Dez anos após o início da crise internacional, a economia da União Europeia (UE) enfim dá sinais de recuperação plena e sustentável, encerrando uma década perdida. Essa é a análise de um número crescente de analistas, impressionados não só com o crescimento médio de 2,7% obtido pelos 28 países da UE em 2017, mas com os sinais de que a atividade se acelera. Entre os fatores internos mais decisivos estão a recuperação da França, da Itália e da Espanha, e a saúde da indústria e do consumo, que aumenta o nível de emprego.
Há 10 anos, a Europa começava a viver a pior crise da zona do euro, consequência da turbulência global dos mercados financeiros e do início da depressão na Grécia, em 2008. Durante anos, os acadêmicos mais pessimistas, como o prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz, apostaram no fim iminente da moeda única - o norte-americano continua a acreditar que se trata de uma "questão de tempo". Porém os indícios vão no sentido oposto. Passada a crise das dívidas na União Europeia, que levou ao precipício Grécia, Portugal e Irlanda, socorridos por Bruxelas e Fundo Monetário Internacional (FMI), e que ameaçou desmoronar os sistemas financeiros da Espanha e da Itália, todos indicadores do bloco passaram para o azul.
O otimismo - ainda que moderado - é tão presente que mesmo membros do diretório do Banco Central Europeu (BCE), como o francês Benoit Coeuré, não escondem a admiração com o melhor desempenho econômico em quase duas décadas. "Em termos de solidez e equilíbrio, é até mais forte que nos anos 1999-2000", afirmou. A boa notícia é que, embora sejam beneficiados por fatores externos favoráveis, os países da UE se veem, pela primeira vez na década, em uma trajetória virtuosa. Iniciada ainda em 2014, a retomada, antes desequilibrada e instável, se generalizou. Grandes economias consideradas estagnadas, ou próximas da estagnação, como França e Itália, dois motores da zona do euro, aceleraram.
Sempre moderada em suas previsões, a Comissão Europeia estima que o crescimento médio em 2017 tenha chegado a 2,2% - índice bem razoável para países do bloco, e bastante superior ao 1,8% de 2016. Até a Grécia, antes quebrada e à beira do abismo, voltou a crescer, com 1,6% no ano passado. "Os resultados da economia europeia em 2017 são claramente melhores do que o previsto em razão da resiliência do consumo privado, do reforço do crescimento mundial e do recuo do desemprego", afirmou a Comissão Europeia em sua análise conjuntural.
Além disso, os prognósticos para 2018 são ainda mais positivos e põem fim à década perdida da Europa. "O ano de 2018 deverá ser o ano em que o PIB da zona do euro retomará o nível que deveria ter atingido se a crise não tivesse existido", diz Mathilde Lemoine, economista-chefe do banco Edmond de Rothschild.
A Espanha, quarta economia da zona do euro, deverá desacelerar por fatores internos conjunturais, como a Catalunha, mas ainda assim crescerá 2,5%. Portugal, Alemanha e o conjunto da zona do euro devem registrar avanço de 2,1%, enquanto a França deverá crescer 1,7% - as projeções do governo são mais otimistas, da ordem de 1,9% a 2,0%. Já a Itália, que vinha de uma sequência recessiva de três anos, crescerá pelo menos 1,3%. Com mais crescimento, o nível de empregos vem melhorando em toda a zona do euro, que criou 7 milhões de vagas desde 2013, retornando em 2017 ao nível pré-crise.
Em sua história mais recente, há cerca de um ano, temores sacudiram a ideia de uma Europa integrada. O Reino Unido iniciou o processo de saída da União Europeia, o Brexit, candidatos populistas e eurocéticos surgiram aos montes, e partidos extremistas ganharam força nas eleições de França e Alemanha. No entanto, o cenário se mostrou menos catastrófico do que muitos esperavam, e o continente seguiu em recuperação econômica. Neste cenário, analistas e autoridades apontam que a visão de um continente unido deve ganhar impulso em 2018, desde que lideranças das principais economias da região consigam equilibrar forças.
A vitória do social-liberal Emannuel Macron na França trouxe mudanças para a perspectiva da zona do euro, com a apresentação do projeto de reformas para aprofundar os laços do bloco comum. Entre as propostas do presidente francês está a criação de um cargo de ministro das Finanças da zona do euro e um Orçamento comum. Também inclui a harmonização das forças de segurança, um imposto corporativo sobre empresas de tecnologia, como Facebook e Google, e a criação de uma agência para lidar com a crise de refugiados.
Para que o projeto se torne uma realidade, é essencial a cooperação da Alemanha - a outra metade do chamado "motor franco-alemão", o coração da zona do euro. Entretanto, o impasse na formação de um governo em Berlim após as eleições de novembro do ano passado representa um grande obstáculo para os planos do líder francês.