A matriz brasileira de transporte não deverá passar por significativa alteração nos próximos 20 anos mesmo que o governo federal consiga implementar todos os projetos já em andamento - como duplicações de rodovias e subconcessão de ferrovias, como a Norte-Sul - e mantenha o estoque atual em infraestrutura. A constatação é da Fundação Dom Cabral (FDC), no estuo a Plataforma de Infraestrutura em Logística de Transportes (Pilt), construída com base em dados públicos de órgãos governamentais e de empresas parceiras, como Arteris, Grupo CCR e EcoRodovias.
O diagnóstico da FDC mostra ainda que, com o portfólio atual de projetos federais, e se nada mais for proposto, o Brasil continuará dependente das rodovias e com um custo extremamente alto nesse modal até 2035. A instituição estima que o custo total do País com transporte tenha atingido R$ 166 bilhões em 2015 (ano usado como base para os cenários), com 70% desse montante consumido nas rodovias. Em 2035, esse custo subirá para R$ 233,3 bilhões, ao passo que a participação das rodovias nos custos se manterá praticamente igual, em 68%.
Caso os principais projetos federais nos setores de rodovias, portos, hidrovias e ferrovias saiam do papel até 2025 e nada mais seja feito até 2035, o custo logístico dos embarcadores de carga subirá quase R$ 130 bilhões. "E esse custo vai para algum lugar. Ou cai a margem das empresas, ou é repassado ao consumidor final", afirma Paulo Resende, coordenador do Núcleo de Logística, Infraestrutura e Supply Chain da FDC.
Como a crise recente com a greve dos caminhoneiros expôs, o Brasil precisa de investimentos de longo prazo em ferrovias e hidrovias, as mais apropriadas para transportar determinados tipos de cargas por longas distâncias, defende a FDC.
Pelas contas da fundação, se 10% da carga transportada em rodovias (medidas em Toneladas por Quilômetro Útil, TKU) for transferida para as ferrovias, haveria uma economia de custo de 2,4%, equivalente a R$ 4,85 bilhões em 2025 e R$ 5,6 bilhões em 2035. Se as hidrovias assumirem aquele papel, a economia de custo é maior ainda, de 4,5%, correspondendo a R$ 8,92 bilhões em 2025 e R$ 10,3 bilhões em 2035.
Porém a FDC frisa que, no curto prazo, o planejamento público para o setor não pode deixar de lado as rodovias. "A concentração de fluxos de cargas não permite, de forma nenhuma, que o Brasil tome a decisão brusca de, de repente, partir para a ferrovia e a hidrovia e esquecer das rodovias para transporte de longa distância", pontua Resende.
O especialista defende que o poder público tenha uma visão "estratégica, e não passional" sobre o modal rodoviário. "Ao planejarmos o curto prazo, não podemos romper o sistema rodoviário", acrescenta.
Tabelar frete é ir contra 'regra pétrea' da economia, diz FDC
Tabelar o frete rodoviário, como está sendo proposto pelo governo federal, é uma medida que vai contra a regra "pétrea" de oferta e demanda que rege a economia, avalia Paulo Resende, coordenador do Núcleo de Logística, Infraestrutura e Supply Chain da Fundação Dom Cabral (FDC). "Acho que qualquer poder que quiser mediar uma discussão de tabela de frete corre o risco de mediar uma coisa que não dá fruto", disse durante evento da FDC de lançamento da Plataforma de Infraestrutura em Logística de Transportes (Pilt).
Ainda na discussão sobre o frete, o especialista disse enxergar um "vácuo preocupante de intermediação técnica" no País. "A intervenção da instância suprema do Judiciário mediando situações desse tipo nos mostra a grande distorção institucional que o Brasil vive", opina Resende.
Conforme dados da plataforma, os embarcadores de carga deverão ver um aumento de cerca de R$ 130 bilhões de seus custos logísticos até 2035 - cenário que considera a implementação dos principais projetos federais nos setores de rodovias, portos, hidrovias e ferrovias até 2025 e a manutenção do estoque de infraestrutura existente.
Porém Paulo Resende destaca que essa elevação dos custos nos próximos 20 anos não irá, necessariamente, se reverter em alta do frete. "O frete é um preço final, é uma remuneração final. Você tem a formação dos custos e o frete. Entre o frete e a formação dos custos, você tem a margem, seja do autônomo ou das transportadoras."