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Entrevista Especial

- Publicada em 04 de Junho de 2017 às 20:59

Governo espera até R$ 4 bilhões por estatais, afirma Lemos

Lemos ressalta que avaliações ainda estão em andamento

Lemos ressalta que avaliações ainda estão em andamento


fotos: FREDY VIEIRA/JC
Na véspera da viagem da missão do governo José Ivo Sartori (PMDB) ao Japão, o secretário estadual de Minas e Energia, Artur Lemos (PSDB), revelou que o Estado gostaria de receber entre R$ 3,5 bilhões e R$ 4 bilhões pela venda de CEEE (Companhia Estadual de Energia Elétrica), Sulgás (Companhia de Gás do Rio Grande do Sul) e CRM (Companhia Riograndense de Mineração).
Na véspera da viagem da missão do governo José Ivo Sartori (PMDB) ao Japão, o secretário estadual de Minas e Energia, Artur Lemos (PSDB), revelou que o Estado gostaria de receber entre R$ 3,5 bilhões e R$ 4 bilhões pela venda de CEEE (Companhia Estadual de Energia Elétrica), Sulgás (Companhia de Gás do Rio Grande do Sul) e CRM (Companhia Riograndense de Mineração).
Entretanto Lemos faz questão de ressaltar que os estudos de avaliação das estatais ainda estão em andamento. Portanto não se trata de um valor oficial, apenas de um "horizonte de quanto o governo espera arrecadar". 
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o titular da pasta de Minas e Energia também acusou a oposição na Assembleia Legislativa de ser incoerente: "defendiam a realização do plebiscito quando tramitava a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que retirava a obrigatoriedade da consulta popular para privatizar as três estatais; agora que o governo convocou o plebiscito, não dão acordo para os trâmites previstos na lei".
Jornal do Comércio - Na semana passada, o governo desistiu da PEC que propunha a retirada da obrigatoriedade de plebiscito para privatizar a CRM, a Sulgás e a CEEE, e entregou ao presidente da Casa, Edegar Pretto (PT), um projeto de decreto legislativo convocando consulta popular sobre a venda das estatais. Qual é a expectativa do governo quanto a esse trâmite?
Artur Lemos - A expectativa da Secretaria Estadual de Minas e Energia é ter uma resposta, para saber que rumo vamos tomar. A PEC para retirada da exigência do plebiscito, que aceleraria o processo (de privatização), foi encaminhada à ordem do dia da sessão de terça-feira (passada). Mas quem dizia que tinha votos para derrubar a PEC (deputados de oposição e independentes) não deu acordo para a votação. Diante desse cenário, o governo definiu a realização do plebiscito. Mas, para nossa surpresa, a oposição - que antes dizia que queria ouvir a sociedade - diz agora que não quer escutar a população neste ano, só no ano que vem. Não estão nem dando acordo para acelerar o procedimento previsto na lei. O que preocupa é a politização do debate. Afinal, a partir do momento em que essa discussão saiu da Assembleia, uma vez que ela não quis votar a PEC, o discurso político acabou. De qualquer forma, vamos trabalhar para que se faça o plebiscito.
JC - Por um lado, a oposição queria o plebiscito, e agora não quer mais. Por outro, o governo não queria, e agora quer. O senhor, como membro do primeiro escalão, acredita que essa inversão de posição pode gerar desgaste ao Palácio Piratini?
Lemos - A posição do governo continua sendo a de que acelerar o processo (de privatização) é o mais benéfico para a sociedade. Na nossa avaliação, votar a PEC teria sido o mais eficaz. Afinal, a realidade das empresas é dificultosa, elas têm prazos que, se não forem cumpridos, podem gerar um prejuízo muito grande para a sociedade. Se a PEC tivesse sido votada, posteriormente seria encaminhado o projeto para privatizar ou federalizar as estatais. Aí, na nossa visão, os deputados - por serem representantes da população - teriam condições de garantir a discussão com a sociedade sobre as implicações da federalização ou privatização, o que fazer com os recursos etc.
JC - Uma vez encaminhado o plebiscito, o que o governo espera desse processo?
Lemos - Além de ser mais custoso, vai exigir todo um trabalho. Afinal, as corporações vão fazer todo um trabalho para mostrar à sociedade a importância das estatais. Mas também é importante que se diga que as corporações estão lá para defender a sua posição, o seu concurso público.
JC - Quem são essas corporações?
Lemos - Sindicatos, que são representantes dos empregados. Provavelmente, alguns empregados que não são favoráveis à transferência de controle acionário exigirão do seu sindicato que ele se manifeste. Nós estamos trabalhando para apresentar uma compreensão do todo, não apenas de um nicho específico.
JC - Quanto valem as três estatais?
Lemos - Ainda não existe uma estimativa, pois estão passando por um processo de avaliação. Sabemos o valor possível do ativo. O mercado tem uma estimativa, mas a secretaria ainda não tem esse dado para torná-lo público.
JC - Então o governo quer vender as estatais, mas não sabe o preço delas...
Lemos - Temos um horizonte de quanto gostaríamos de arrecadar: não menos que R$ 3,5 bilhões a R$ 4 bilhões pelas três companhias. Não estou dizendo que elas valham isso, mas a gente tem a expectativa de arrecadar no mínimo isso. Quem quer vender tem que saber no mínimo quanto quer receber. A gente trabalha com esse horizonte.
JC - Que avaliação o senhor pode fazer da situação das três estatais, começando pela CEEE? O governo tem dito que é uma empresa deficitária. O sindicato dos servidores, no entanto, diz que é superavitária quando a contabilidade inclui a Geradora e Transmissora (CEEE-GT) junto com a Distribuidora (CEEE-D). A análise tem que ser feita em conjunto ou em separado?
Lemos - Primeiro, a gente tem que compreender que são duas empresas totalmente diferentes. A CEEE-GT e a D têm CNPJs diferentes. Não consigo tirar dinheiro de uma para passar para a outra. Tenho que fazer todo um ajuste contábil para os acionistas aportarem. Quando dizem que "a holding CEEE" teve um lucro de R$ 500 milhões, tem que ver de onde veio esse valor. O grupo teve lucro? Teve. Mas de onde veio esse lucro? Da chamada RBSE (Rede Básica Sistema Existente), que é só da GT. Vai entrar o dinheiro? Teve uma liminar que bloqueou. Então a Geração e Transmissão teve um lucro de R$ 927 milhões que não se sabe se vai entrar em caixa. E, retirando esse lançamento contábil, o grupo fecha em prejuízo.
JC - Caso seja vendida, o que acontece com os funcionários da CEEE? Pode gerar um passivo trabalhista para o Estado?
Lemos - É importante que se diga que, havendo transferência de controle acionário, sendo por federalização ou privatização, a companhia não deixa de existir. O CNPJ da CEEE continua existindo. O que isso quer dizer? Que os funcionários dessas companhias continuam sendo funcionários da companhia, apenas o Estado não é mais acionista dessa companhia. Por certo, quem adquirir as empresas não vai demitir todas as pessoas, porque precisa de pessoas para trabalhar. Por certo, vai identificar os melhores, vai ter enxugamento, porque a gente concorda que a estrutura é inchada, vai fazer uma adequação no quadro e buscar os melhores para continuar trabalhando com ele. Não pode ter redução de salário, porque ele continua sendo empregado daquela empresa. E os que ele demitir, por questão de ajustes da estrutura, vai ter que indenizar, pagar FGTS, multa, aviso prévio. Mas é um novo acionista (não o Estado).
JC - Quanto a CEEE tem hoje de passivos judiciais?
Lemos - O que tem de passivos judiciais, de ambas as companhias, é algo em torno de R$ 1 bilhão. Quem comprar vai colocar no papel, "vou ter que fazer tantos desligamentos", "isso aqui já está contingenciado para ações judiciais", e isso faz parte do que ele vai tirar do valor que a CEEE poderia valer.
JC - Com as duas companhias, a GT e a D, quanto o Estado gostaria de ganhar?
Lemos - São as mais valiosas, do nosso ponto de vista. A GT, principalmente, que tem um ativo valioso. No caso da CEEE Distribuidora, o maior ativo é a concessão: 29 anos de contrato, e que o comprador pode diluir o que vai investir ao longo desse período. Nessas duas companhias, a gente acredita que o valor seja superior a R$ 2,5 bilhões, com certeza. Líquido, elas valem bem mais, só que têm grandes passivos: R$ 1 bilhão com ações judiciais, já descontados; R$ 1 bilhão para ex-autárquicos; R$ 1 bilhão com a Fundação CEEE... só aí estamos em R$ 3 bilhões. Sem esses passivos, nossa expectativa seria de R$ 6 bilhões.
JC - A Sulgás, por outro lado, é incontestavelmente superavitária. Por que vendê-la?
Lemos - Realmente, o Estado nunca colocou recursos financeiros na companhia. Ao longo de sua existência, a Sulgás teve apenas crescimento vegetativo, e o gasoduto ficou estrito ao eixo Caxias do Sul-Porto Alegre. Sei que chega a Santa Maria, a Soledade, mas chega de caminhão, que tem um custo de transporte que não seria o mais adequado. O ideal seria que fôssemos mapeados de gasodutos no Estado. Mas por que ela se restringiu a isso? Primeiro, tinha o limitador de fornecimento de gás, o gás boliviano, 2 milhões de metros cúbicos por dia. E também porque falta apetite comercial, agressividade comercial, de querer expandir. Por ela ser pública, tem algumas amarras: tem que seguir os preços da tabela e não pode diferenciar os clientes. Falta apetite comercial. Quando ela precisou se expandir com maiores recursos, ela foi ao mercado buscar dinheiro, debêntures, e está pagando ao privado. Por outro lado, o Estado, em que pese que não tenha aportado recursos, teve que deixar represado 50% do lucro para que sirva de garantia para o pagamento das debêntures.
JC - Mesmo assim, entrou no caixa do Estado R$ 30 milhões em 2016...
Lemos - O lucro neste ano teve crescimento vertiginoso muito por causa da variação do dólar, que deu aquela subida em 2015. Aí acumula o preço do dólar e, quando cai, tem 'gap', e a Sulgás acaba tendo um superávit muito bom. Além disso, a queda no consumo aqui no Estado foi menor que a redução nacional. Aqui diminuiu o consumo em torno de 10%, 12%. No Brasil, entre 20% e 25%.
JC - Qual o cálculo que indica que vale a pena abrir mão desses R$ 30 milhões, por exemplo?
Lemos - Se for privatizada ou federalizada, não ficaria nem os R$ 30 milhões. Mas modifica todo um cenário. A fiscalização seria feita pela Agergs (Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul). O marco legal do gás, que não existe, seria produzido, incluindo metas de expansão (dos gasodutos). Inclusive, a expansão será uma das exigências. Têm estudos que foram contratados no governo passado que dizem que, até 2030, o volume poderia se expandir de dois milhões para 14 milhões de metros cúbicos por dia. Claro, o gasoduto tem limites, e não vai ser por essa via que vamos receber gás. Estamos trabalhando com política carboquímica, produzir gás a partir do carvão, mas não será a solução para todos problemas, vai gerar 2 milhões de metros cúbicos por dia. Por onde pode vir esse gás? Pode ser GNL (Gás Natural Liquefeito), que a União vem trabalhando muito forte na expansão. Agora, claro, para você comprar quantidades de gás, você assume compromisso, às vezes, em longo prazo.
JC - E qual a expectativa do governo de ganhar?
Lemos - O mercado comenta que ela teria o valor de algo em torno R$ 1,2 bilhão. Alguns podem dizer que a expectativa de crescimento seria um valor superior. Mas, bom, isso um leilão vai dizer. É uma estimativa de partida, mas pode ser superior se o mercado entender que a Sulgás tem condições de ampliar seu mercado.
JC - E a CRM?
Lemos - Eu ouvi gente dizer que ela sempre foi superavitária e foi ser deficitária nesse governo. É importante ter muita transparência. Foi no governo passado, 2013, que fizeram concurso e colocaram mais de 100 pessoas dentro da companhia. E, naquele momento, as perspectivas já eram de redução de contrato da Cgtee (Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica), que era e continua sendo a única cliente da CRM. E hoje o que acabou acontecendo: teve que reduzir pessoal, desligar pessoas através de incentivos. Em 2015, o contrato com a Cgtee se reduziu em dois terços. Além disso, a CRM é uma companhia de mineração que não diversificou seu portfólio, só minera carvão, não minera areia, nem outro tipo de riqueza mineral. Se você depende de um único cliente e de uma atividade muito restrita, vai ter problemas à vista. Estamos, como secretaria, tentando criar políticas públicas para criar mercado? Sim. Mas não depende somente do Estado, depende de outros atores.

Perfil

Artur Lemos Júnior nasceu em Alegrete, mas, aos seis meses de idade, a família o trouxe para morar em Porto Alegre, onde vive até hoje. Estudou na escola de freiras Maria Goretti e depois no Colégio Pastor Dohms. Formou-se em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs), em 2005. No mesmo ano, filiou-se ao PSDB. Na administração pública, foi diretor administrativo e presidente da Fundação Zoobotânica (2006-2011). Foi coordenador da CPI da Energia Elétrica na Assembleia Legislativa (2014), quando assessorava o deputado estadual Lucas Redecker (PSDB). De janeiro de 2015 a dezembro de 2016, foi secretário adjunto da Secretaria de Minas e Energia. Hoje, é o titular da pasta. Cursou Politics and Economics of International Energy, pela Sciences Po, de Paris, em 2016. Atualmente cursa pós-MBA em Governança Corporativa e Gestão de Risco na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Possui especialização em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho.