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Teatro

- Publicada em 20 de Agosto de 2017 às 16:56

Seriedade sem divertimento

A iniciativa do Instituto Goethe, ao propor que dois diretores de teatro fizessem montagens de um mesmo texto dramático, é extremamente interessante. Trata-se de um texto radiofônico, As trevas risíveis, de Wolfram Lotz que, com este material, recebeu o prêmio de melhor dramaturgo alemão, em 2015. Alexandre Dill realizou um espetáculo que guardou o título original - não tive, ainda, a oportunidade de assistir a este trabalho. Camilo de Lélis propôs uma releitura do texto original, cruzando-o com o romance original de Joseph Conrad No coração das trevas, que também inspirou ao dramaturgo germânico, além do filme Apocalypse now, de Francis Ford Coppola. É este espetáculo que tive a oportunidade de assistir, no Theatro São Pedro. Certamente o espaço escolhido foi excelente, pois permitiu uma boa concretização do projeto original do diretor, a partir da dramaturgia de Renata de Lélis.
A iniciativa do Instituto Goethe, ao propor que dois diretores de teatro fizessem montagens de um mesmo texto dramático, é extremamente interessante. Trata-se de um texto radiofônico, As trevas risíveis, de Wolfram Lotz que, com este material, recebeu o prêmio de melhor dramaturgo alemão, em 2015. Alexandre Dill realizou um espetáculo que guardou o título original - não tive, ainda, a oportunidade de assistir a este trabalho. Camilo de Lélis propôs uma releitura do texto original, cruzando-o com o romance original de Joseph Conrad No coração das trevas, que também inspirou ao dramaturgo germânico, além do filme Apocalypse now, de Francis Ford Coppola. É este espetáculo que tive a oportunidade de assistir, no Theatro São Pedro. Certamente o espaço escolhido foi excelente, pois permitiu uma boa concretização do projeto original do diretor, a partir da dramaturgia de Renata de Lélis.
O primeiro impacto é provocado pelo cenário de Felipe Helfer, que sugere uma densa floresta tropical, invadida por sobras de produtos de consumo e, pior, soldados, mercenários, colonizadores, pastores religiosos e todo o tipo de predador que a civilização europeia branca e colonialista costuma enviar para estes territórios. O resultado, evidentemente, é o pior possível, e é sobre isto que Wolfram Lotz escreve. Inclusive, denunciando este colonialismo que não é só alemão, como europeu, de todo o tipo.
No palco, temos o desenvolvimento de duas histórias mais ou menos paralelas: numa delas, um pirata malaio está diante de um juiz alemão e se defende das acusações que pesam contra ele, contando sua história e de como ele aderiu à pirataria. Do outro, um militar alemão adentra a floresta, acompanhado de um único soldado, com a missão de eliminar um ex-companheiro considerado traidor. Do ponto de vista do enredo, não se pode dizer que os percursos se cruzem; mas para o espectador, os dois temas acabam se encontrando porque, no horizonte do dramaturgo, um tem a ver com o outro ou, se quisermos, um é causa do outro.
Do ponto de vista do espetáculo, Camilo de Lélis concretizou um trabalho bem acabado e detalhado: a iluminação de Fernando Ochôa cria espaços de claro e escuro que bem recriam a floresta e, mais que isso, a concepção do espetáculo, que fala a respeito das "trevas". Os figurinos de Fabrizio Rodrigues sugerem vestimentas nativas e uniformes militares, com bons resultados. A trilha sonora de Sérgio Rojas é sugestiva e provocativa, porque produz estranhamentos entre a ação cênica e os sons projetados. A direção de Camilo de Lélis foi duplamente corajosa: de um lado, cruza elementos que vão da literatura ao cinema, passando pelo rádio (lembremos que a Alemanha tem uma bela tradição de dramaturgia em rádio) assumindo, ao mesmo tempo, um vocabulário especificamente do teatro. O segundo desafio é a mistura de gêneros dramáticos. Iniciando na linha do teatro épico brechtiano, mas que depois descamba para uma perspectiva de teatro de revista e, enfim, retoma um andamento dramático mais tradicional.
A dramaturgia contemporânea se caracteriza por estas quebras, que nem sempre são fáceis de digerir. Camilo de Lélis ousou e, embora aqui e ali ele perca o ritmo do espetáculo, no resultado final, que ultrapassa a hora e meia, alcança uma unidade de concepção e mantém a coerência dramática proposta.
Zeca Kiechaloski, como ator convidado; Denizeli Cardoso, como, dentre outras figuras, o pirata somali; Marco Sório, como o major Oliver, e Diego Acauan, como seu sargento; e Luiz Franke, como o reverendo Carter e o general perseguido, encarnam menos personagens do que ideias e princípios. São elementos tão sóbrios e tão anônimos como aqueles do aparato cênico, e assim foram trabalhados pela direção, acertadamente e com bom desempenho. Não é um espetáculo divertido, mas é um trabalho a ser considerado.
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