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Cinema

- Publicada em 28 de Setembro de 2017 às 22:33

Silêncio revelador

O diretor Jacques Doillon, que assina Rodin, estava nos últimos anos um tanto afastado dos holofotes. Mas este filme, que reconstitui uma fase da vida do escultor, embora selecionado para a mostra principal do Festival de Cannes deste ano, não obteve a mesma repercussão que o cineasta alcançou com o filme Ponette, que ele realizou em 1996 e obteve êxito em outro festival, o de Veneza. Na mostra italiana, o filme citado tinha como atriz principal Victoire Thivisol, então com cinco anos, que interpretou o papel de uma menina que tinha de enfrentar a dor de ter perdido a mãe num acidente. Surpreendentemente, o júri daquele festival concedeu o prêmio de melhor atriz à protagonista do filme, algo que foi contestado por alguns, que alegaram que com tal idade, Victoire não poderia ter noção exata do que estava fazendo. Esqueceram os detratores que crianças com tal idade costumam "interpretar" papeis em suas fantasias, algo que o diretor soube utilizar durante as filmagens. De qualquer maneira, o filme impressionou justamente por radicalizar o método de dirigir crianças em cena. Além disso, Ponette recebeu outros prêmios paralelos em Veneza, todos eles ressaltando o humanismo de sua proposta. Rodin, ao contrário, foi recebido com frieza em Cannes, mas sem dúvida tal fato revela que nem sempre festivais e premiações representam a palavra final em suas decisões.
O diretor Jacques Doillon, que assina Rodin, estava nos últimos anos um tanto afastado dos holofotes. Mas este filme, que reconstitui uma fase da vida do escultor, embora selecionado para a mostra principal do Festival de Cannes deste ano, não obteve a mesma repercussão que o cineasta alcançou com o filme Ponette, que ele realizou em 1996 e obteve êxito em outro festival, o de Veneza. Na mostra italiana, o filme citado tinha como atriz principal Victoire Thivisol, então com cinco anos, que interpretou o papel de uma menina que tinha de enfrentar a dor de ter perdido a mãe num acidente. Surpreendentemente, o júri daquele festival concedeu o prêmio de melhor atriz à protagonista do filme, algo que foi contestado por alguns, que alegaram que com tal idade, Victoire não poderia ter noção exata do que estava fazendo. Esqueceram os detratores que crianças com tal idade costumam "interpretar" papeis em suas fantasias, algo que o diretor soube utilizar durante as filmagens. De qualquer maneira, o filme impressionou justamente por radicalizar o método de dirigir crianças em cena. Além disso, Ponette recebeu outros prêmios paralelos em Veneza, todos eles ressaltando o humanismo de sua proposta. Rodin, ao contrário, foi recebido com frieza em Cannes, mas sem dúvida tal fato revela que nem sempre festivais e premiações representam a palavra final em suas decisões.
O novo filme de Doillon não deixa de ser uma proposta arriscada. O cineasta, que também é o autor do roteiro, optou não por uma biografia cinematográfica tradicional e concentrou a ação numa fase da vida do artista. É uma fase na qual ele está envolvido na criação de obras que o aproximam da literatura. É o momento da criação de As portas do inferno, baseada em Dante, e da estátua de Balzac. O filme também procura trazer para a tela a crise no relacionamento com sua aluna Camille Claudel, atualmente considerada uma artista tão relevante como seu mestre e amante. Camille, irmã de Paul Claudel, viveu, portanto, à sombra de dois grandes nomes, lutando por afirmação, algo que o filme registra, mas não aprofunda, optando por concentrar o foco no autor de Os burgueses de Calais. E assim fazendo propõe à plateia um relato sobre a servidão a que é submetido o criador, sempre em luta com um cotidiano limitador e opressor. Sem nenhum gênero de sensacionalismo, mas também sem recuar diante de evidências, o cineasta consegue transformar em imagens tal conflito. A cena na qual o filme pela primeira vez coloca em cena a companheira mais antiga de Rodin, a que seria a representante de outra realidade, é perfeita pela utilização do contraste depois das cenas com Camille.
De certa maneira, o filme lembra outra proposta ousada: a de Jean-Marie Straub em Crônica de Anna Magdalena Bach, na qual o cineasta utilizava a música do autor da Missa em si menor para falar de sombras e luzes. Doillon poucas vezes mostra imagens que não sejam aquelas do atelier do artista. O que interessa é a criação da arte, a transformação de movimentos e sons que acompanham a vida humana em formas silenciosas e estáticas, que concentrem em sua imobilidade a essência do vivido. É através de tal criação que o ser humano revela seu desejo de eternizar suas inquietações e desejos. Quando a figura de Balzac é coberta por um manto o filme resume em poucas cenas a marcha da civilização e suas imposições. Mas é a mesma figura que depois irá respirar a liberdade, longe do atelier-prisão e perto de crianças que representam um mundo novo. A cena diante da Catedral de Chartres coloca o protagonista diante de um desafio, a configuração de uma grandeza que parece inacessível. Mas o personagem de Doillon não se rende diante das imposições. Do inferno para o jardim da liberdade a trajetória é feita não por um herói, mas por um homem que sempre parecerá incompleto, na medida em que percorrer tal caminho significa praticar a eterna rebelião. Captar a essência de tal luta não é tornar imóvel a revolta, mas ouvir as revelações que ela pode conter quando transformada em matéria visível.
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