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JC Contabilidade

- Publicada em 03 de Dezembro de 2019 às 15:14

Simples beneficia empresas não cooperativas

Pessôa é um dos coordenadores da pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas

Pessôa é um dos coordenadores da pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas


/ZANONE FRAISSAT/FOLHAPRESS/JC
O pesquisador Leonel Cesarino Pessôa, um dos coordenadores do estudo "Qualidade dos gastos tributários no Brasil: o Simples Nacional", elaborado pela Escola de Direito de São Paulo e pelo Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas - FGV), diz que o Simples Nacional tem um conceito de micro e pequena empresa não compatível com o de outros países e beneficia companhias com baixa produtividade e pessoas que não fazem parte da parcela mais desfavorecida da sociedade.
O pesquisador Leonel Cesarino Pessôa, um dos coordenadores do estudo "Qualidade dos gastos tributários no Brasil: o Simples Nacional", elaborado pela Escola de Direito de São Paulo e pelo Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas - FGV), diz que o Simples Nacional tem um conceito de micro e pequena empresa não compatível com o de outros países e beneficia companhias com baixa produtividade e pessoas que não fazem parte da parcela mais desfavorecida da sociedade.
Pessôa afirma que o programa tem seus méritos, como poupar as MPEs dos custos gerados pelo complexo sistema tributário nacional. Mas diz que a reforma tributária em discussão na Câmara poderá resolver esse problema, sem a necessidade de que se mantenha um regime tão abrangente. "Em alguma medida o Simples cumpre essa função. Enquanto não vem uma reforma tributária."
O estudo foi elaborado em conjunto com o economista Samuel Pessôa, colunista do jornal Folha de S.Paulo, e dos pesquisadores Daniel Zugman, Alexandre Pinto e Luiz Felipe Ferreira.
No estudo, vocês dizem que o Simples, no formato atual, acaba por beneficiar empresas não competitivas, além de não gerar empregos adicionais que compensem a perda de arrecadação. Vocês defendem o fim do Simples?
Leonel Cesarino Pessôa - Rever o programa, sim. Não é acabar. Outros países também têm tratamento diferenciado para micro e pequenas empresas. O Simples não é avaliado. E o gasto tributário é gigantesco, de R$ 87 bilhões (estimativa para 2019). A gente procurou levantar alguns parâmetros possíveis para que essa avaliação fosse feita, estudos que procurassem ver essa efetividade na geração de emprego, que é o princípio básico da lei que criou o Simples Nacional, e o que a gente traz de mais novo é que analisamos as legislações de outros países. Existe uma discrepância gigantesca entre aquilo que se faz em outros países e o que está sendo feito aqui no Brasil. O teto do faturamento para receber o tratamento diferenciado é pequeno. As empresas mais rudimentares é que se procura beneficiar, e não esse número gigantesco de empresas, como é no Brasil. O que estamos procurando apontar é que hoje o gasto tributário assumiu valores estratosféricos.
As MPEs teriam como sobreviver no Brasil com ajustes nas regras do Simples?
Pessôa - Primeiro tem de ver o que é que você está chamando de micro e pequenas empresas. Se pegarmos as últimas mudanças que foram feitas na lei, médicos, advogados, todo o mundo entrou no Simples. Os médicos contrataram mais funcionários em suas clínicas quando passaram a ter o tratamento tributário diferenciado? Os advogados contrataram mais funcionários em seus escritórios? Ou seja, é um programa que tem de ser reavaliado e tem de ser revisto.
Atualmente, os limites são de R$ 360 mil para micro e R$ 4,8 milhões para empresa de pequeno porte. Isso está muito fora do conceito internacional sobre o que é uma MPE?
Pessôa - É um conceito de micro e pequena empresa completamente distorcido. Internacionalmente, quando se fala em limite amplo de faturamento, é de até US$ 100 mil por ano (R$ 420 mil). Microempresa, em geral, é US$ 20 mil (cerca de R$ 80 mil). Aqui estamos acima de US$ 1 milhão (ao câmbio de R$ 4,20). Um teto em torno de US$ 20 mil equivale ao MEI aqui no Brasil (Microempreendedor Individual, limite de R$ 81 mil/ano). O que se usa em outros países como limite para ser tratado de maneira diferenciada é o que a gente usa aqui para dar o tratamento de MEI a uma pessoa jurídica.
Qual a sua avaliação sobre o MEI? Ele padece dos mesmos problemas que o Simples?
Pessôa - Há um estudo feito por três pesquisadores do Ibre que também aponta problemas no MEI. Boa parte dos novos empregos que estariam sendo criados são pessoas que já tinham vínculo empregatício e que saem das empresas para serem contratas pelo mesmo empregador. O MEI também precisa ser reavaliado. Boa parte dessa formalização não está acontecendo.
Vocês citam no estudo casos de pessoas que também deixam de ser contratadas como pessoa física para se tornarem prestadores de serviço como empresa do Simples.
Pessôa - Toda a organização do nosso sistema tributário, do qual o Simples é uma parte, acaba contribuindo para essa "pejotização".
Então o Simples não tem contribuído para aumentar a produtividade do país, formalizar empresas e gerar empregos?
Pessôa - Nós fizemos uma referência ao estudo da [pesquisadora do Ibre/FGV] Joana Monteiro, que se debruçou sobre o Simples Federal [na década de 1990]. Ela disse que os ganhos esperados de arrecadação não se verificaram em todos os setores, mas apenas no comércio varejista. Mesmo assim, o que se ganha com aquelas empresas que estavam na informalidade e passaram para a formalidade é inferior à perda com aquelas empresas que já estavam na formalidade e, com o programa, passaram a pagar menos impostos. Houve uma perda líquida. Naquilo que a gente tem de estudo empírico de avaliação, o programa não mostra o resultado que se esperava. Então, ele precisa ser repensado, revisto, reavaliado.
Vocês citam um estudo que afirma que o efeito é positivo somente em algumas MPEs e em determinados setores.
Pessôa - A literatura internacional indica isso, e a gente vê empiricamente. Busca-se associar a geração de emprego ao fato de a empresa ser pequena. Não são todas as micro e pequenas empresas que geram mais empregos. Isso se dá nas mais novas e em alguns setores, como de tecnologia. Manter esse programa, concedendo benefício indiscriminadamente de tributação diferenciada, acaba fazendo com que empresas não produtivas acabem sobrevivendo por muito mais tempo do que deveriam. E isso à custa da produtividade do país. O país está perdendo produtividade com isso. Desde 1996, o Congresso foi ampliando o alcance do programa. Os advogados lutam pelos advogados. Os contadores lutam pelos contadores. O interesse público mesmo não está presente. 
O estudo cita um efeito positivo do programa, que é o alívio nos custos com o complexo sistema tributário nacional.
Pessôa - A legislação do Simples tem um lado positivo. Dada a complexidade do nosso sistema tributário, ela acabou funcionando quase como um mal necessário, porque reduziu os custos de conformidade. Esse é um argumento com o qual a literatura toda concorda. As micro e pequenas empresas são as mais prejudicadas por esse custo e, no Brasil, isso é especialmente relevante, devido ao nosso sistema tributário caótico. Em alguma medida o Simples cumpre essa função. Enquanto não vem uma reforma tributária, ele cumpre essa função.
A proposta de reforma tributária da Câmara permite que as empresas escolham entre continuar no Simples e mudar para um novo sistema de tributação com aproveitamento de créditos. Essa pode ser uma saída para reduzir as distorções?
Pessôa - A reforma tributária vem em boa hora e para solucionar uma parte dos problemas que se tentou resolver com o Simples, que é a simplificação do sistema. Aquelas empresas que estão no meio da cadeia produtiva vão precisar do crédito tributário, e, para elas, vai ser mais vantajoso sair do Simples para aderir ao novo sistema. Para as empresas que vendem para o consumidor final, talvez não seja vantajoso sair do Simples.
Indo além do Simples, é recorrente no Brasil não ter uma avaliação desses gastos tributários?
Pessôa - Exatamente. Estamos falando de valores monstruosos. São cerca de R$ 300 bilhões de gastos tributários neste ano. No Simples, são raríssimos os estudos. Quem está se beneficiando não são os setores mais desfavorecidos da sociedade. Quem recebe Bolsa Família não está ganhando nada com o Simples, não ganha nada com isenção de Imposto de Renda para saúde e educação. O Brasil não tem uma tradição de avaliar políticas públicas.
Agência Folhapress
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