Vencida, na madrugada de quinta-feira, a batalha - os debates entre base aliada e oposição duraram mais de 10 horas na Assembleia Legislativa - para que o Estado possa avançar rumo ao acordo com a União para aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), outras duas pedras ainda precisam ser removidas do caminho. Uma delas junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) e outra novamente na Assembleia Legislativa, onde a primeira etapa foi vencida com a aprovação do Projeto de Lei Complementar (PLC) nº 249/2017, que autoriza o Estado a aderir ao RRF.
Dentro do governo de José Ivo Sartori (PMDB), o secretariado comemora a conquista da aprovação, mas com cautela. Isso porque a equipe terá pela frente duas questões complicadas para resolver. Uma delas é a forma como o TCE classifica os gastos do governo com a folha de pagamento - e isso, em tese, independe completamente de qualquer ação do governo. "O que poderíamos fazer já fizemos. Abrimos uma consulta ao TCE para que reveja a forma de cálculo, que hoje nos impede de assinar o acordo, porque fica abaixo do que exige a União e que não reflete a nossa realidade", explica o secretário da Fazenda, Giovani Feltes (PMDB).
A consulta ao TCE, aberta no final de janeiro pelo governo do Estado, ainda pode ter um longo percurso e muitas implicações - o que não traz boas perspectivas sob o ponto de vista da assinatura do acordo. O TCE explica que essa primeira fase, de consulta, pode levar até 60 dias antes de ser designado a um conselheiro e, mais tempo ainda, para ser analisada e votada pelo pleno. A aprovação de um novo modelo de cálculo, porém, poderia jogar diferentes Poderes e prefeituras aos holofotes da Lei de Responsabilidade Fiscal. E isso poderá ser um grande limitador ao pleito feito pelo governo do Estado.
O segundo possível impeditivo à assinatura de um acordo é que o Estado precisa obrigatoriamente demonstrar à União garantias de que tem como honrar os compromissos que serão assumidos. E isso implica oferecer ativos como Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Companhia Riograndense de Mineração (CRM), Companhia de Gás do Estado (Sulgás) e Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR). Mas, para que sejam incluídos no acordo, precisam passar novamente pelo crivo dos deputados estaduais ou por plebiscito, dependendo do caso.
Para o chefe da Casa Civil, Fábio Branco (PMDB), porém, não se pode diminuir os méritos da batalha vencida na madrugada de quinta-feira. Branco avalia que a sinalização de que o Estado está se empenhando na busca pelo ajuste fiscal evitará que seja derrubada a liminar que hoje permite ao Estado não pagar as parcelas milionárias que deve à União. "A sinalização do nosso esforço deve evitar que uma decisão judicial derrube essa conquista. Se tivermos que voltar a pagar as parcelas, será um caos", admite Branco.
A aprovação dos deputados ao encaminhamento do acordo foi comemorada por entidades empresariais, como a Federação das Indústrias (Fiergs), a Associação Gaúcha do Varejo (AGV), a Federação de Entidades Empresariais (Federasul) e a Federação do Comércio de Bens e de Serviços (Fecomércio).
Para o presidente da Fecomércio, Luiz Carlos Bohn, o cenário agora se torna mais animador e tirou uma sombra que pairava sobre as finanças do Estado. "Se o Estado tiver que voltar a pagar as parcelas que deve à União, ficaremos sem Estado, sem serviços básicos. Acredito que demos um importante passo, que exigira enormes esforços, mas mais do que necessário. Agora, aprovar na Assembleia a autorização para federalização ou venda de ativos será uma tarefa ainda mais complicada", alerta o empresário.