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Direitos humanos

- Publicada em 19 de Fevereiro de 2018 às 23:05

Ministério Público Federal apura agressões a indígenas

Kaingangues afirmam que vítima levou dez tiros de borracha

Kaingangues afirmam que vítima levou dez tiros de borracha


/CIMI/DIVULGAÇÃO/JC
O Ministério Público Federal (MPF) de Passo Fundo tem se dedicado a colher informações sobre uma denúncia de agressão a indígenas por parte da Brigada Militar (BM), durante ação de reintegração de posse, na manhã da quinta-feira passada. A procuradora da República Fernanda Alves de Oliveira busca descobrir se o grupo de cerca de 40 pessoas agredidas era, de fato, composto por índios kaingang e qual o local exato que estava ocupando. A denúncia é de espancamento, uso excessivo de balas de borracha e ferimento de um jovem por munição letal.
O Ministério Público Federal (MPF) de Passo Fundo tem se dedicado a colher informações sobre uma denúncia de agressão a indígenas por parte da Brigada Militar (BM), durante ação de reintegração de posse, na manhã da quinta-feira passada. A procuradora da República Fernanda Alves de Oliveira busca descobrir se o grupo de cerca de 40 pessoas agredidas era, de fato, composto por índios kaingang e qual o local exato que estava ocupando. A denúncia é de espancamento, uso excessivo de balas de borracha e ferimento de um jovem por munição letal.
O comandante regional da BM, coronel Jair Euclésio Ely, defende que o grupo não era de indígenas, pois não é reconhecido como tal pela Fundação Nacional do Índio (Funai) de Passo Fundo. A reportagem não obteve sucesso em suas tentativas de comunicação com a Funai.
Também há uma contradição entre a localização da ocorrência informada pela corporação e pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que acompanha casos envolvendo indígenas. Enquanto o comandante afirma que o grupo ocupava uma área pertencente à Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), próxima ao trevo da BR-285 com a RS-153, em Passo Fundo, o Cimi alega que o terreno pertence ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e está localizado próximo ao município de Marau.
As lideranças kaingang afirmam, na denúncia, que o acampamento havia sido erguido há poucas horas quando policiais militares chegaram ao local. Na ação, usaram bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha, segundo o Cimi, causando ferimentos em vários indígenas - entre eles, mulheres, crianças e idosos. Um dos anciões denuncia ter sido espancado, e uma imagem registra que uma das vítimas sofreu mais de dez tiros de borracha em uma das pernas. Um outro jovem teria sido ferido na perna com munição letal.
O coronel Euclésio destaca que a área em questão serve para captação de água pela Corsan, e lá se encontram 19 nascentes. "O mais importante é que foi preservado o abastecimento de água às 200 mil pessoas da região de Passo Fundo", defende.
A corporação identificou esbulho possessório, ou seja, a perda da posse por ato de terceiro que a toma forçadamente, e providenciou reintegração de posse imediata. "Houve resistência por parte dessas pessoas, e eles foram retirados mediante uso moderado da força, que prevê uso de gás lacrimogêneo e munição não letal", relata. O comandante conta que foi preso o líder da invasão, apreendida arma de fogo calibre 26 com munição, além de foices, facões, enxadas e machados pequenos.

Corregedoria da BM analisa se houve excessos durante reintegração de posse

A Brigada Militar recebeu denúncia, em sua corregedoria, de abusos por parte dos policiais envolvidos na ação. "Instauramos um procedimento para averiguar algum excesso, mas acredito que o uso de arma letal está descartado", ressalta o coronel Euclésio, esclarecendo que a denúncia não foi feita por indígenas, o que corrobora com a suspeita de que o grupo não era formado por índios.
Questionado, o Cimi informou, em nota, que a autodeterminação do povo não é responsabilidade da BM, do MPF, da Funai ou do próprio conselho indigenista, e sim do próprio povo, conforme sua organização social. A entidade cita a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, que fala em "consciência de sua identidade indígena" e usa o termo "autoidentidade dos povos indígenas".
O Cimi também afirma que, quando a BM alega que não eram indígenas, nega os direitos constitucionais dos índios, pois a Constituição Federal de 1988 assegura a autodeterminação dos povos logo no seu preâmbulo. Além disso, recorda uma ação julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que questionava o método de titulação de seus territórios tradicionais, e um dos pontos envolvia a hipótese de que a autodeclaração para o reconhecimento de quilombolas abriria margem para fraudes.
Na ocasião, o ministro da corte Luís Roberto Barroso apontou que a autodefinição é apenas o ponto de partida de um procedimento feito em 14 partes, que inclui laudo antropológico, manifestação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária e de todos os interessados. "A ideia de que pudesse haver fraude é um pouco fantasiosa", analisou.