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Contas Públicas

- Publicada em 19 de Dezembro de 2017 às 19:19

Adesão ao RRF depende da Assembleia

Exigências do Regime de Recuperação Fiscal, como congelamento de salários e proibição de contratações, dificultam aprovação do texto do Piratini

Exigências do Regime de Recuperação Fiscal, como congelamento de salários e proibição de contratações, dificultam aprovação do texto do Piratini


/MARCELO G. RIBEIRO/JC
Vista como uma necessidade pelo Palácio Piratini, a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) ainda não é uma certeza. Antes de tudo, porque o Executivo precisa de autorização da Assembleia Legislativa, que pode resistir à ideia por conta das exigências da legislação, que proíbe aumentos salariais, contratações e aumentos das despesas, entre outros pontos.
Vista como uma necessidade pelo Palácio Piratini, a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) ainda não é uma certeza. Antes de tudo, porque o Executivo precisa de autorização da Assembleia Legislativa, que pode resistir à ideia por conta das exigências da legislação, que proíbe aumentos salariais, contratações e aumentos das despesas, entre outros pontos.
Além disso, o Piratini oferece como garantia à União recursos provenientes da possível venda de três estatais (CEEE, Sulgás e CRM), que também precisam de aprovação dos deputados ou de um plebiscito para se concretizar.
Um dos principais entraves ao acordo, porém, foi vencido no apagar das luzes de 2017. A assinatura de protocolo entre o governador do Estado, José Ivo Sartori, e o presidente da República, Michel Temer, pôs fim à discussão sobre a admissibilidade do Rio Grande do Sul ao programa, que exige critérios objetivos para a adesão dos estados.
O imbróglio maior residia no comprometimento das receitas estaduais com a folha de pagamento dos servidores, que, pela lei, precisa ter sido de mais de 70% no ano anterior ao pedido. Embora o Piratini alegasse passar desse patamar, a Secretaria do Tesouro Nacional estimava o montante em torno de 58%, e chegou a rejeitar, inicialmente, a participação gaúcha.
O assunto foi superado na Câmara de Conciliação criada para que os dois entes chegassem a uma solução, o que dá sinal verde para o Estado progredir na tentativa de adesão. Mesmo que a Assembleia autorize o Executivo a negociar, entretanto, ainda faltariam etapas como a negociação e assinatura de um pré-acordo e do acordo em si.
Para o secretário estadual da Fazenda, Giovani Feltes, a adesão é necessária para manter suspenso o pagamento das parcelas da dívida com a União, que ficam em torno de R$ 315 milhões por mês. O programa ainda permite ao Estado buscar novas fontes de recursos, seja pela venda das empresas, seja por novos empréstimos, que hoje o Rio Grande do Sul não pode acessar por estourar o limite de endividamento da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Com ou sem regime, os pagamentos ainda estariam descontados até junho, parte de um acordo em 2016 que estabeleceu um escalonamento das parcelas, começando em zero e avançando 5,55% por mês, só retornando, assim, ao valor integral em julho.
O mesmo acordo prevê o fim do teto de 13% da Receita Corrente Líquida (RCL) e o alongamento da dívida em mais 20 anos. "É um bom acordo, que, junto à mudança no indexador e nos juros, resolveria o problema no longo prazo. Mas, mesmo assim, o Estado não conseguiu atender. É como um doente que está mal e não consegue tomar o remédio, porque este é contraindicado", analisa o economista Darcy Carvalho Francisco dos Santos.
Desde abril, o Rio Grande do Sul não paga as parcelas, mesmo com desconto, graças a uma liminar obtida no Supremo Tribunal Federal. A decisão se sustenta no argumento de que o Estado está na iminência de aderir ao RRF, e fez com que R$ 850 milhões deixassem de ser pagos em 2017. Caso a negociação fracasse e a liminar seja cassada, porém, não apenas volta a obrigação de pagamento das parcelas, como também do retroativo quanto ao que deixou de ser pago até agora. "Se cassarem a liminar, cai o mundo", prevê Feltes.
 

Problemas estruturais do passado desafiam o futuro do Rio Grande do Sul

Se os últimos anos foram marcados por problemas de caixa, o futuro breve não dá indícios de que será muito diferente. O motivo, relativo consenso entre governo e economistas, é que há um problema estrutural grave no Estado, que é o tamanho da folha dos inativos. Segundo o Piratini, mais de 58% da folha hoje é destinada a aposentados. "Estamos subestimando, há muito tempo, a origem do problema", argumenta o economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE), Carlos Paiva.
Segundo o pesquisador, a situação decorre ainda de decisão no final do século XIX, quando o Rio Grande do Sul teria sido o único estado a aceitar determinação do governo federal de instituir a aposentadoria integral aos seus funcionários - a maioria dos outros estados só o fariam na década de 1940, começando a pagá-las 30 anos depois. "É preciso parar com o discurso de que é só fazer o dever de casa, porque, se o Amapá pode, nós também podemos. O Amapá não tem nenhum aposentado sob sua responsabilidade, e nós temos desde 1920", complementa Paiva.
Medidas que buscam equacionar essa questão foram instauradas pelos últimos governos, primeiro na gestão Tarso Genro, com a criação de um fundo de capitalização, e depois na gestão José Ivo Sartori, criando o regime de previdência complementar facultativo. Mesmo que prometam solucionar o problema, ou pelo menos parte dele, esses benefícios estão restritos ao futuro. Agora, e pelos próximos anos, o Executivo ainda passa pelo momento de constituição dos fundos, no qual a conta até aumenta, já que seus custos são somados ao do regime antigo.
"Temos dificuldade para estabelecer uma trajetória consistente, porque medidas estruturais não foram tomadas no passado", acrescenta o professor da Escola de Negócios da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) Gustavo Inácio de Moraes, lembrando que o impacto dos inativos na folha resulta na precarização dos serviços públicos. Entre as alternativas, Moraes cita incentivos para que os funcionários públicos se mantenham na ativa, diminuindo os gastos com a reposição, e parcerias público-privadas. Paiva acrescenta que seria necessário um projeto de desenvolvimento baseado em conhecimentos técnicos, que permitem entender quais são os setores que mais retorno darão aos cofres públicos e quais possuem maior potencial de competitividade.
Sobre as saídas pontuais, os economistas entendem que podem suprir carências momentâneas em crises, mas que tendem a se esgotar. Um possível alívio pode vir da retomada da economia brasileira, movimento que também faz parte do panorama traçado pelo secretário estadual da Fazenda, Giovani Feltes, para 2018. "A boa notícia pode vir daí, de o ICMS andar melhor. Infelizmente, o Estado depende muito do ICMS, que é pró-cíclico, só vai bem quando a economia vai bem", comenta Moraes.
Outra possibilidade aventada para 2018, a regulamentação das perdas dos estados com a Lei Kandir não gera expectativas no Executivo. Por mudança na interpretação, o prazo para que o Congresso determine as bases do processo se estendeu até agosto do ano que vem, mas, além disso, há a sensação de que a União não aceitará pagar altos montantes aos estados prejudicados. "Por mais justas que sejam nossas injunções, o que se percebe é que a União não vai flexibilizar nenhum resgate do passivo, porque entende não ser respaldado em lei e porque não tem espaço fiscal", comenta Feltes.
A única situação perto de um consenso, segundo o secretário, é a criação do expediente de uma lei anual que regule o Fundo de Exportação (Fex) daqui para a frente, recursos hoje determinados pela própria União.