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Transportes

- Publicada em 17 de Maio de 2019 às 03:00

Greve dos caminhoneiros prolongou ciclo de frustração

Paralisação de 11 dias da categoria retirou entre 0,1 e 0,3 pontos percentuais do PIB

Paralisação de 11 dias da categoria retirou entre 0,1 e 0,3 pontos percentuais do PIB


EDILSON RODRIGUES/AGÊNCIA SENADO/JC
A paralisação dos caminhoneiros, que completa um ano neste mês, retirou entre 0,1 e 0,3 ponto percentual do crescimento do Brasil em 2018, quando a economia se expandiu 1,1%. O movimento foi o primeiro de uma série de choques que tem prolongado o ciclo de expectativas frustradas em relação à retomada do País.
A paralisação dos caminhoneiros, que completa um ano neste mês, retirou entre 0,1 e 0,3 ponto percentual do crescimento do Brasil em 2018, quando a economia se expandiu 1,1%. O movimento foi o primeiro de uma série de choques que tem prolongado o ciclo de expectativas frustradas em relação à retomada do País.
Essa é a leitura que os economistas fazem, hoje, do evento que parou o Brasil por 11 dias, derrubando a produção da indústria e a confiança de empresários e consumidores. "Os principais efeitos da greve já se dissiparam, mas ela mostrou como seria difícil para o Brasil sair do fundo do poço", diz Fábio Ramos, economista do UBS.
As sondagens de confiança da FGV (Fundação Getulio Vargas) ilustram bem o diagnóstico dos analistas. A pesquisa converte em índice o que os agentes econômicos percebem em relação ao presente e esperam do futuro. Números acima de 100 denotam otimismo; abaixo indicam pessimismo.
Desde 2014, os resultados da confiança de empresários e consumidores brasileiros apontam um quadro persistente de percepção de conjuntura ruim casada com desânimo em relação ao futuro.
O subíndice de expectativas da confiança empresarial - que consolida as sondagens de diferentes setores econômicos e dos consumidores em relação aos três meses seguintes - rompeu poucas vezes para cima a barreira dos 100 pontos nesse período.
Um desses breves momentos foi antes da paralisação dos caminhoneiros. O outro, mais recente e ligeiramente mais longo, ocorreu entre o fim de 2018 e os primeiros meses deste ano.
"A melhora recente resultou da lua de mel com o governo novo, que, pelo que captamos em algumas pesquisas, se deu mesmo entre eleitores que não votaram no (presidente Jair) Bolsonaro", diz Aloisio Campelo Jr., superintendente de estatísticas públicas do Ibre/FGV.
Segundo ele, após um longo período de crise, houve a percepção de que uma nova administração, eleita com ampla vantagem, conseguiria aprovar medidas positivas para o País.
Um sinal de que o otimismo começava a voltar foi captado por uma pergunta que mede as expectativas de empresários em relação aos seus negócios e das famílias em relação à sua condição financeira em um horizonte mais longo, de seis meses.
Pela primeira vez em mais de quatro anos, esses índices ficaram, a partir de novembro de 2018, por alguns meses consecutivos acima de 100, mas, no mês passado, houve novo recuo para o nível que indica pessimismo.
O temor de especialistas é que a melhoria recente tenha sido mais um soluço positivo temporário e que o quadro de baixa confiança, que desestimula investimentos e consumo, volte a predominar.
Isso ocorreu após o impeachment de Dilma Rousseff (PT), em agosto de 2016. A mudança de governo criou a esperança da aprovação de reformas que fariam o País retomar o crescimento. Mas reveses sofridos pela gestão Michel Temer (MDB) - como o vazamento de conversa comprometedora com Joesley Batista em maio de 2017 - frearam o retorno da confiança.
No Brasil, o foco havia migrado do então paralisado governo Temer para a perspectiva de mudanças positivas após a eleição. Essa sensação de mudança para melhor não durou muito. Antes da eclosão da paralisação dos caminhoneiros, já havia sinais de que o quadro talvez não fosse tão positivo, na esteira de juros em alta nos EUA e aumento de incertezas em relação às eleições domésticas.
Mas analistas, empresários e consumidores não esperavam a eclosão de uma paralisação longa e intensa como a promovida pelos caminhoneiros, que levou à interrupção do transporte, ao fechamento de lojas e de fábricas. "A greve teve um impacto forte, embora pontual", afirma Luka Barbosa, economista do Itaú Unibanco.
 

Com queda de 10,9% na produção, em maio de 2018, indústria foi o setor mais atingido

O efeito mais nocivo da paralisação foi via o canal da indústria, cuja produção despencou 10,9% em maio de 2018. Embora uma parcela considerável dessas perdas tenha sido recuperada nos meses posteriores, um efeito negativo residual se manteve no balanço geral.
O Itaú Unibanco calcula que esse impacto tenha subtraído entre 0,1 e 0,2 ponto percentual do já fraco crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) em 2018. O UBS tem uma estimativa parecida, entre 0,2 e 0,3 ponto percentual.
Os especialistas ressaltam, porém, que a fraqueza persistente da economia já existia. "Se houvesse uma tendência de crescimento mais forte de fato, ela teria sido retomada alguns meses depois da paralisação, e não foi isso que ocorreu", diz Marcelo Gazzano, da consultoria A.C. Pastore & Associados.
O que a greve pode ter criado, segundo Gazzano, é um ponto a mais na lista de riscos que os empresários consideram quando elaboram seus planos de investimentos.
Barbosa menciona que um exemplo dessa maior cautela é o aparente movimento das empresas para aumentar suas frotas próprias. Os caminhoneiros autônomos, por sua vez, parecem estar enfrentando como efeito colateral uma demanda menor.
Segundo especialistas, o que mais tem pesado sobre a recuperação lenta do País é a soma do impacto de diversos choques negativos sobre uma economia com fraquezas estruturais severas como a brasileira.
Além da paralisação dos caminhoneiros, ocorreram a recessão argentina, a incerteza gerada pela polarização antes da eleição, o rompimento da barragem em Brumadinho, em Minas Gerais, e a piora no cenário econômico global. Mais recentemente, foram adicionados à lista os problemas internos do novo governo e as dificuldades políticas.
Para os economistas, o fortalecimento da economia e o aumento de sua imunidade a choques temporários dependem do da agenda de concessões à iniciativa privada, da aprovação da reforma da Previdência e da retomada da política de cortes de juros.