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Reportagem especial

- Publicada em 01 de Agosto de 2021 às 14:00

Com selo, chocolate artesanal de Gramado deve abrir mais mercados

Produção começou em 1975 e, hoje, cidade tem 28 empresas fabricando chocolates artesanais

Produção começou em 1975 e, hoje, cidade tem 28 empresas fabricando chocolates artesanais


LEONID STRELIAEV/DIVULGAÇÃO/JC
Transitando pela avenida Borges de Medeiros, no Centro de Gramado, é possível visualizar dezenas de comércios, pontilhados aqui e ali por turistas que entram e saem dos locais com sacolas, caixas e embrulhos diversos. Uma das principais vias do município de 36,5 mil habitantes traz, em algumas das fachadas de seus estabelecimentos, aquele que é considerado um dos símbolos, e um dos principais orgulhos de sua história. O chocolate artesanal é parte intrínseca da cidade serrana e, como tal, o produto é exibido e comercializado de tantas formas, gostos e variedades quanto é possível imaginar.
Transitando pela avenida Borges de Medeiros, no Centro de Gramado, é possível visualizar dezenas de comércios, pontilhados aqui e ali por turistas que entram e saem dos locais com sacolas, caixas e embrulhos diversos. Uma das principais vias do município de 36,5 mil habitantes traz, em algumas das fachadas de seus estabelecimentos, aquele que é considerado um dos símbolos, e um dos principais orgulhos de sua história. O chocolate artesanal é parte intrínseca da cidade serrana e, como tal, o produto é exibido e comercializado de tantas formas, gostos e variedades quanto é possível imaginar.
Há 28 indústrias de chocolate em Gramado, que faturaram, no ano passado, R$ 45,6 milhões. Em 2021, até o momento, a receita total é de pouco mais de R$ 32 milhões. "O vínculo entre o destino Gramado e o produto chocolate artesanal é amplamente reconhecido nacional e internacionalmente", ressalta a prefeitura, em nota. A produção anual de chocolate no município gira em torno de 1,2 milhão de quilos, e a Administração reconhece que o doce é o principal souvenir disponibilizado aos turistas.
Gramado é o segundo destino turístico mais visitado do Brasil, costumando receber mais de seis milhões de turistas anualmente, conforme dados da prefeitura. Consta ainda como um dos 21 destinos-tendência para 2021, em lista elaborada pelo Ministério do Turismo. Recentemente, foi oficialmente reconhecida como a Capital Nacional do Chocolate Artesanal. O projeto de lei foi criado em 2019 pelo deputado federal gaúcho Jerônimo Goergen (PP) e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro em 2020.
"A fama do chocolate artesanal de Gramado já cruzou as fronteiras do Rio Grande do Sul e hoje está presente no mundo todo. O título reforça a vocação do município e pode impulsionar ainda mais a indústria do chocolate", diz o parlamentar.
Em meio a este processo, um outro foi também desenvolvido junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), de forma a diferenciar o chocolate artesanal feito no município frente aos demais: a Indicação Geográfica (IG), espécie Indicação de Procedência, cujo pedido foi encaminhado ao órgão em julho de 2018 e cuja análise levou quase três anos. Neste período, foram feitas seis exigências de esclarecimentos. Em 15 de junho deste ano, o Inpi sacramentou a IP para o chocolate artesanal oriundo de Gramado.

Como deve ser o chocolate artesanal de Gramado?

O projeto da Indicação Geográfica da Achoco prevê um mínimo de 35% para o chocolate ao leite, por exemplo, e a proibição do cacau em pó, soro de leite em pó e gordura vegetal, mesmo a hidrogenada. No caso do chocolate branco, o mínimo é 25%. No meio amargo, de 42% a 55%, e no amargo, acima de 55%. Quanto aos produtos, as barras devem ter um mínimo de 95% de chocolate e 5% de corantes, aromas e especiarias. Há ainda regras específicas para trufas, drágeas, bombons e outros tipos.

Quem pode usar a Indicação Geográfica?

Igor Martins, do Inpi, explica: "Os produtores de chocolate artesanal estabelecidos naquele local, que é Gramado, têm de cumprir as regras que eles mesmos estabeleceram no caderno de especificações técnicas, e devem se submeter a um controle previsto também neste 'manual'. Este caderno vai dizer quem vai ou não controlar, se vai haver uma empresa contratada, controle misto, e tudo o que podem fazer está naquele documento". Augusto, da Achoco, afirma que o novo Conselho Regulador da entidade, estruturado após a concessão da IG, está buscando empresas ou instituições externas certificadas que irão auditar os métodos de produção e ingredientes, a fim de garantir a procedência.

Registro é inédito para chocolates produzidos no País

Fabricação deve ocorrer dentro dos limites da cidade da serra gaúcha

Fabricação deve ocorrer dentro dos limites da cidade da serra gaúcha


felipe faleiro/divulgação/jc
Como o registro é inédito para o produto no Brasil, é um diferencial de peso aos produtores, mas, especialmente, uma barreira legal contra o uso indevido do nome do município em gêneros alimentícios do tipo. As vantagens são muitas. "Há um sistema de rastreio e estabilidade do processo produtivo; o consumidor tem a certeza da origem do produto e garantia da qualidade e da dosagem de seus ingredientes; o território Gramado tem a imagem de exclusividade na produção desse tipo de chocolate", lista a prefeitura.
A visão, neste caso, é a de que o chocolate de Gramado tem uma qualidade ímpar que merece ser protegida. O processo da realização do pedido junto ao Inpi foi aberto pela Associação da Indústria e Comércio de Chocolates de Gramado (Achoco), entidade representativa do setor, a partir de uma tomada de preços feita pela Prefeitura em 2015.
Antes da elaboração da parte documental, a Achoco já fazia reuniões técnicas com as empresas associadas pelo menos duas vezes por semana para definição dos critérios que constariam no regulamento. Quem afirma é o presidente da entidade e CEO da Chocolate Lugano, Augusto Schwengel Luz.
Para que ele funcione na prática, algumas das indústrias já adequaram suas produções, entre elas, as que participaram da elaboração do regulamento, e outras já podem ter condições de realizar as adaptações. Conforme o documento, há algumas características mais óbvias para requerer a IG, como a produção obrigatoriamente ser feita dentro dos limites territoriais de Gramado, e outras menos, a exemplo do percentual mínimo de cacau ser maior do que o exigido pela legislação brasileira. Outra exigência da Indicação Geográfica de Gramado, e que inclusive é o primeiro passo para exibi-la, é ser associado da Achoco, órgão tutor do selo. "Não basta ser nascido em Gramado", explica Augusto.

Empresas e entidades celebram a Indicação Geográfica

Novidade pode ajudar a aumentar receita dos fabricantes

Novidade pode ajudar a aumentar receita dos fabricantes


felipe faleiro/divulgação/jc
Empresários do setor, de modo geral, celebraram a concessão da Indicação Geográfica. "As marcas 'Gramado' e agora a 'chocolate Gramado' fortalecem ainda mais o desenvolvimento turístico de nossa região, em especial o segmento que empreendemos", disse a Florybal Chocolates, em nota. Mesma visão tem Nicole Ferrari, uma das sócias da Chocolate GramadoWay, empresa de perfil familiar. No entanto, há quem se manifeste sobre o assunto com certa cautela. "A ideia e a iniciativa são muito boas. Mas tem de haver uma fiscalização atuante para que esses pré-requisitos sejam realmente cumpridos", pontua Maurício Brock, sócio-diretor da Prawer, a primeira fábrica de chocolates artesanais de Gramado e do Brasil.
Os turistas são a principal fonte de renda de Gramado, representando quase 90% do PIB municipal, conforme a prefeitura. E muitos deles aproveitam as delícias que apenas o chocolate proporciona, de maneira que as lojas comemoram o bom movimento, e acreditam que o avanço da vacinação deve representar novas oportunidades nas vendas. Ainda segundo a administração municipal, alguns chocolateiros relataram que fecharam 2020 com queda média na produção de até 45%. O início de 2021 teve igualmente baixa, contudo, a partir de maio, houve uma tímida recuperação. O resultado foi uma nova alta no faturamento. "Se seguirem nessa tendência, poderão faturar mais que em 2019", diz a nota da prefeitura.
O secretário-executivo do CDL Gramado, Rudimar Freitag, observa que as empresas de chocolate sofreram reveses, como todos os outros setores, com o fechamento dos estabelecimentos como tentativa de conter a pandemia durante o sistema de bandeiras do distanciamento controlado. "Após o fim do sistema, Gramado pôde se movimentar positivamente, retomando a visitação de turistas e, consequentemente o mercado começou a contratar mais colaboradores", comenta ele.
Brock, da Prawer, conta que, com as vendas e o faturamento caindo de forma "vertiginosa", como afirma, a estratégia foi pulverizar mercados, já que, antes da Covid-19, 80% dos produtos feitos pela fábrica eram comercializados no próprio município.
"Foi desenvolvida uma estratégia com objetivos bem definidos, a criação de uma linha de produtos específica para este fim e a busca de parceiros comerciais que tivessem um público afim com o da Prawer", diz ele. A estratégia funcionou. Na última Páscoa, apenas 30% da linha própria para a data foi vendida em Gramado e os outros 70%, para cidades de outras regiões do Brasil, por meio de lojas multimarcas ou no e-commerce da marca.

Histórico é de superação e empreendedorismo entre as empresas

Fundada por Jaimer Prawer em 1975, Prawer foi a marca pioneira em chocolate artesanal

Fundada por Jaimer Prawer em 1975, Prawer foi a marca pioneira em chocolate artesanal


felipe faleiro/divulgação/jc
A família Prawer veio de Lódz, grande centro têxtil na Polônia. Chegou ao Rio Grande do Sul em 1925 e se estabeleceu no bairro Bom Fim, em Porto Alegre, em uma época em que a imigração judaica a partir da Europa foi particularmente forte. Entre os que se estabeleceram no Estado estavam Jacob Prawer e sua esposa, Ana.
Jayme Prawer, filho de ambos, nasceu na Capital em 26 de maio de 1926. Em 1928, as viagens à Serra se tornaram mais frequentes, já que o negócio do pai evoluiu bem. Jayme cresceu na nova casa construída por seus pais em Porto Alegre. Em 1936, Jacob já havia trocado a fotografia pela representação comercial, e Jayme passou a refazer o caminho do pai à Serra. Gramado começava a se desenvolver, graças aos portugueses, depois alemães e italianos.
No verão daquele ano, a primeira viagem de Jayme foi para visitar a tia Ofélia, irmã de seu pai, que já vivia em Gramado. A viagem entre a Capital e a Serra durava seis horas. Por lá, em 1972, fundou o Café Colonial Boa Vista, o primeiro do município, com especialidades das culinárias alemã e italiana.
Observando a força crescente do turismo, Jayme seguiu com sua veia empreendedora. No ano de 1975, viajou a Bariloche, na Argentina, junto com a esposa, Maria Cardoso Prawer, e lá conheceu o chocolate caseiro. No fim do mesmo ano, a Prawer começou a fabricação de barras e ramas, em uma fábrica de 70 m², e mais três artesãos. A primeira loja foi aberta apenas no ano seguinte, coincidindo com o Festival de Cinema de Gramado, o que ajudou a atrair a atenção de jornalistas de todo o Brasil.
Outro nome fundamental na história do chocolate artesanal de Gramado é o de Altanísio Ferreira de Lima, que começou a trabalhar com Jayme, como primeiro gerente de produção da Prawer, ainda em 1976. Em 1982, se desligou da pioneira e fundou sua própria fábrica, a Gramadense. Altanísio foi presidente da Achoco por três mandatos, e em um destes, foi responsável por iniciar o projeto de um selo de qualidade, que culminou de alguma forma na Indicação Geográfica concedida pelo Inpi e pela qualificação criada pela prefeitura. "Ele sempre trabalhou muito pelo setor e prezou muito pela família", afirma um dos filhos de Altanísio, e atual sócio-diretor da Gramadense, Ezequiel Dias de Lima.

Os diferenciais de algumas das fábricas

Parque Terra Mágica Florybal: empresa foi fundada em 1991 e tem hoje 17 filiais entre Gramado e Canela

Parque Terra Mágica Florybal: empresa foi fundada em 1991 e tem hoje 17 filiais entre Gramado e Canela


MONICA REIS/DIVULGAÇÃO/jc
A Lugano foi fundada logo depois da Prawer, em setembro de 1976, por Lauri Casagrande. A marca mantém o Mundo de Chocolate, aberto em 2015, e que funciona todos os dias. Ali, há réplicas, feitas com o doce, de alguns dos principais monumentos históricos do planeta. Entre eles, a Estátua da Liberdade, a Torre de Pisa, o Monte Rushmore, a Grande Esfinge de Gizé, além de um local com animais feitos de chocolate. Criadas pelos chefs chocolatiers Abner Ivan e Fernando de Oliveira, todas estão em espaços temáticos onde é possível ao visitante viajar na história e sentir o aroma único do doce.
A representação de chocolate da Torre Eiffel, por exemplo, é a maior do mundo, medindo 4,22 metros e pesando 800 quilos, e produzida com mais de 1,5 mil parafusos do mesmo. Dados da empresa afirmam que a representação do Buda da Riqueza no local levou 60 horas para ser produzida; o Cristo Redentor, 45 horas; e um castelo, 230 horas. A construção tem quatro metros de altura, cinco metros de comprimento e leva mais de quatro toneladas de chocolate amargo, o mesmo que 160 mil barrinhas. A maior de todas as peças do parque é a simulação da Muralha da China, feita com seis toneladas de chocolate 70%, e avaliada em R$ 700 mil.
A Florybal foi fundada em 1991, por Valdir e Janete Cardoso. Atualmente, a empresa tem 17 filiais entre Gramado e Canela, e comercializa em torno de 700 produtos. O grande destaque da marca é o Parque Terra Mágica Florybal, em Canela, inaugurado em dezembro de 2011, e que tem cerca de 70 mil m². O local, aberto diariamente, tem, entre seus atrativos, a Floresta Encantada, o Castelo Mágico, o Parquinho Up!, Território dos Dinossauros, trilha, aerobike, além da cascata e mini-fábrica de chocolate, assim como uma loja própria da marca. Recentemente, o local foi eleito pelo TripAdvisor o melhor parque temático do RS e o 8º melhor do Brasil. A gerente da loja localizada dentro do parque, Dhienifer Oppitz, 30 anos, disse estimar que haja 200 funcionários envolvidos no complexo.
O casal Nicole Ferrari, 33 anos, e Juliano Ausgten, 43, é sócio da GramadoWay, que tem duas lojas na Av. Borges de Medeiros, além da fábrica. São, ao todo, 17 funcionários fixos e mais alguns temporários, contratados por temporada. A marca foi fundada há 12 anos, e a primeira loja foi inaugurada há oito. Três anos atrás, a GramadoWay inaugurou um novo espaço, com temática dos personagens João e Maria, mais a presença de uma "bruxinha", interpretada pela publicitária Krishna Grandi, 25 anos, que aprendeu a arte da atuação depois de ser contratada.
"Gramado conta com diversas fábricas de chocolate e acredito que nosso diferencial seja manter a qualidade e o valor diferenciado. Somos o único chocolate que tem a parceria oficial com a dupla Gre-Nal", afirma Nicole. Este é o segundo ano de licenciamento entre as marcas e os clubes da Capital. Quatro produtos são licenciados e têm os selos oficiais. "O que mais vende é o ovo de chocolate, na época da Páscoa", diz ela. A loja temática conta inclusive com um "caldeirão" e uma espécie de gaiola de madeira, onde os turistas podem entrar e tirar fotografias, simulando como se tivessem sido "capturados" pela personagem. Como menção honrosa, é possível citar ainda as fábricas e lojas da Caracol e Planalto.

Chocofest: um evento mágico para os adoradores de chocolate

No auge, Chocofest chegou a levar 400 mil turistas a Gramado

No auge, Chocofest chegou a levar 400 mil turistas a Gramado


RAFAEL CAVALLI/DIVULGAÇÃO/JC
Em uma cabana cor-de-rosa, no início de uma lomba de calçamentos no bairro Santa Terezinha, em Canela, cidade vizinha a Gramado, Nanci Vaccari de Medeiros, 64 anos, aguardava a reportagem em um sábado. A residência é similar a uma casa de bonecas, e emula bem o espírito livre e inquieto da artista plástica, responsável por todas as decorações da antiga Chocofest - oficialmente, Festival Nacional do Chocolate, Doces e Balas -, evento de referência no País no cenário do chocolate. Quem adentra a casa se depara com coelhos gigantes, entre outros itens, todos criações dela.
"Sou uma pessoa apaixonada em construir e transformar coisas, uma pioneira em reciclados e customizações. Até diria uma rainha da sucata!", brinca ela. No início, Nanci era responsável pela área de treinamento de uma multinacional francesa de confecção, que produzia as peças da Lacoste. Depois, passou a criar itens para o carnaval de rua de Canela (diz ela, o melhor da Serra Gaúcha), e conta que chegou ao Chocofest por meio do também artista Paulo Cardoso. Ele foi o idealizador, e Nanci a executora, do boneco Chocolito, um gnomo, para o lançamento do primeiro evento, em meio ao Congresso da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav). Era o começo da década de 1990.
Atualmente, Nanci segue na produção de figurinos para a empresa Florybal, de Gramado, e também dos bonecos vestíveis. "A Chocofest, em especial, é um evento que considero como um filho meu. Foi onde recebi o maior crédito de pessoas que admiro", afirma ela, que aguarda o final da pandemia para inaugurar, e consequentemente abrir as portas ao público, de seu novo atelier, ao lado de sua casa.
A Chocofest sempre foi sucesso por onde passou: dados do Sindicato da Hotelaria, Restaurantes, Bares, Parques, Museus e Similares da Região das Hortênsias (SindTur) apontam que a ocupação da rede hoteleira no período do evento - geralmente, três finais de semana - nunca foi inferior a 80%, e chegou a 100% na edição de 2014. "A Chocofest foi uma grande feira e festa do chocolate em um primeiro momento, depois ele se transformou em um evento de chocolate, balas, doces e afins. A ideia desde o início era um reposicionamento da origem do produto que nascera em Gramado", explica Marta Rossi, da Rossi e Zorzanello.
Cada Chocofest gerava, segundo dados da Rossi e Zorzanello, de 600 a mil empregos, e a visitação variava: na 2ª edição, em 1995, foram cerca de 40 mil visitantes, em 2013 e 2014 chegou a 400 mil, e em 2018 e 2019, 150 mil pessoas passaram pelo evento.
Foram vários os motivos para a criação da Chocofest. O primeiro deles foi a intenção de reduzir as lacunas de eventos em determinados períodos do ano. O Natal Luz, por exemplo, já era tradicional no município e atraía milhares de turistas anualmente, mas antes de sua criação, em 1986, novembro e dezembro eram períodos de pouco movimento, segundo Marta. O Festival de Cinema de Gramado também ajudava a criar uma aura de requinte à cidade. "Desde a primeira edição, grandes personalidades estiveram presentes na Chocofest. Artistas famosos e autoridades estiveram conosco. Foi um evento que estourou imediatamente a nível nacional", diz Marta.
O evento se mudou para Nova Petrópolis, município vizinho, em 2018 e novamente em 2019, passando a integrar a festa Magia da Páscoa, e não aconteceu nos dois anos seguintes em razão da pandemia.

Futuro do chocolate passa por ensino e sustentabilidade

Ricardo Campos, da Miroh! Chocolate Makers, trabalha com cacau 100% produzido em fazendas sustentáveis

Ricardo Campos, da Miroh! Chocolate Makers, trabalha com cacau 100% produzido em fazendas sustentáveis


felipe faleiro/divulgação/jc
Em Canela, fica a Castelli Escola de Chocolataria, a primeira do País a lançar um Programa de Formação Profissional em Chocolataria. Iniciativa da Castelli Escola Superior em Hotelaria, ela foi lançada em 2012, no Salon du Chocolat, em Paris, e hoje oferece ensino na modalidade híbrida. "Nossa sede está em Canela, mas somos Brasil. Nossos alunos e professores vêm de todos os estados brasileiros. As nossas práticas presenciais são realizadas nos laboratórios, e ainda realizamos visitas técnicas em indústrias de Gramado e a fazendas de cacau na Bahia e Pará", conta Silvana Castelli, diretora e fundadora do empreendimento.
O local oferece cursos de chocolate maker, com 88 horas de formação - o profissional é responsável por todos os processos, da amêndoa de cacau até a barra, também conhecido como sistema bean to bar; chocolatier, com 220 horas - criador de chocolates a partir de uma massa de cacau já produzida; ou profissional da chocolataria, com 366 horas - pode atuar como consultor ou professor, ou em fábricas do produto, na área da produção ou gestão. "Canela e Gramado são cidades-irmãs, vizinhas que se complementam. O fato de Gramado ter a Indicação Geográfica reconhecida, sem dúvida, posiciona nossa escola", comenta. A Castelli tem mais de 20 professores e já formou mais de 400 alunos.
Uma delas foi Raquel Rodrigues Cemin, 31 anos, proprietária do Hostel Chocolatchê, no centro de Gramado, aberto em julho de 2016. Nascida em Maringá (PR) e criada em Londrina, ela veio ao RS e inaugurou o local antes mesmo de iniciar o curso. "Fazia um tempo que eu trocava e-mails com a Castelli, mas minha carga horária não era compatível com a do banco onde trabalhava. Quando aconteceu de me mudar e começar o negócio, retomei o contato com eles. Após dois ou três anos, consegui alinhar tempo e dinheiro e começar a estudar lá", diz Raquel, que trabalha no hostel com o esposo, Laison Cemin, 33, e mais três funcionários fixos - ela fez a formação em chocolataria entre julho de 2019 e março do ano passado.
Algumas iniciativas mais recentes se propõem a pensar o futuro da atividade chocolateira, e ela tende a seguir um caminho mais voltado à sustentabilidade. Um exemplo é o trabalho feito pela MirOh! Chocolate Makers, que já tem uma loja pronta e abriu, no final de julho, um ateliê próprio em frente ao Lago Negro, no bairro Planalto. O negócio foi idealizado pelo chef chocolatier Ricardo Campos. A empresa também trabalha com o cacau 100% produzido de fazendas sustentáveis nos estados da Bahia e Espírito Santo, além de cinco países: Índia, Filipinas, Madagascar, Nicarágua e Venezuela. "Eu conheço de onde vem o cacau na fazenda, se o trabalho é legal lá, e as famílias são remuneradas melhor por mim. Então, se lá há uma fermentação melhor, traz um resultado melhor também", diz ele.
Esta é a essência do bean to bar, sistema também ensinado na Castelli, de Canela. "O açúcar que utilizo é orgânico, então há esta preocupação em ter um produto de qualidade em sabor, mas também sustentável." Por onde se olha, todos os lados do mais novo empreendimento de Gramado voltado ao doce inspiram o cliente a se apaixonar por ele. A cozinha, em um fundo do ateliê, já funciona a pleno vapor, produzindo a delícia que mais tarde será apreciada pelos clientes. Não falta sofisticação ao local, que tem uma vista única a um dos principais pontos turísticos do município e do Rio Grande do Sul. O local tem 320 m² de área, mais o deck de frente para o lago.
O próprio prédio do estabelecimento ficou fechado por dez anos, antes de Ricardo construir ali. O planejamento do espaço levou cerca de um ano, e os maquinários vieram todos da Itália, de acordo com ele. Já há uma adega climatizada, onde as sacas de cacau ficam armazenadas. Além dos locais de convivência, o Ateliê MirOh! conta também com uma sala de vidro, no meio do espaço, que vai funcionar como uma espécie de sala de aula a quem quiser aprender mais com o mestre Ricardo. O profissional morou por dois anos na Catalunha, é formado em Gastronomia na CETT (Escola de Turismo, Hotelaria e Gastronomia da Universidade de Barcelona), e trouxe de lá o nome do empreendimento, inspirado no pintor surrealista Joan Miró.
O mercado do chocolate em Gramado é complexo, e traz muitas particularidades. Mas, além de tudo isto, há o desafio de também pensar em eventuais soluções logísticas para o produto permanecer sustentável. "Minha dúvida com relação ao chocolate de Gramado é em relação à viabilidade das franquias e da competitividade do produto. A massa de cacau com a qual é feito o chocolate artesanal vem do centro do País, se transforma em chocolate aqui e retorna para lá. É um custo logístico muito grande se comparado com uma Kopenhagen ou uma Cacau Show, que têm fábricas no centro do País", observa o jornalista gramadense Miron Neto.
 

A força dos turistas vindos de todas as partes

A reportagem conversou com turistas, cuja presença nas belas paisagens de Gramado é bem comum na estação mais fria do ano. O casal Cirio Cypriano e Thaysa Cipriano, 33 anos, ambos empresários e moradores de Itajaí (SC), passou por Gramado com as três filhas, Helena, Clara e Alice. Visitaram a loja-conceito da Prawer e aproveitaram para conferir as delícias. "Sempre costumamos vir, mas faz uns dois ou três anos que não vínhamos. Acho que a cidade está mais bonita do que da última vez. Há novos restaurantes e lojas, o Skyglass [em Canela], ficou muito legal", disse Cirio.
Já o vendedor Luciano Zuchetto, 26 anos, e Helen Cristina Gonçalves, 30, vieram de Sorriso (MT), com o filho João Miguel, 1 ano, e estavam visitando o Mundo de Chocolate, empreendimento da Lugano. Foi a primeira vez da família em Gramado. "Achamos muito lindo. A arquitetura chama muito a atenção. Parece outro país dentro do Brasil", comentou Luciano. Eles haviam chegado ao município três dias antes, e iriam embora no dia em que a reportagem os encontrou.
Na loja da GramadoWay, estava o gerente de Patrimônio Cultural do governo de Mato Grosso do Sul, Caciano Lima, 40 anos. Ele afirmou que estava no município pela terceira vez. "É impossível vir à cidade e não passar pelas lojas de chocolate, além de levar as delícias daqui. Gramado deixa nas pessoas uma memória afetiva e uma sensibilidade únicos, reconhecidos no mundo inteiro. Quando as pessoas sabem que vou a Gramado, logo encomendam coisas", disse ele, que estava hospedado em um hotel da Borges de Medeiros. Foi uma visita rápida, de apenas dois dias. E uma curiosidade: foi também o próprio Caciano quem abordou este repórter e pediu um registro fotográfico, pois queria publicar em suas redes sociais.

*Felipe Faleiro é jornalista formado pela Universidade Feevale, de Novo Hamburgo. Nascido e criado no Vale do Sinos, trabalha desde 2016 como repórter em veículos da região.