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Tradicionalismo

- Publicada em 20 de Setembro de 2017 às 23:37

Desfile Farroupilha atrai milhares de pessoas na Capital

Celebração envolveu mais de 1,5 mil cavalarianos em desfile que encerrou festejos

Celebração envolveu mais de 1,5 mil cavalarianos em desfile que encerrou festejos


MARCELO G. RIBEIRO/JC
A cerimônia de encerramento dos festejos farroupilhas, com a extinção da Chama Crioula, aconteceu por volta das 19h30min de ontem, no palco principal do Parque da Harmonia, em Porto Alegre. O evento, cuja abertura oficial ocorreu em 7 de setembro, foi realizado sem aporte financeiro da prefeitura de Porto Alegre. Também ontem, foi realizado o desfile cívico-militar em comemoração aos 182 anos da Revolução Farroupilha. O ato, ocorrido pela manhã, levou milhares de pessoas à orla do Guaíba.
A cerimônia de encerramento dos festejos farroupilhas, com a extinção da Chama Crioula, aconteceu por volta das 19h30min de ontem, no palco principal do Parque da Harmonia, em Porto Alegre. O evento, cuja abertura oficial ocorreu em 7 de setembro, foi realizado sem aporte financeiro da prefeitura de Porto Alegre. Também ontem, foi realizado o desfile cívico-militar em comemoração aos 182 anos da Revolução Farroupilha. O ato, ocorrido pela manhã, levou milhares de pessoas à orla do Guaíba.
Mais de 1,5 mil cavalarianos, representantes de 73 entidades tradicionalistas, Polícia Civil, Brigada Militar, Corpo de Bombeiros, Instituto-Geral de Perícias, Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) e estudantes do Colégio Tiradentes da Brigada Militar de Porto Alegre participaram do desfile. O trajeto, que começou às 8h, percorreu a avenida Edvaldo Pereira Paiva (Beira-Rio), no sentido bairro-Centro, em direção à avenida Aureliano de Figueiredo Pinto.
Para o presidente do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), Nairo Callegaro, o evento "é algo que nos engrandece mais ainda, porque estamos mantendo viva a tradição do 20 de Setembro". "Desfilamos aqui o nosso orgulho de ser gaúcho, o pertencimento que temos de nossa identidade regional, nossa cultura, nossa tradição, a identificação que todos os gaúchos têm com o seu Estado, sua terra, seu hino e com seus costumes", destacou o tradicionalista.

Para historiadores, festividade farroupilha se confunde com exaltação do tradicionalismo

Relembrada com honrarias no Rio Grande do Sul, a Revolução Farroupilha começou em 20 de setembro de 1835, encerrando-se 10 anos depois. Mesmo se tratando de uma guerra perdida, as comemorações alusivas ao levante contra o império são a maior festa do Estado.
No entanto, a festa farroupilha, nos moldes em que é comemorada hoje, trata de uma representação do tradicionalismo gaúcho mais do que da Guerra dos Farrapos em si. "Alguém sabiamente juntou isso para fazer uma comemoração com viés patriótico. Na época dos farroupilhas, ser chamado de gaúcho era uma ofensa, era chamar de bandido, de contrabandista. O exército rebelde era formado por peões e escravos libertos, os gaúchos estavam fora disso", comenta o professor da Universidade do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Cesar Guazzelli, doutor em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Uma das bandeiras que é erroneamente associada à revolução é a do abolicionismo. Conforme Guazzelli, escravos foram libertos, mas os motivos não foram tão nobres. "Eles foram libertados para compor a infantaria. As guerras, aqui no Rio da Prata, eram guerras de cavalaria, os soldados eram peões das estâncias. Para formar a infantaria, os farroupilhas decretaram que cada proprietário de escravos liberasse um a cada três para formá-la. A República Rio-Grandense ainda tolerava a presença de escravos", esclarece.
Ao final da guerra, quase 60% do exército farroupilha era formado por negros que lutavam sob a promessa de serem homens livres após o conflito. "Criou-se uma situação complicada, pois não se sabia o que fazer com os negros. Se continuassem libertos, seria um mau exemplo para os escravos brasileiros, e também havia o receio de que fugissem para se aliar às tropas uruguaias", explica. O impasse seguiu até o Massacre dos Porongos, quando os escravos que lutaram ao lado dos farroupilhas foram massacrados pelas forças imperiais. "Por questões que diziam respeito à lógica militar, era necessário preservar os oficiais gaúchos, mas isso não se estendeu aos soldados, muito menos aos negros", lamenta o professor.
Com isso em mente, chama atenção que, dentro do Acampamento Farroupilha, a presença de negros seja minoritária. Mesmo que eles participem - há, inclusive, um piquete chamado Lanceiros Negros -, a maioria dos homens pilchados é branca, e boa parte dos negros presentes participam prestando serviços. No entanto, o professor da Ufrgs Luiz Alberto Grijó, doutor em História Social pela Universidade Federal Fluminense, argumenta que não há documentações explicitamente racistas nos registros da Revolução. "É uma reprodução da sociedade de forma geral. Tu vais encontrar isso (negros exercendo funções subalternas) em um campo de futebol, em outros segmentos da sociedade", explica.
Ambos os historiadores também reconhecem a presença de elementos machistas na tradição gaúcha, marcada pela exaltação da valentia e do desprendimento revolucionário. "Há uma percepção patriarcal da sociedade. Nesses ambientes, a presença masculina é maior, existe essa predominância. Mas não estou dizendo que não haja tolerância e que todos sejam machistas", pondera Grijó.
A participação das mulheres em guerras é, geralmente, retratada indiretamente. Sabe-se que muitas acompanhavam as tropas - algumas esposas e outras vinculadas à prostituição. Para Grijó, a ideia de que a mulher precisa ser protegida faz parte da formação do povo gaúcho. "A própria organização de um Centro de Tradições Gaúchas (CTG) simula o que seria uma estância - tem um patrão, um capataz. Nesse lugar, as mulheres não têm voz de comando", lembra. Para ele, mesmo que as mulheres não enxerguem isso, naquele ambiente, quem domina é o homem. A reportagem do Jornal do Comércio conversou com algumas mulheres que participavam da comemoração. Nenhuma mostrou desconforto com relação à participação em CTGs.
Para o presidente do Movimento Tradicionalista Gaúcho, Nairo Callegaro, a presença de grupos minoritários se trata de uma questão de participação. "Somos o movimento mais aberto de todos, não perguntamos escolaridade, renda, nada. Só queremos saber o que a pessoa pode fazer para ajudar", explica.