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Conjuntura Internacional

- Publicada em 13 de Maio de 2018 às 21:32

Crise argentina pode reduzir exportações

Compradores argentinos são responsável por 76% dos embarques de carros brasileiros, informa Anfavea

Compradores argentinos são responsável por 76% dos embarques de carros brasileiros, informa Anfavea


/ANTONIO SCORZA/AFP/JC
A crise cambial na Argentina pode levar à redução das exportações brasileiras de carros e peças para o país vizinho, segundo avaliação de especialistas. Atualmente, a participação da Argentina nas exportações brasileiras é de cerca de 8% e a maior parte é do setor de veículos. De janeiro a abril, as exportações totalizaram US$ 74,299 bilhões. Desse total, US$ 6,060 bilhões são referentes à Argentina. Dos produtos exportados para a Argentina, cerca de 33% são automóveis.
A crise cambial na Argentina pode levar à redução das exportações brasileiras de carros e peças para o país vizinho, segundo avaliação de especialistas. Atualmente, a participação da Argentina nas exportações brasileiras é de cerca de 8% e a maior parte é do setor de veículos. De janeiro a abril, as exportações totalizaram US$ 74,299 bilhões. Desse total, US$ 6,060 bilhões são referentes à Argentina. Dos produtos exportados para a Argentina, cerca de 33% são automóveis.
A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) informou que ainda não tem uma previsão de quanto podem cair as exportações com a crise. A associação disse apenas que 76% das exportações do setor vão para a Argentina, seguido do México (7%), Chile (5%), Uruguai (4%), Colômbia 3% e Peru (2%).
O ex-secretário de Comércio Exterior Welber Barral lembra que a Argentina é o principal importador de produtos manufaturados no Brasil. "Os principais produtos são automóveis e peças de carro. Evidentemente, uma crise na Argentina afeta esses setores", disse. Para Barral, se a Argentina conseguir o empréstimo no FMI, o nível de especulação cambial diminuirá, o que fará com que o país não diminua muito as importações.
Entretanto, Barral disse que o efeito da crise argentina no Brasil deve ficar restrito a esse segmento, sem contagiar toda a economia brasileira. "O Brasil tem reservas internacionais altas, inflação relativamente sob controle. Então, o Brasil não está na mesma situação da Argentina. Mas em termos de exportações, sim. O Brasil pode ser afetado pela queda das exportações", disse.
Segundo Barral, a competitividade do setor automotivo brasileiro é maior na Argentina por conta do Mercado Comum do Sul (Mercosul). "Os produtos brasileiros não pagam imposto de importação na Argentina", explicou. Além disso, ele disse que o mercado argentino é maior do que de outros países. "Enquanto na Argentina tem um mercado de 42 milhões de pessoas, no Uruguai, por exemplo, são 3 milhões", disse.
A pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV) Lia Baker Valls Pereira também avalia que o efeito da crise argentina no Brasil se restringirá à balança comercial. "No Brasil, a exportação não é o principal elemento do PIB (Produto Interno Bruto, soma de todos os bens e serviços produzidos no país). A Argentina é a terceira importadora do Brasil. É muito localizado, afetaria mais a exportação de automóvel", avaliou a pesquisadora.
"O empréstimo do FMI vem cheio de restrições. A Argentina tem um problema de déficit fiscal, déficit externo, tem inflação alta. A Argentina vai se comprometer a um controle inflacionário e fiscal mais austero", disse. Lia acrescentou que o presidente argentino Mauricio Macri optou por fazer um ajuste gradual na economia, mas não conseguiu.
No último dia 8, o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, afirmou não há possibilidade de "contágio" da crise argentina no Brasil. "Nós temos uma situação externa extremamente confortável, um déficit em conta-corrente pequeno, que é financiado por investimentos diretos estrangeiros. Temos reservas extremamente elevadas, de US$ 383 bilhões. Não vejo nenhum impacto. A situação (do Brasil) é completamente diferente da Argentina", disse.

População vê medidas implementadas pelo governo com muita desconfiança

Antes de recorrer ao FMI, o governo Macri tentou segurar a cotação da moeda vendendo reservas internacionais - já foram US$ 8 bilhões nas últimas semanas, tendo sobrado US$ 54,4 bilhões -, elevando a taxa básica de juros três vezes em oito dias, chegando a 40% ao ano, e reduzindo a meta do déficit fiscal de 3,2% para 2,7% do Produto Interno Bruto (PIB). O mercado, porém, continua bastante volátil.
Graciela Cingolani afirma achar difícil que Macri consiga convencer os investidores a deixarem seu dinheiro no país, já que membros do próprio governo mantêm recursos fora. Segundo dados da Receita argentina, do patrimônio total do alto escalão do governo, 43% estão no exterior. "Que segurança tem um país onde os ministros mantêm seu dinheiro fora?", questiona a aposentada. Ela e o marido também estão entre a grande parte dos argentinos que não acredita no sistema bancário nem na moeda do país: a poupança do casal é em dólares, escondida dentro de casa. "Depois de 2001, não confiamos em banco."
Apesar de não terem vivido a última grande crise argentina, jovens também veem com desconfiança o pedido de ajuda ao FMI. Magali Kerzenblat, de 20 anos, estudante de Ciências Atuariais, afirma achar arriscada a medida, pois o empréstimo do fundo virá com exigências em relação à economia da Argentina - possivelmente, metas para a dívida pública. "Nossa independência externa pode ser prejudicada."
A estudante de contabilidade pública Estefania Pingarro, de 22 anos, acredita que o momento atual da economia argentina é diferente do de 2001, mas lembra que há uma espécie de trauma no país. "Essa tensão (da população) tem a ver com nossa história. Sempre que fizemos uma dívida com o FMI, nos demos mal."
Estefania não se lembra da crise de 2001, que levou 57,5% da população à pobreza. Tinha apenas cinco anos quando a Argentina deu um calote de cerca de US$ 100 bilhões - um dos maiores da história -, mas sabe que seus pais perderam tudo o que tinham poupado até então: o suficiente para comprar um imóvel. A compra da casa própria teve de ser adiada por 10 anos. A estudante, que ainda é professora de hóquei, também já poupa em dólares.

Escalada da inflação está preocupando os comerciantes em Buenos Aires

Desde o começo deste mês, o argentino Pablo Toledo, de 52 anos, tem atualizado um caderninho diariamente. Nesse caderno, ele anota o preço dos instrumentos musicais vendidos na loja em que trabalha, na rua Sarmiento, tradicional ponto de comércio do gênero em Buenos Aires. "Foi de um momento para o outro (que começou a ter de atualizar os preços rapidamente). Agora passo o tempo alterando preços, constantemente", conta.
Segundo Toledo, essa mudança em seu cotidiano se deu em abril e se intensificou agora, em maio, numa tendência que acompanha a desvalorização do peso. Neste mês, em apenas 11 dias, a moeda argentina já perdeu 12,16% de seu valor. No ano, chega a 23% e, nos últimos 12 meses, são 49%. O resultado disso no cotidiano dos argentinos é que os importados estão cada vez mais caros, e essa inflação dos produtos vindos de fora tem se espalhado por toda a economia.
Toledo conta que os fornecedores têm repassado o preço dos itens aos poucos. "De uma lista de 500, primeiro aumentam uns 50 produtos. No outro dia, outros 50", acrescenta. Nos últimos 40 dias, o preço dos produtos vendidos por Toledo subiu entre 15% e 20% - ajuste que foi repassado ao consumidor. Um violão montado localmente, mas cujas partes vêm da China, por exemplo, custava 5.700 pesos (cerca de R$ 890,00) na semana passada e agora está por 7.000 pesos (R$ 1,1 mil), alta de 22,8%.
No bairro San Telmo, Mario Pereira, dono de uma loja de ferramentas, conta que seus fornecedores lhe avisaram na quarta-feira, dia 9, que, a partir desta segunda-feira, 14, os produtos serão reajustados entre 10% e 15%. "Vou repassar o aumento só das ferramentas mais simples, mais baratas. As máquinas (como furadeiras) já estão saindo muito pouco. Se aumentar o preço, ninguém leva", diz.
Uma grande parte dos itens comercializados por Pereira é importada, mas, segundo ele, até os nacionais já estão sendo reajustados no mesmo patamar. "Aqui, na Argentina, tudo sobe quando o dólar sobe", acrescenta. Até as sacolinhas plásticas que compra para colocar os produtos vendidos foram reajustadas em 17%.
Inflação alta não é novidade na Argentina - quase sempre está acima dos 20%. No primeiro ano do governo de Mauricio Macri, em 2016, chegou a 40,3%, após uma desvalorização inicial de 40% do peso. No ano passado, a inflação foi de 24% e, para 2018, as projeções eram de 20% no começo do ano. Diante da desvalorização da moeda do país, entretanto, economistas afirmam estar revendo esse número. A consultoria Abeceb, por exemplo, deverá divulgar sua nova estimativa na quarta-feira.
 

Entenda o problema

O aumento do dólar no mercado internacional fez o Banco Central da Argentina (BCRA) elevar, por três vezes em uma semana, a taxa de juros até 40% ao ano, desencadeando uma série de reações no país. Os argentinos vivem momentos de apreensão, pois com a economia atrelada ao dólar, a tendência é de disparada de preços, perda do poder de compra e especulações.
Ao mesmo tempo, o governo de Mauricio Macri busca apoio internacional para conter as dificuldades internas e aprovar a reforma trabalhista, adiada desde o começo do ano. Apesar das semelhanças com o Brasil, a Argentina tem uma inflação elevadíssima, que varia entre 20% e 24% ao ano, perdendo apenas para a Venezuela na América Latina.
O clima de incerteza domina os principais setores do país. As centrais sindicais convocaram para o próximo dia 28 o início de uma temporada de mobilizações denominada "Plano de Luta", na tentativa de resistir a eventuais reajustes de tarifas dos setores de públicos, como energia elétrica, água e gás. Paralelamente, atuam ao lado de organizações sociais em favor de uma proposta da oposição que limita os aumentos das tarifas.

Argentinos temem colapso econômico como em 2001

Notícia de negociação com o FMI causou protestos em Buenos Aires

Notícia de negociação com o FMI causou protestos em Buenos Aires


EITAN ABRAMOVICH/AFP/JC
O anúncio do presidente da Argentina, Mauricio Macri, na terça-feira, de que seu governo está conversando com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para receber um financiamento resultou em protestos e panelaços em Buenos Aires contra o acordo. Mas a negociação com o FMI trouxe para a população lembranças de um dos períodos mais difíceis da história recente do país: o colapso econômico de 2001.
O aposentado Francisco Bebeacua lembra que, na época, todo o dinheiro que tinha em sua poupança - US$ 5 mil - foi retido pelo governo, em uma tentativa do presidente Fernando de la Rúa de impedir a fuga de capitais. Parte dos primos de Bebeacua perdeu o emprego e sua filha mais velha, então com 22 anos, deixou o país para nunca mais voltar. Sem a perspectiva de um futuro, ela foi viver na Europa. "Foi um pesadelo. Houve gente que se suicidou porque a poupança de toda uma vida havia sido confiscada. Tenho medo do que vai acontecer na Argentina agora. Nenhuma empresa vai aguentar uma taxa de juros de 40%", diz o aposentado.
A situação daquela época era diferente da atual, frisa a maioria dos economistas. Enquanto entre o fim da década de 1990 e o início dos anos 2000 foram quatro anos de recessão, hoje a Argentina vem de uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB) de 2,9% no ano passado, e a alta esperada pelo próprio FMI para este ano é de 2%. "O governo está em uma situação complicada: a inflação não cede e o mercado pôs em dúvida o financiamento internacional do país. Mas não se compara com 2001", diz o economista Ramiro Castiñeira, da consultoria argentina Econométrica.
Os argumentos de Castiñeira, porém, não são suficientes para convencer a mulher de Bebeacua, a professora aposentada Graciela Cingolani. "O que estamos vivendo agora pode não ser igual a 2001, mas os primeiros passos são os mesmos. Salvo que uma variável mude, vamos pelo mesmo caminho", argumenta. Graciela se refere justamente ao pedido de ajuda ao FMI feito por Macri. Em dezembro de 2000, De la Rúa pegou um empréstimo com o FMI e outros organismos internacionais de cerca de US$ 40 bilhões, em uma medida batizada de "blindagem financeira". A ideia era que os recursos servissem para pagar dívidas do país e aumentassem a confiança no mercado financeiro. Já a solicitação de Macri foi chamada, pelo seu ministro da Fazenda, Nicolás Dujovne, de "financiamento preventivo" e também deveria dar ao país credibilidade internacional, fazendo com que a moeda argentina, o peso, deixasse de perder valor.
A Argentina é o país que vem sendo mais prejudicado pela valorização do dólar no mercado internacional, com as perspectivas de um aumento maior dos juros nos EUA - o que torna o mercado americano mais atraente aos investidores e afeta diretamente os países emergentes.
Além desse cenário externo desfavorável, a perda de credibilidade do Banco Central após o relaxamento da meta de inflação de 10% para 15% neste ano, a criação de um imposto sobre ganhos financeiros de investidores estrangeiros e a avaliação de que os déficits das contas públicas e externo continuam altos ajudaram a desencadear a crise no país. A turbulência financeira culminou com uma fuga de capital que desvalorizou o peso em 12% neste mês.