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Teatro

- Publicada em 17 de Agosto de 2017 às 22:02

Direção cênica melhor que a dramática

Yerma, de Federico Garcia Lorca, é texto estreado em 1934, em Madri - portanto, pouco antes da guerra civil iniciada pelo depois ditador Francisco Franco e do assassinato do dramaturgo e poeta. Yerma é a história de uma mulher que, embora queira filhos, não os alcança. Culpa do marido ou dela? As vizinhas falam e para elas sempre a responsabilidade é feminina. Yerma, apesar de tentar sensibilizar o companheiro, não alcança seu intento e a peça se encerra de modo trágico.
Yerma, de Federico Garcia Lorca, é texto estreado em 1934, em Madri - portanto, pouco antes da guerra civil iniciada pelo depois ditador Francisco Franco e do assassinato do dramaturgo e poeta. Yerma é a história de uma mulher que, embora queira filhos, não os alcança. Culpa do marido ou dela? As vizinhas falam e para elas sempre a responsabilidade é feminina. Yerma, apesar de tentar sensibilizar o companheiro, não alcança seu intento e a peça se encerra de modo trágico.
Do ponto de vista da dramaturgia, e a exemplo da maioria dos textos de Garcia Lorca, Yerma é um misto de poema e de tragédia. Pelo andar do diálogo e pela forma das expressões dos personagens é evidentemente um poema e enquadra-se na linguagem lírica. Mas pelo andar de seu enredo e pelo desfecho de sua ação, inequivocamente é uma tragédia. Crocce já nos ensinou que não há gêneros puros, mas apenas percentuais maiores ou menores de uma ou outra tendência.
O espetáculo do Ateliê de Teatro, dirigido por Gustavo Dienstmann, evidencia um feliz casamento entre texto e perspectiva cênica. Com cerca de hora e meia de duração, Yerma, na visão deste diretor, recebe uma atenção toda especial quanto à sua realização plástica: o cenário de Alex Limberger trabalha apenas com alguns blocos que sugerem diferentes espaços; a iluminação de Casemiro Azevedo permite a criação de climas entre oníricos e dramáticos que marcam o andamento da trama. A coreografia de Larissa Sanguiné garante leveza para a movimentação dos atores em cena e os figurinos do próprio diretor e da atriz Valquíria Cardoso mantém a unidade de todo o espetáculo, que tem interpretações de Áurea Baptista, Alex Limberger, Alexandre Malta, Úrsula Collishonn e Valquíria Cardoso.
Dienstmann resolveu batizar seu espetáculo como Yerma ou quanto tempo leva para transbordar um balde. Não gosto do subtítulo, porque ele apela a uma linguagem popular com um jargão que pouco tem a ver com a dramaturgia de Lorca. E, ao mesmo tempo, acho que foi um equívoco de equipe vincular o espetáculo ao texto clássico de Lorca, porque o resultado final, ao registrar esta relação, acaba deixando a desejar, embora este resultado final, em si mesmo, não seja de todo ruim. Explico: ao ligar seu trabalho ao texto de Lorca, Dienstmann cria uma série de expectativas que são, depois, frustradas. Se o diretor, ao contrário, tivesse se limitado a batizar a peça com seu subtítulo, apenas ele fugiria da comparação evidente que fica nos devendo.
Encenar um texto de Garcia Lorca exige um elenco de largo fôlego, dificuldade que é quase intransponível para um grupo jovem de intérpretes. Uma vinculação direta, assim, ao original, leva-nos a criar expectativas que precisariam ser atendidas, mas, como o disse, não o são. No entanto, o espetáculo em si não é ruim. O que ocorre, então? Dienstmann é um diretor de cena. Seu espetáculo realiza-se plenamente enquanto conjunto de símbolos cênicos, da música (de Arthur de Faria, excelente) à cenografia e ao figurino.
O elenco está equilibrado, mas não chega a ter a mesma força que os elementos de cena. Assistir ao teatro de Lorca exige um ouvido atento à musicalidade e à expressão do seu texto altamente poético. A dramaturgia de Lorca se torna trágica exatamente porque sobre cada um e todos os seus personagens sempre paira uma espécie de "culpabilidade". Então, seus textos vivem das expectativas, da suspensão das ações, daquilo que é apenas sugerido, mas nunca dito ou mostrado diretamente. Tudo isso Gustavo Dienstmann parece bem entender quando se trata de pensar a cena. Mas não segue tão bem quando se pensa na presença dos personagens, que parecem andar à toa pelo espaço cênico.
Acho que Dienstmann ainda vai amadurecer e aprender a trabalhar melhor este equilíbrio entre a direção de cena e a de atores. Talvez a sua presença em cena atrapalhe o resultado final. Sempre pensei que um diretor, em princípio, não deve ser ator, também, em seu próprio espetáculo. De qualquer modo, Yerma ou quanto tempo leva para transbordar um balde é um trabalho interessante, persistente e preocupado com a dramaturgia. Mas que, ao menos para as minhas expectativas, não alcançou sua realização.
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