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Infraestrutura

- Publicada em 19 de Julho de 2019 às 03:00

Sem manutenção, infraestrutura é corroída pelo tempo

Resultado da falta de recursos é a deterioração de rodovias, ferrovias, pontes e viadutos

Resultado da falta de recursos é a deterioração de rodovias, ferrovias, pontes e viadutos


/JOÃO MATTOS/ARQUIVO/JC
Durante anos, o trecho ferroviário entre Santos e Cajati, no Vale do Ribeira, foi usado como importante corredor para o transporte de carga e de passageiros no estado de São Paulo. Com o decorrer dos anos, a falta de manutenção - e a desativação do ramal - devastou os trilhos. O mato tomou conta da ferrovia, os dormentes apodreceram e os vagões abandonados estão sendo corroídos pela ferrugem. Na BR-010, no Pará, o cenário é semelhante, com a diferença de que a estrada está em operação. Crateras no acostamento e a má qualidade do pavimento ameaçam a vida dos motoristas que passam por ali - resultado da falta de manutenção da rodovia.
Durante anos, o trecho ferroviário entre Santos e Cajati, no Vale do Ribeira, foi usado como importante corredor para o transporte de carga e de passageiros no estado de São Paulo. Com o decorrer dos anos, a falta de manutenção - e a desativação do ramal - devastou os trilhos. O mato tomou conta da ferrovia, os dormentes apodreceram e os vagões abandonados estão sendo corroídos pela ferrugem. Na BR-010, no Pará, o cenário é semelhante, com a diferença de que a estrada está em operação. Crateras no acostamento e a má qualidade do pavimento ameaçam a vida dos motoristas que passam por ali - resultado da falta de manutenção da rodovia.
Os dois exemplos são prática comum Brasil afora. Nos últimos anos, o País não só tem investido menos que o necessário para expandir a infraestrutura como não consegue manter os ativos existentes. O resultado é a deterioração de rodovias, ferrovias, pontes, viadutos, sistema de transporte urbano e saneamento básico.
Estudo do economista Claudio Frischtak, presidente da consultoria InterB, mostra que o estoque de tudo que já foi investido em infraestrutura despencou de quase 60% do Produto Interno Bruto (PIB) na década de 80 para 36,3% no ano passado. Na prática, esses números indicam que os ativos estão se deteriorando com o baixo volume de investimentos e vem perdendo valor.
Segundo o trabalho, parte significativa da infraestrutura brasileira tem entre 30 e 40 anos e baixo nível de manutenção, o que se traduz em perdas de eficiência, elevado custo de operação e risco de integridade física. O razoável, diz Frischtak, seria o País alcançar a marca de 60% do PIB em estoque de infraestrutura. Em países com economia mais madura, o percentual varia entre 65% e 85% do PIB.
"Não estamos falando em investir para chegar ao nível de Japão e Finlândia. Estamos falando em investir na cobertura de serviços básicos como água e esgoto", diz o economista.
Pelos dados de Frischtak, entre 2001 e 2017, o Brasil investiu, em média, 0,18% do PIB em saneamento enquanto o ideal seria 0,45% ao ano. Esse hiato de investimento se reflete em números alarmantes: atualmente, 100 milhões de brasileiros não têm acesso a rede de esgoto e 35 milhões não são abastecidos com água potável. "Há uma carência muito grande de investimentos e ainda assim não vemos nada muito significativo sendo feito. É muito preocupante", diz Marina Aidar, advogada do escritório Vieira Resende.
Além de a expansão desses serviços serem lentos, a estrutura atual não recebe manutenção adequada. Pesquisa recente do Instituto Trata Brasil mostra que 38,3% de toda água potável, tratada e pronta para ser distribuída, se perde pelo caminho especialmente por causa de vazamentos e dos chamados "gatos". "Com a falta de investimentos, o sistema envelhece e o volume de vazamento aumenta", afirma o sócio da GO Associados Pedro Scazufca, consultor técnico do estudo.
No setor de transporte, a situação segue o mesmo caminho. Entre 2001 e 2017, segundo Frischtak, o investimento médio foi de 0,67% do PIB por ano enquanto o ideal seria 2%. A pior situação é verificada nas estradas, cuja qualidade vem se deteriorando nos últimos anos por causa dos baixos investimentos. Um levantamento feito pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT), com os 15 piores trechos rodoviários, exemplifica bem essa realidade.
Intitulado "Rodovias Esquecidas do Brasil", o trabalho mostra que, nessas estradas, o investimento médio por quilômetro equivale a R$ 66,5 mil por ano enquanto a média nacional é de R$ 144,3 mil. O pior resultado foi verificado no trecho Marabá-Dom Eliseu, no Pará. Essa ligação obteve a menor parcela dos investimentos, de apenas R$ 32,19 milhões nos 14 anos considerados, entre 2004 e 2017.
"Essas rodovias recebem menos recursos que o mínimo previsto para fazer a manutenção. Por isso, não conseguem ter melhora na sua qualidade", afirma Bruno Batista, diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte (CNT). Segundo ele, um dos principais problemas é que os governos se preocupam mais em construir do que em manter os ativos. "A questão é que o investimento feito no passado está se deteriorando", diz ele. "Pior: a despesa gerada pela infraestrutura ruim já é maior que o investimento feito nas estradas."
Batista se refere ao custo hospitalar e a sobrecarga na Previdência com os acidentes rodoviários. Em 2017, ele afirma, o Brasil investiu R$ 7,9 bilhões nas rodovias federais. O custo com os acidentes foi de R$ 11 bilhões. "Não é uma lógica muito inteligente", diz.

Ferrovia e BRT abandonados são exemplos de dinheiro desperdiçado pelos cofres públicos

O setor de transportes coleciona empreendimentos abandonados. O setor ferroviário, por exemplo, chegou a ter 37 mil quilômetros (km) de trilhos, mas a falta de investimentos fez a malha encolher para 28 mil km. Nesse número, porém, estão trechos desativados, a exemplo das linhas paulistas de Pradópolis/Colômbia; Bauru/Tupã/Panorama; e Santos/Cajati.
Nesses ramais, os trilhos foram invadidos por mato e até pela população, que construiu às margens ou sobre as ferrovias. "Só em São Paulo, são cerca de 800 km de estradas de ferro que foram desativadas, abandonadas e degradadas", diz José Manoel Ferreira Gonçalves, da Frente Nacional pela Volta das Ferrovias.
A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) diz que, mesmo não sendo usada, a malha deve ser mantida pela concessionária em condições de operação. Não é o que se vê, por exemplo, no trecho entre Santos e Cajati, no Vale do Ribeira. Segundo a ANTT, calcula-se que hoje dois terços da malha brasileira tenham tráfego. Ou seja, um terço da ferrovia - que significa 9 mil km - não é usada.
A concessionária Rumo, responsável pela malha paulista, disse que os ramais de Pradópolis/Colômbia e Bauru/Tupã/Panorama fazem parte da concessão assumida em 2015. Ela afirma que os dois trechos estão desativados desde 2006. "Com a prorrogação da concessão da Malha Paulista até 2058, serão viabilizados R$ 7 bilhões em investimentos. O plano prevê reativação dos ramais citados." Já no trecho Santos/Cajati, diz a Rumo, estudos mostraram a inviabilidade do transporte de cargas em larga escala.
Como as ferrovias, outro projeto que foi abandonado e precisa de um novo destino é o BRT Transoeste, na capital fluminense. Inaugurada em 2012 com a presença do então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, a obra custou à prefeitura do Rio cerca de R$ 900 milhões. Hoje, das 125 estações, 22 estão desativadas.
O interventor do BRT, Luiz Alfredo Salomão, contratado para encontrar uma solução para os empreendimentos, diz que houve uma série de problemas na Transoeste. A obra foi construída sem projeto executivo e hoje a pista não aguenta o peso dos ônibus. A calha foi construída com asfalto normal em terreno argiloso e mole. Com o peso dos veículos, o asfalto foi cedendo e tornando inviável o transporte.
"Foi um grande erro de engenharia, uma pista sem salvação", diz Salomão. Além disso, a estrutura não tinha segurança para impedir a entrada de passageiros sem pagar, o que causava prejuízo de R$ 5 milhões por mês aos cofres públicos.