Foram eleições de lados extremos. Mesmo sabendo que aquilo é falso, a torcida pelo candidato faz com que a pessoa não se preocupe de fato com a veracidade. Dessa forma, não há como medir se as fake news alteraram a vontade dos eleitores, quais números seriam modificados com ou sem elas. O Direito Eleitoral não está preparado para esse fenômeno. Não há instrumentos para entender e combater o problema de modo adequado e efetivo. O Direito jamais vai correr junto com a internet. A lei é para ser algo estável. São normas genéricas, abstratas e permanentes. O Direito Digital, por sua vez, é mutável. São conceitos e características antagônicas. Ao mesmo tempo, não vejo que o Direito Eleitoral deve atuar como regulador ou censor da internet. Este é um mundo livre. Não é o Judiciário que deve regular verdades e mentiras na internet. Ele deve impedir mentiras. Mas tudo é educação digital, ou falta de.
JL - Durante o segundo turno, o candidato Jair Bolsonaro, agora presidente eleito, foi acusado, pelo jornal Folha de S.Paulo, de ter tido ajuda de uma rede para apoio na internet, o que configuraria crime eleitoral. Ele só será considerado culpado, porém, se comprovada sua ciência da situação - negada pelo futuro presidente. Não sendo ele o culpado, e comprovando-se o fato, quem será julgado?
Zilio - A prova produzida até agora é jornalística. Hoje, o processo é inviável. Mas isso pode mudar. De acordo com a legislação, nem toda fake news é considerada crime. Os crimes previstos são injúria, difamação, calúnia ou "fato que sabe inverídico, em relação a partidos ou candidatos e capazes de exercerem influência perante o eleitorado" (art. 323). Esse último é um conceito muito aberto, que exige a análise de cada uma das notícias distribuídas e culpa cada pessoa que fez a distribuição com penas baixíssimas. É aí que estão tentando incluir as notícias falsas. Mas a legislação é inadequada. As fake news são um fenômeno novo, e essa lei é datada de 1965. Como punir um crime digital com uma lei tão antiga? O que é ser capaz de exercer influência perante o eleitorado? Como mediremos isso? A lei é incipiente. As pessoas se valeram de um vazio legislativo. A legislação eleitoral é analógica, e o Direito e as eleições hoje são digitais. São conceitos antagônicos. Dentro dessa divergência, não tem como combater um fenômeno sem instrumentos legislativos. Sou bem pessimista sobre as responsabilizações sobre essas possíveis irregularidades.
JL - Imagina-se que, com o surgimento de novos problemas eleitorais, sejam criadas leis para lidar com eles. É possível prever se haverá instrumentos legislativos suficientes que compreendam os fenômenos digitais?
Zilio - O Congresso deveria mudar a legislação. A cada nova eleição, reformas acontecem na legislação eleitoral. Mas as mudanças sempre estão aquém do necessário. Fundamentalmente, por uma questão lógica: quem faz regras de Direito Eleitoral são os membros do Congresso - deputados e senadores. Quem redige é quem se beneficia. Logo, as mudanças que ocorrem são pontuais, cosméticas e não enfrentam o problema. Não vejo interesse no Congresso em modificar fundamentalmente regras eleitorais. Por exemplo: mesmo com os escândalos das eleições de 2014, as prestações de contas de financiamentos de campanha ainda não têm mecanismos suficientes para fiscalização. Alguma mudança virá. Mas sou cético em questão de mudanças efetivas.
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