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Saúde

- Publicada em 27 de Setembro de 2017 às 17:25

Setembro Amarelo: fatores culturais elevam casos de suicídio no Rio Grande do Sul

Ocorrências são mais frequentes entre adolescentes, jovens e idosos

Ocorrências são mais frequentes entre adolescentes, jovens e idosos


STOCKPHOTO/DIVULGAÇÃO/JC
Tema ainda considerado tabu, o suicídio é um mal silencioso que, entre 2011 e 2015, levou à morte mais de 55 mil pessoas no Brasil, uma taxa de 5,5 casos a cada 100 mil habitantes. Em 2015, o Rio Grande do Sul tinha a segunda maior taxa de suicídios do País, com 10,14 óbitos a cada 100 mil habitantes, atrás de Roraima, com 10,28 casos.
Tema ainda considerado tabu, o suicídio é um mal silencioso que, entre 2011 e 2015, levou à morte mais de 55 mil pessoas no Brasil, uma taxa de 5,5 casos a cada 100 mil habitantes. Em 2015, o Rio Grande do Sul tinha a segunda maior taxa de suicídios do País, com 10,14 óbitos a cada 100 mil habitantes, atrás de Roraima, com 10,28 casos.
De 2012 a 2016, foram registrados 5.725 suicídios no Estado, conforme dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Rio Grande do Sul. Foram 1.191 mulheres e 4.534 homens que tiraram a própria vida. De acordo com o Boletim Epidemiológico de Tentativas e Óbitos por Suicídio no Brasil - divulgado pelo Ministério da Saúde em alusão ao Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio -, a região Sul concentra 23% dos suicídios no País e 14% da população brasileira.
Algo tão complexo como o ato suicida não pode ser explicado por apenas um motivo. É o que afirma a coordenadora do Núcleo de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis da Secretaria Estadual da Saúde (SES), Andrea Volkmer. "Pode ser porque registramos melhor, por fatores de colonização... Nunca vai ser só uma causa. O transtorno mental, por exemplo, é comumente associado, mas há pessoas com transtornos mentais que jamais tentariam se matar", argumenta.
No Rio Grande do Sul, quem mais se mata é o homem - adolescente, jovem adulto, ou idoso. "São homens que trabalham em pequenas propriedades agrícolas e que, quando não conseguem cumprir alguma meta ou algum compromisso estabelecido, preferem a morte a lidar com a vergonha", exemplifica o psiquiatra e coordenador da Equipe de Saúde Mental do Hospital de Pronto Socorro da Capital, Jair Segal.
Além disso, muitos trabalham com agrotóxicos, que possuem substâncias neurodepressoras. Também é frequente o registro de casos em cidades de colonização alemã, cuja tradição cultural é mais severa, e entre a população indígena, que se vê desvalorizada culturalmente.
Para desvendar os motivos que levam o suicídio a ser frequente entre os gaúchos, a SES criou o Observatório de Análise da Situação do Suicídio. Como recorte, escolheu a região do Vale do Rio Pardo - para analisar a questão de modo qualitativo. A pasta pretende lançar um boletim epidemiológico sobre o assunto no mês que vem. A intenção é organizar seminários e oficinas que estimulem discussões sobre o assunto, como forma de conscientização.
A pessoa que decide se matar é frequentemente interpretada como alguém que não quer mais conviver socialmente. O ato também é visto como fraqueza ou fracasso social e familiar. No entanto, Andreia diz que não se trata disso. "É uma angústia muito grande, um desespero, a pessoa não vê saída a não ser acabar com a própria vida. Ela quer acabar com esse sofrimento e, por isso, acaba se matando", explica.
Embora a iniciativa de análise qualitativa seja relevante, o psiquiatra Ricardo Nogueira, coordenador do Centro de Promoção da Vida e Prevenção ao Suicídio do Sistema Mãe de Deus, considera que se trata de uma "teorização excessiva". "É tudo conversa. O que deve ser feito é tratar quem chega em desespero como prioridade e reativar os 100 leitos do Hospital Parque Belém", enfatiza. O psiquiatra se refere aos leitos de saúde mental, os únicos que estavam em funcionamento no hospital. O atendimento foi suspenso em maio deste ano sem previsão de retomada. A capacidade de atendimento do local era de 242 pacientes.

Aumento no número de ocorrências entre crianças é preocupante, afirmam psiquiatras

Os dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação mostram que o suicídio é mais frequente entre adolescentes (de 10 a 19 anos) e adultos jovens (de 20 a 39 anos), de moradores de zona urbana e com escolaridade inferior a oito anos. O Mapa da Violência 2017, publicado com base em dados do Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde, registra que, em 2014, foram 2.898 suicídios na faixa etária de 15 a 29 anos. Os homens se matam mais, mas as mulheres tentam mais. No entanto, são mais propensas a procurar ajuda, ao contrário dos homens, que veem essa necessidade como fraqueza.
Para o psiquiatra Ricardo Nogueira, o que mais impressiona é o aumento de suicídios entre crianças de oito a 11 anos. "O Brasil tem a maior incidência de ansiedade e de depressão da América Latina. Temos também os maiores índices de alcoolismo. É uma soma de tudo", pondera. Outro fator que contribui é o alto índice de abuso sexual de menores. "Muitas dessas crianças abusadas acabam grávidas. Querem abortar e não podem ou não conseguem. Isso costuma ser um motivo frequente da tentativa de suicídio", explica. 
É difícil acreditar que uma criança possa estar sofrendo a ponto de desenvolver pensamentos e impulsos suicidas. "O sofrimento não se manifesta da mesma forma como em um adulto. Há uma certa dificuldade em identificar os sintomas, e a criança acaba sendo deixada de lado", explica Jair Segal. O adolescente, no entanto, demonstra alteração no comportamento social e na escola, além de ser capaz de verbalizar com mais clareza o que sente. "Existe a tendência, por parte dos pais, de negar que isso ocorra. Mas é um problema e já existe tratamento psiquiátrico-infantil, algo que não existia no passado", argumenta.
O que falta, para Nogueira, é uma resposta eficaz. Considerando que já há ferramentas e dados que explicitam o problema, falta ação. "A criança chega na rede falando em se matar. Daí, leva 60 dias para ser atendida novamente. Não pode, tem que ser vista como prioridade, atendida como um paciente de urgência", critica.
Há maneiras de prevenir que o desespero tome conta de uma pessoa em situação de sofrimento. No Estado, a ligação para o Centro de Valorização à Vida (CVV) é gratuita, no número 188. São 70 voluntários, que oferecem capacitação para quem se interessar pela atividade - basta ter mais de 18 anos e disponibilidade de quatro horas semanais. A partir de 30 de setembro, a ligação gratuita estará disponível em mais oito estados (Piauí, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Roraima, Acre, Amapá, Rondônia e Rio de Janeiro).